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21 DE ABRIL DE 1960 691

toca aclarar a menor, estudando sua existência ou sua ausência em nosso ambiente, a fim de que possa fluir a consequência, isto é, a emenda acaso necessária».
Não será, pois, de estranhar que intervenha num assunto de interesse para a sanidade política, de vantagem para o bem comum e de valor para a paz social. Estou, portanto, de acordo com o projecto e dou-lhe. na generalidade a minha aprovação.
Coordenaram-no os princípios que dimanam da justiça distributiva, pela qual os bens e os encargos gerais devem ser distribuídos entre os membros do corpo social conforme os méritos e faculdades de cada um, numa equidade sã e benéfica; e da justiça social, que exige dos governantes a manutenção, defesa e desenvolvimento do bem comum, e dos súbditos a cooperação na mesma finalidade, pelo cumprimento do dever social, que a todos, dentro da esfera da sua actividade, obriga.
Sr. Presidente: sendo a verdadeira política a arte de bem governar os povos, não pode isentar-se dela a vida económica e social da Nação.
O Estado que se mantivesse como espectador passivo nos jogos e lutas de interesses entre produtores e consumidores, empresários e trabalhadores, cedo veria a ordem e a paz, que lhe pertence defender e promover, perturbadas e quiçá destruídas.
«A economia nacional - diz Pio XII - tende a assegurar sem interrupção as condições materiais em que se pode desenvolver plenamente a vida individual dos cidadãos. Onde isto se realiza, e realiza de modo durável, o povo será, propriamente falando, rico, porque o bem-estar geral e, por conseguinte, o direito pessoal de todos ao uso dos bens terrestres se encontram assim realizados consoante o plano querido pelo Criador», mas «não é possível obter qualquer resultado sem uma ordem exterior, sem normas sociais que visem à obtenção durável daquele fim; e o recurso a um automatismo mágico è uma quimera, não menos vã para a vida económica do que para outro qualquer domínio da vida em geral».
Compete ao Poder Público estabelecer normas juriricas para uma justa, prudente e salutar ordenação de todas as actividades económicas, que, em harmonia diferenciada, mas coordenada, serão garantia de paz operante e frutuosa.
No plano de fundo de toda a complexa quentão sucial está o grave e delicadíssimo problema da repartição das riquezas.
Fixação de salários, assistência e subvenções sociais ao trabalhador, participação dos operários na gestão dos negócios e nos lucros, combate ao desemprego, parcelamento da propriedade, intervencionismo do Estado nas empresas, etc., são artigos de um mesmo capítulo: distribuição dos valores económicos realizados.
Mas haverá algum fundamento para se exigir que as riquezas particulares sejam repartidas com a sociedade?
Não será o proprietário dono absoluto dos seus tesouros?
O homem, limitado por natureza, recebeu do Criador, de uma maneira indivisível e universal, os bens terrenos para que pudesse realizar no tempo o seu próprio fim. Por direito natural primário todas as coisas eram comuns: omnia communia omnibus, destinadas à humanidade sem limites ou quantidades.
Diz-nos a razão e confirma a experiência que esta finalidade comunitária de nenhum modo se pode alcançar em si mesma, por insuficientemente protegida contra a natureza viciada dos homens.
Institui-se então a propriedade privada, pela qual cada um, com exclusão dos demais, liga à sua pessoa pelo vínculo do direito alguma coisa a que chama sua; se não corresponde de modo directo ao destino comum dos bens determinados por Deus, indirectamente vai satisfaze-lo pela participação de todos no seu uso, com primeira vantagem para o possuidor.
Nem por isso a apropriação dos bens deixa de ser uma instituição de direito natural, pois dele dimana como conclusão de raciocínio, filiando-se naquele direito das gentes - ias gentiam - que, no dizer de Cícero, é comum a todos os povos.
«O ter dado Deus a terra a todo o género humano para que use dela e a desfrute não se opõe de maneira nenhuma à existência de propriedades particulares, porquanto dizer que Deus deu a terra em comum a todos os homens não equivale dizer que todos os homens indistintamente são senhores de toda ela, mas tão-sòmente que não assimilou a nenhum em particular a parte que havia de possuir, deixando à actividade dos homens e às instituições dos povos a delimitação da posse privada», lê-se na Rerum Novarum.
Nunca, porém, o fim primário dos bens - utilidade comum - deverá ser esquecido; e de tal modo limita a propriedade que em caso de extrema carência os bens tornam-se comuns.
Na Quadragésimo Ano Pio XI esclarece que «o direito de propriedade privada foi outorgado pela natureza, ou seja pelo próprio Criador, aos homens, já para que cada um possa atender às necessidades individuais e familiares, já para que por meio desta instituição, o> bens que o Criador destinou a todo o género humano sirvam na realidade para tal fim».
Não é esta doutrina nova na Igreja; vive na sua alma. desde os seus primórdios, desde que Cristo inseriu o sobrenatural no humano, para que as virtudes do homem brotassem mais belas e mais fortes.
Não se chegou a experimentar entre os primeiros cristãos uma comunidade relativa de bens?
Não foi sempre tradição na Igreja haver um património destinado aos pobres?
No século IV Lactâncio escreve:

Deus deu-nos a terra em comum (entenda-se: no uso), não para que uma avareza irritante e despiedosa se levantasse com tudo, mas para que os homens vivessem em comunidade e a ninguém faltasse o que a nossa mãe comum havia produzido com tanta liberalidade e magnificência.

E. S. Basílio:
Como aos grandes rios se lhes dá vazão por diversos canais para que a sua água chegue a todas as partes da terra e as faça frutificar, assim os que têm bens de fortuna devem fazer que cheguem por diversas vias às últimas camadas sociais. A água estancada corrompe-se; posta em movimento, torna-se clara e limpíssima. As riquezas amontoadas são inteiramente inúteis; mas quando se põem em circulação e passam de uns para outros são em grande modo frutíferas e reportam grandes vantagens à sociedade.

E à pergunta do rico: «Faço injúria a alguém conservando para mim aquilo que é meu?», responde incisivamente: «O pão que tu deténs é do faminto; os vestidos que reservas para ti pertencem ao desnudado; o calçado que te embolorece é do descalço; o dinheiro que enterras é do pobre».
Repare-se que toda esta violência de S. Basílio vai para as riquezas não utilizadas polo próprio detentor: Pão que deténs ... vestidos que reservas ... calçado embolorece ... dinheiro que enterras ...
É a verdadeira interpretação do direito natural.