248 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 186
internacional. Mas os preços altos conduziram em alguns países a excessos de produção, a que é difícil dar saída e para a correcção dos quais dois caminhos tem sido seguidos: recuar os preços para nível mais baixo ou estimular o consumo directo de leite, orientando nesse sentido os hábitos da população, através do fornecimento gratuito, por conta do Estado, aos alunos das escolas primárias de uma ração diária de leite pasteurizado.
10. Campo de acção das cooperativas leiteiras. - Põe-se por vezes a dúvida de valer a pena, no continente, promover a reforma pecuária e industrial no sector dos lacticínios, por haver noutros países (e em algumas das ilhas dos Açores) condições mais favoráveis de clima para as forragens e para os próprios animais.
Sem querer antecipar até onde se poderá ir, supõe-se que vale a pena. Por um lado, no ramo industrial, esta conclusão é intuitiva; pelo outro, no ramo pecuário, se a intuição não permite chegar tão longe, aconselha, pelo menos, a que não se abandone desde já o combate. A necessidade de carne, peles e estrume, a perspectiva de novos e extensos regadios, o conhecimento de que, mais do que os caracteres hereditários, o arraçoamento bem estudado influi na produção leiteira, são factores de incitamento que não podemos esquecer.
Não deve ser motivo de desistência saber que noutros países se obtêm médias de produção da ordem dos 4000 l de leite por vaca e por ano e que na zona abastecedora e Lisboa a média não passa dos 2500 l; a verdade é que nalguns, concelhos se atingem hoje médias iguais ou superiores a 3000 l, com casos que se aproximai! dos 40001, enquanto noutros concelhos, mais afastados das boas normas de zootecnia, pouco se excedem os 1 500 l. Estes números revelam bem quanto poderemos melhorar se nos devotarmos a isso.
Aqui se descobrem campos importantíssimos, em que a cooperação dos produtores de leite, mais do que a fazer manteiga (criando os problemas de sobreprodução já referidos), poderia realizar uma acção meritória em favor dos associados e da economia geral: apoiando a vulgarização de conhecimentos sobre rações e a assistência técnica aos interessados na sua preparação, pugnando pelo fornecimento de forragens a bom preço, colaborando abertamente na higienização do leite e no melhoramento zootécnico, colaborando na preparação técnica do pessoal, promovendo a concentração regional da produção para embaratecer os transportes e prestando mil formas de assistência à produção leiteira, bem precisada de estímulo e bom conselho.
Talvez como acima se refere, a recolha do leite possa ser também missão útil das cooperativas, se elas souberem, com firmeza, premiar os bons produtores e castigar os maus; talvez ainda o tratamento e distribuição do leite lê consumo directo pudesse, em alguns casos, ser-lhes atribuído, mediante cadernos de encargos bem especificados; talvez, se vier a ser necessária a construção de tina grande unidade industrial de lacticínios, possam í s cooperativas constituí-la, se tiverem capital e interesse, gozando dos direitos e obrigações que caberiam a quaisquer outros cidadãos portugueses; mas estes assuntos merecem larga ponderação e não se deseja mais do que apontá-los, sem tomar sobre eles posição apriorística.
Só se acrescenta, para que não se exagere o alcance do que se acaba de dizer, que a distribuição do leite para consumo directo não pode estar inteiramente desligada (]o seu fornecimento à indústria, porque há que fazer entre as duas aplicações uma indispensável compensação de preços.
11. Manteiga e margarina. - A existência de excedentes de manteiga traz quase sempre à discussão o problema da margarina, com alvitres de limitar a produção desta ou de a obrigar a incorporar manteiga.
Manteiga e margarina são dois produtos diferentes, até porque um é de origem animal e o outro quase inteiramente vegetal, mas são, de alguma forma, concorrentes. Há, pois, que definir claramente as características de uma e de outra e que evitar toda a confusão no espírito do comprador, ao qual se deve dar o direito de escolher a que mais lhe agrada ou lhe convém.
E certo que o consumo de margarina sobe mais rapidamente que o da manteiga - regra que se verifica em muitos países; mas é também verdade que entre nós a comercialização da margarina, desde a forma de apresentação até aos últimos pormenores da técnica de vendas, é incomparavelmente mais perfeita do que aquela de que dispõe a manteiga. O nível das indústrias que fabricam uma e outra não é, decerto, estranho a esta diferença.
Não se pensa que deva recorrer-se a coacções administrativas, como aquelas que se referem no primeiro período deste número, para tentar o equilíbrio económico manteiga-margarina sem se demonstrar previamente que ele é impossível no domínio da própria economia, e como, pelo que ficou dito, não se pode afirmar que a produção de manteiga tenha atingido entre nós um nível de qualidade e preço que se considere inexcedível, nem está ainda provado que o leite de que se faz a manteiga em excesso não possa ter aplicação mais útil, supõe-se prematuro criar neste sector um condicionamento artificial, que melhor servirá a justa causa se o guardarmos avaramente como último recurso.
12. Variações sazonais de produção. - E sabido que a. produção do leite sofre variações sazonai(r) importantes e que a sua adaptação ao consumo exige um volante intermédio que supra faltas e encaixe excedentes.
A Junta Nacional dos Produtos Pecuários, realiza todos os anos este ajustamento, transferindo, de umas zonas para outras quantidades apreciáveis de leite, o que nem sempre se faz sem dificuldade, porque há que retirar matéria-prima a algumas indústrias, sem o poder fazer, por diversos motivos, entre os quais* avulta u qualidade, proporcionalmente a todas».
Em alguns países o problema resolve-se com a existência de uma unidade industrial de adequada capacidade, da qual são sócios todos os interessados, que se destina ao trabalho, extremamente irregular, de laboração dos excedentes. O aumento de custo, de produção nesta fábrica resultante daquela irregularidade é compensado por uma redução no preço dos excedentes do leite que ela utiliza, o que permite a absorção automática da produção nos períodos excedentário sem qualquer dificuldade e com a colaboração harmónica de todo o sector.
Este é um novo aspecto em que a ideia cooperativa poderia actuar utilmente.
13. - O queijo da serra. - O queijo da serra, que constitui produção: característica da região da serra da Estrela, merece que se lhe dediquem duas palavras. Fabricado em muitas instalações dispersas, sem unidade técnica e, consequentemente, sem unidade de tipo, o queijo da serra oferece-nos exemplares de fino paladar, ao lado de outros manifestamente maus. E sabido de todos como é quase impossível encontrar no comércio dois queijos iguais.
A ideia cooperativa talvez pudesse ajudar a sair desta situação, que desvaloriza o produto como elemento comercial. Os pequenos fabricantes, que são, geralmente, os próprios produtores de leite de ovelha, bem poderiam ser orientados, nesse sentido, para se unirem,