458 DIÁRIO DAS SESSÕES N.9 201
O lavrador vive atormentado por pesadelos, desânimos e preocupações de toda a espécie, suportando as pragas mais variadas, lutando contra as naturais inclemências do tempo e sujeitando-se às traiçoeiras alternativas dos mercados.
No entanto, apesar de todo o seu difícil calvário, continuar a amar a terra e a viver com todo o fervor da sua aluía uma profissão que tanto o amargura e faz sofrer!...
Deve-se fundamentalmente este estado de espírito não apenas a razões de ordem sentimental, mas também ao temperamento acomodatício do homem da terra, que, na modéstia do seu viver e na luta constante com os reveses da Natureza, se vai consolando cristãmente com o «pão nosso de cada dia», na esperança de alcançar mais favoráveis condições de vida e na certeza de contribuir para a felicidade e para o bem-estar da colectividade.
É que o lavrador não é egoísta nem é retrógrado!...
A despeito de todas as contingências da produção, não se deixa sugestionar pela mira de grandes lucros a que não esta habituado, pois estes constituem apanágio dos intermediários, que sem reservas nem escrúpulos beneficiam muitas vezes das fracas produções, da ruína e da desgraça da lavoura, para mais facilmente se lançarem na voragem de negócios obscuros, desorientando os mercados e tornando mais vasto e propício o seu campo de acção para a prática de manobras especulativas e para a satisfação dos seus desmedidos desejos de ganância.
Os lavradores, apesar de acusados injustamente de retrógrados por aqueles, que de agricultura apenas conhecem o pão na mesa, o vinho na garrafa e as batatas fritas, reconhecem e acreditam nas novas exigências da actividade agro-pecuária e sentem a ânsia de adoptar as técnicas e os sistemas culturais dos novos tempos, com vista à modernização da agricultura e ao consequente aumento da produtividade.
O Sr. Augusto Simões: - Muito bem!
O Orador: - Simplesmente, a sua situação financeira, extremamente débil, e o elevado preço das máquinas, das alfaias e dos adubos afastam a lavoura das novas transformações culturais, diminuindo, assim, as possibilidades de melhor produção e reduzindo a sua eficácia nos aspectos económico e social.
É preciso estabelecer-se uma prudente política de valorização dos produtos agrícolas ou, pelo menos, de desvalorização de produtos de outra origem, para que, ao mês aio tempo que se procure fixar o justo equilíbrio entre os diferentes sectores da economia, se não torne mais oneroso o custo de vida.
A lavoura, o comércio e a indústria constituem a base fundamental de toda a economia da Nação.
Cada um destes importantes sectores, cumprindo o seu dever de produzir riquezas, não tem de manifestar animosidades ou guardar desconfianças e egoísmos, sempre prejudiciais à marcha do progresso. Tímidos, partilhando entre si os insucessos ou triunfos, poderão contribuir decidida e eficazmente para a prosperidade da vida económica nacional.
Assim lavradores, comerciantes e industriais se compenetrem desta realidade e os governantes responsáveis não tomem medidas legislativas de proteccionismos unilaterais ou criem situações de inferioridade, que, regra geral, desgostam, revoltam e podem comprometer aquele sentido de unidade económica, absolutamente indispensável ao progresso e engrandecimento material da Nação.
«A lavoura, essa parente pobres, como muito judiciosamente lhe chamou, em magnífico e oportuno editorial, o importante jornal O Século, não aspira a riquezas que nunca possuiu.
Apenas deseja a graça de Deus, a boa vontade e o auxílio dos homens de governo, para que a pobreza se não transforme em indigência e novas perspectivas se abram no horizonte para que a lavoura portuguesa possa sobreviver, acompanhar a evolução de uma vida moderna cada vez mais exigente, suportar os reflexos da industrialização e enfrentar a concorrência dos mercados.
A lavoura, que há três anos consecutivos tem sido vítima das leis implacáveis da Natureza, sofrendo as maiores calamidades, suportando as mais alarmantes variações atmosféricas e as mais desorientadoras oscilações na sua vida funcional e económica, tem visto agravada a sua precária situação financeira por virtude das difíceis condições de trabalho e das adversidades do tempo, que têm penosamente comprometido o regular desenvolvimento das culturas.
Se contra as leis soberanas da Natureza não é possível lutar, há que temperar-lhe os efeitos, promovendo medidas que defendam o sector, agrário das garras da usura, porque a lavoura endividada não pode progredir.
Justifica-se o empréstimo para valorização de terrenos e melhoria das instalações agro-pecuárias, mas este não tem razão de ser para fazer face às despesas normais da exploração.
Estas têm de ser cobertas com os lucros da empresa, sob pena de em caso contrário se cavar cada vez mais fundo a ruína de um sector, que é ainda hoje o fundamento de toda a nossa vida e o grande esteio da economia do País.
Mas quererá tudo isto significar que o Governo se tem mantido indiferente aos angustiantes problemas com que se debate a lavoura nacional?
Seria flagrante injustiça e feia ingratidão não reconhecer a benéfica e profícua acção governativa exercida no sentido de facilitar e de entusiasmar toda a actividade ligada à terra.
Neste aspecto merecem principal relevo as providências referentes a hidráulica agrícola, assistência técnica à lavoura, povoamento florestal e, finalmente, a Lei de Melhoramentos Agrícolas, diploma da maior relevância, superiormente interpretado e orientado pela Junta de Colonização Interna, que ao serviço do fomento e do progresso da agricultura tem desenvolvido uma acção digna dos mais rasgados e merecidos aplausos.
Consciente desta afirmativa, quero aproveitar esta oportunidade para aqui deixar expressa uma palavra de sincero louvor à inteligência, ao aprumo, ao zelo e à sábia direcção do seu ilustre presidente, Sr. Engenheiro Agrónomo Vasco Leónidas, e de muito apreço pelos distintos técnicos que com a maior dedicação e competência servem a nobre causa da lavoura nacional.
A este importante pilar da reorganização agrária do País me referirei mais circunstanciadamente, quando nesta Câmara tomar posição acerca de alguma das propostas de lei elaboradas sobre emparcelamento, colonização e arrendamento da propriedade rústica, as quais; embora constituindo uma transformação nas estruturas tradicionais por força de imperativos de ordem política, económica e social, demonstram que o Governo está atento a todos os movimentos e disposto a todos os sacrifícios, para a satisfação plena de todos os problemas de reconhecido interesse geral.
Por hoje apenas me deterei no discutido problema das obras de hidráulica agrícola, apreciando parti-