14 DE DEZEMBRO DE 1960 191
da agricultura, e que encaminhe o sector agrícola, tidas as suas naturais limitações, no rumo de uma intensificação, não só em termos físicos mas também para a obtenção de produções mais valiosas, isto é, de maior produto por unidade de superfície».
Aqui se põe com toda a lucidez, como disse, o panorama da lavoura, em especial da lavoura da média e da grande propriedade, e não deixa de ser sintomático que seja o Ministério das Finanças a equacionar assim um problema que estará decerto na preocupação diária do Ministério da Economia. É que o problema da lavoura, pelas suas implicações, transcende o quadro regional, ultrapassa os interesses de uma classe e torna-se hoje num verdadeiro problema nacional, de interesse, portanto, colectivo. Analisando-o, o Ministério das Finanças chama deste modo para ele a redobrada atenção dos sectores a que estará mais afecto, tornando-o pilar do equilíbrio orçamental.
Fazendo notar que, embora devendo atender-se às más condições meteorológicas dos últimos anos (estaríamos mesmo, segundo a observação do nosso ilustre colega engenheiro André Navarro, numa «época de vacas magras»), elas só por si não justificam a perda de posição do sector agrícola no quadro económico da Nação, que hoje, particularmente, tem de manter-se equilibrado, o relatório fala então de uma deficiente estrutura agrária com baixa rentabilidade de solo e de trabalho, em lacunas de organização, em deficiente política de sustentação e estabilização de preços.
Mas, atento a este panorama decepcionante da lavoura e naturalmente convencido de que qualquer plano industrial e comercial não pode ter êxito estável sem a garantia de alimentação para todos e de que o produto agrícola pode influir mais fortemente na nossa balança comercial, lembra o relatório que o Governo tem orientado a sua acção no sentido de intensificar o papel dos organismos técnicos que podem contribuir eficazmente para o aumento da produtividade e da capacidade da agricultura, através do reforço substancial das dotações que lhe são atribuídas no quadro do II Plano de Fomento, e na formulação de uma política de preços que tenda a valorizar o produto agrícola, encaminhando-o para sectores e culturais mais adequados, em conjugação com aquela acção técnica.
De facto, só com a valorização técnica da lavoura, que já nos últimos anos tem sido encarada e levada a cabo com regularidade, e com uma conveniente e dinâmica política de preços que tenda a corrigir as insuficiências de uma precária ordenação agrária parece poder melhorar-se a posição que a lavoura ocupa no conjunto produtivo nacional. A acção do Estado terá, assim, de continuar a fazer-se sentir cada vez mais na divulgação dos métodos destinados à conservação e aumento de fertilidade do solo, pela adopção de melhores práticas de rotações e de mais racionais e eficientes adubações, na investigação, através do melhoramento das plantas e dos animais e pela insistência no aperfeiçoamento técnico dos métodos de cultivo, no incremento das campanhas de sanidade pecuária e zootécnica, na introdução deliberada de novas culturas, nomeadamente as de carácter industrial, enfim, enfrentando decididamente as dificuldades iniciais que poderão resultar da orientação da lavoura para outros tipos de cultura e explorações, escolhidas mais de acordo com as condições ecológicas, e que, embora já praticadas, não têm ocupado até agora a posição relativa que seria desejável. Neste último aspecto de reconversão caberá à política de sustentação e estabilização de preços desempenhar papel fundamental, orientando a agricultura para produções que, tendo mercado assegurado a níveis de preços concorrenciais, empreguem maior volume de mão-de-obra com mais regularidade e assegurem um produto final de maior valor em termos relativos de preços. Mas à própria lavoura caberá também desempenhar um papel activo e decisivo nesta tarefa de reconversão, preparando-se convenientemente para as novas exigências e solicitações que irão surgir, resultantes da revisão do condicionalismo da sua posição no quadro económico nacional. O problema de maior receptividade às técnicas modernas, a criação de um espírito de empresa, a melhor consciencialização da sua missão, serão, entre outros, alguns dos parâmetros a que a lavoura terá de ater-se para equacionar e resolver os seus problemas.
posso afirmar que a lavoura alentejana, até no próprio interesse de se salvar, está atenta à conjuntura actual e só aguarda, e só pede, que sejam definidos com antecipação os planos dessa reconversão necessária. Definidos e garantidos, dentro do possível, nos seus resultados.
Assim, a Federação dos Grémios da Lavoura tomou a iniciativa de promover, em meados do próximo ano, um congresso, onde terão assento todas as associações de índole agrária do País. num total superior a 1100 organismos, representados por mais de 17 000 indivíduos que fazem parte dos seus corpos gerentes. Propõe-se esse congresso - que tem assim âmbito nacional - esclarecer as aspirações da lavoura, demonstrar as suas ansiedades e possíveis injustiças de que se julga vítima e sugerir ao Governo, dentro da sua visão dos factos, medidas atinentes a um revigoramento da sua economia de modo a acompanhar a evolução económica das restantes actividades e serviços, colaborando assim na resolução dos seus problemas económicos e sociais.
Através desse congresso, a Nação dar-se-á naturalmente conta do valor económico-social do sector agrícola, mas desde já não deixará dê atentar na dispersão de esforços e na multiplicidade de ideias que hão-de existir nestes 1100 organismos, nestes 17 000 dirigentes. Há, com certeza, gente a mais a mandar ... Este quadro, infelizmente tão nosso, de um feroz individualismo, mereceu já de um técnico autorizado, que aos problemas da lavoura tem dedicado todo o seu labor, estas palavras, que o congresso procurará fazer esquecer :
Se me perguntassem qual tem sido o maior mal da nossa agricultura, confesso que de boa mente fecharia os olhos e saltaria por cima da adversidade dos factores naturais - e todos nós sabemos o tributo que lhe pagamos; não me deteria nos defeitos de estrutura fundiária; deixaria de lado a escassa capacidade profissional de tantos que cultivam a terra e o desapetrechamento financeiro, técnico e científico de boa parte, dos agricultores; a tudo isto fecharia os olhos, para apontar o que é, a meu ver, o maior de todos os males: a falta de união e de cooperação no seio da própria lavoura.
Sr. Presidente: entre os planos da reconversão a que me referi atrás não pode deixar de figurar o do estabelecimento de indústrias nos meios rurais.
Quando aqui só debateu largamente o problema do descongestionamento da zona de Lisboa, fazendo deslocar para a sua periferia as indústrias que a procurassem e até algumas das já existentes, foi encarado o perigo - e eu fui dos intervenientes que para ele chamaram a atenção do Governo - de se transformar em zonas industriais meios predominantemente rurais, sacrificando terras férteis e criando problemas de abastecimento. Permitir-se, por exemplo, a instalação de uma grande fábrica de motores em zona 100 por cento rural, onde a qualidade das culturas garante trabalho todo o ano parece deliberado propósito de provocar desvio de mão-de-obra. Se para o Alentejo, que se