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18 DE JANEIRO DE 1961 247

tranhos, embutidos à força numa organização preexistente - organização certamente imperfeita, mas justificando mais reforma do que demolição.
Quando se verifica que algumas unidades industriais das mais representativas do sector se instalaram há largos anos no vale do Vouga, para aproveitar, como é de compreender e de louvar, as condições naturais da região, e se observa que a zona racional do seu abastecimento está sendo invadida por postos de cooperativas que recolhem, em seu proveito, o leite disponível, utilizando-o mal e obrigando aquelas a procurá-lo para o Norte até Monção e para o Sul até Leiria, com encargos de transporte e pioria das condições higiénicas, que pesam nos preços e na economia nacional, sem que, em contrapartida, resulte alguma vantagem muito nítida, tem-se a noção clara de que qualquer coisa não funciona bem. Esta situação torna-se mais chocante quando se sabe que ela resulta da aplicação do Decreto-Lei n.º 39 178, em cujo relatório se afirma que à indústria se garante a «matéria-prima adequada à laboração de produtos de boa qualidade».
Mas outra faceta da orgânica fabril das nossas cooperativas leiteiras merece revisão.
Ao passo que nos outros países tais organizações contribuem, como actividades industriais que são, para a receita do Estado, através dos impostos, as cooperativas leiteiras portuguesas são um encargo deste. Não pagam contribuições; quando se estende a aplicação do Decreto-Lei n.º 39 178 a nova zona é a Junta Nacional dos Produtos Pecuários, por incapacidade dos próprios, que organiza e paga o serviço de análises do leite e é a Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas que fornece o pessoal orientador, através dos seus delegados nas diversas regiões; quando há excessos de manteiga, de que as cooperativas e as indústrias caseiras são em parte responsáveis, é a Junta que faz a warrantagem e que paga os encargos de armazenagem frigorífica.
Este regime de vida é, visto em absoluto, difícil de sustentar; mas revela-se particularmente injusto (guando se compara o papel das cooperativas ao das indústrias independentes, às quais se exige - e bem - a plena satisfação de todos os encargos.
8. Problemas jurídicos. - A publicação do Decreto-Lei n.º 39 178 veio levantar algumas dúvidas de natureza jurídica, que o Prof. Marcelo Caetano analisa em parecer de Outubro de 1958, a pedido do Grémio Nacional dos Industriais de Lacticínios.
Pondo de parte os pormenores, reside a essência da questão em que aquele decreto, sem afirmar expressamente o princípio do exclusivo atribuído aos grémios da lavoura ou cooperativas de produtores para o estabelecimento de postos de recolha, dispõe como se assim fosse - e na prática assim tem sido; mas como, por outro lado -, anele se não revoga a legislação anterior em contrário, tem esta de considerar-se em vigor.
Ora o Decreto-Lei n.º 29 749 prevê que a recolha do leite possa ser feita ,pela lavoura -, pelos grémios dos industriais ou pelas próprias fábricas; O Decreto-Lei n.º 36 973 deu às câmaras municipais a faculdade de criarem centrais pasteurizadoras ou centrais leiteiras para tratamento do leite destinado ao consumo público, podendo a recolha, ser feita pelas cooperativas, pelas câmaras ou pelas centrais, e daqui resulta uma oposição de preceitos legais que parece inconveniente deixar em suspenso.
9. O preço do leite. - Dentro da doutrina do Decreto-lei n.º 29 749, compete a Junta, como elemento de coordenação, fixar o preço do leite a pagar ao produtor. Existe efectivamente uma tabela em que esse preço é fixado em função do teor butiroso, mas o excesso de água que o leite, fraudulentamente, pode conter não é penalizado o bastante para desencorajar a fraude.
Por outro lado, O estado higiénico do leite não é tido em consideração com a generalidade e o peso que a importância do assunto impõe; mas o certo é que a- dependência entre o preço e a higiene padece ser o meio mais eficaz para obrigar o produtor a cuidados de que frequentemente se desinteressa. É certo que alguns relatórios da Direcção-Geral dos Serviços Agrícolas defendem nesta matéria a boa doutrina, mas o assunto nunca foi considerado, pelo que é oportuno apontá-lo agora.
Em alguns países da Europa ò leite com tempo de redutase inferior a vinte minutos é imediatamente rejeitado e o que se situa abaixo de três horas é aceite mediante notificação ao produtor de que não deve repetir o facto, sob pena de ser eliminado. Mas tudo isto se passa em teoria, porque o leite é todo higienicamente bom ou muito bom, com tempos de redutase, respectivamente, superiores a três e a cinco horas.
Entre nós, nas zonas que têm sido objecto das campanhas de melhoramento efectuadas pela Direcção-Geral dos Serviços Pecuários (Lisboa, Évora e Faro), tem-se verificado que a situação inicial é a de que 60 a 70 por cento das amostras colhidas têm tempo de redutase inferior a três horas, isto é, são amostras de leite tão impuro que não é pasteurizável; mas as campanhas aturadas de educação sobre a higiene dos estábulos, dos animais e das pessoas permitiram reduzir aqueles valores a cerca de 10 por cento do número das amostras.
Estes números revelam quanto é preciso intensificar aquelas campanhas, quanto elas são eficazes: e quanto é preciso que uma forte desvalorização do leite mau faça sentir ao produtor, de forma convincente, a necessidade de o melhorar.
O problema do preço do leite precisa ainda de ser avaliado sob outro ângulo.
Nos países em que os lacticínios constituem matéria de troca externa, o seu preço não pode deixar de acompanhar as cotações nos grandes mercados, as quais flutuam sensivelmente com as alterações conjunturais. Isso obriga a que se revejam frequentemente os preços do leite, para que a incidência daquelas flutuações, para a alta ou para a baixa, afecte equitativamente a lavoura e a indústria, a fim de que o comércio externo do País possa manter-se em todas as circunstâncias. É a isto que se pode chamar organização e espírito nacional.
O critério de rigidez com que as fixações de preço costumam fazer-se entre nós precisa de criar elasticidade, para se adaptar à futura vida económica da Europa, alinhando no jogo de subida e descida que caracteriza, todo o mercado aberto à concorrência, e as pessoas precisam de se adaptar à ideia de que a descida de um preço não é sempre acto condenável do comprador, como a subida pode não ser especulação do vendedor. Temos coisas novas para aprender.
Como em muitos outros casos, a criação de um fundo de compensação poderá cobrir as variações de pequena amplitude, que há certamente vantagem em eliminar; o estímulo à produção, no seu aspecto dual de quantidade e qualidade, tem de se apoiar, sem transigências, num preço justo do leite e também em algumas regras moderadoras que evitem sobressaltos e descontentamentos.
A observação do que se passa na Europa em matéria de preços do leite mostra a delicadeza do assunto. Por um lado, todos os estados procuram que o preço seja alto, para ajudar a criar na agricultura uma estrutura económica mais sólida; por outro, há que ajustai-os preços dos lacticínios às condições da concorrência