1410 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 57
Trata-se de dotar o País de uma magistratura especializada, embora seguindo tanto quanto possível os traços fundamentais da organização e funcionamento da magistratura comum; a criação de alguns tribunais fiscais de 1.ª instância de competência territorial regional - em número que se prevê bastante reduzido- resolve toda a. gama de problemas que esta importante matéria pode suscitar.
Tendo presente que o acto de julgar exige autoridade em exclusivo serviço da interpretação e aplicação da lei, julga-se indispensável tornar independente a magistratura judicial fiscal, libertando-a da sujeição a ordens ou instruções - salvo o dever de obediência à própria hierarquia judicial-, bem como declará-la irresponsável, em princípio, alheando os magistrados das consequências que possam derivar do normal exercício da sua função.
E ainda no intuito de proporcionar ao juiz a serenidade e objectividade necessárias para a adequada posição dos factos em face da lei, considera-se imprescindível tornar a magistratura judicial fiscal inamovível, quer pela impossibilidade de interrupção dos períodos por que é feita a nomeação provisória, quer pelo seu carácter vitalício, quando esta se tornar definitiva, subordinando, neste caso, o afastamento do magistrado do exercício das suas funções à expressa previsão na lei.
Por outro lado, não se deixou ainda de ponderar que a especialidade da jurisdição fiscal se funda na especialidade da matéria, o que aconselha, tanto quanto possível, um movimento paralelo de especialização da magistratura judicial, pela enunciação de índices a serem tidos em conta no momento da nomeação.
Quanto à magistratura do Ministério Público Fiscal, não pode deixar de ser paralela à respectiva magistratura judicial, mas dela independente, não podendo os seus representantes receber ordens, instruções, advertências ou censuras dos respectivos juizes.
Julga-se indispensável estruturar um órgão essencialmente técnico que possa agregar à pura função de procuradoria-geral da Fazenda, ou seja à representação e defesa dos interesses da Fazenda Nacional junto dos tribunais fiscais, as funções gerais de vigilância da legalidade fiscal, em cujo exercício desenvolverá não só uma actividade de controle da obediência e acatamento da lei como também tomará a iniciativa de prestar auxílio técnico aos contribuintes legalmente considerados como dele carecendo, quer assumindo a sua defesa em processos de natureza fiscal, quer prestando-lhes assistência, quer mesmo recorrendo para os tribunais superiores das decisões proferidas nos tribunais fiscais, sempre que isso seja pedido pela protecção dos legítimos interesses dos próprios contribuintes.
Estes aspectos são, afinal, a projecção orgânica do espírito unitário dá Reforma Fiscal, que é -diga-se uma vez mais - o de proporcionar o justo equilíbrio entre o direito do Estado e a protecção do efectivo interesse do contribuinte.
Como nota geral, que sublinha toda a organização judiciária fiscal e simultaneamente justifica o particular cuidado posto no seu estudo e elaboração, impõe-se referir que a necessidade de uma adequada organização dos tribunais se funda verdadeiramente na exigência de eficácia prática da norma jurídica através da justiça e prontidão da sua aplicação. E esta tarefa encontra, certamente, entre as suas condicionantes fundamentais o necessário apetrechamento, já que a fraqueza do direito tanto pode derivar da insuficiência da lei como da insuficiência dos seus meios de aplicação.
Ainda no prosseguimento da reforma do contencioso encontra-se actualmente em preparação um código de processo fiscal, tarefa que essencialmente assenta na preocupação de regulamentar com unidade sistemática os elementos componentes da relação jurídico-processual, nas matérias relativas à acção, sujeitos e objectos do processo e formalismo processual. E embora este trabalho se apoie em muitos aspectos na linha de orientação já existente e planeada nos vários diplomas que regulam o processo fiscal outros há inteiramente novos.
No processo declaratório, mais correspondente ao actual contencioso das contribuições e impostos, manter-se-ão as formas de processo já existentes relativamente à impugnação do acto de lançamento e liquidação e às infracções fiscais, separação processual que se continua a julgar logicamente procedente em face da diversidade substantiva que apresentam e, consequentemente, também extensiva às exigências que postulam.
No seguimento do actual sistema tem-se igualmente em vista orientar a estrutura processual pelo princípio da verdade material, e, conciliando devidamente as necessidades de celeridade e economia processuais com um formalismo, que, embora reduzido ao essencial, sempre se tem de conservar, porque imposto pela ideia de ordem do processo e, sobretudo, como garantia dos interesses das partes intervenientes. Característica fundamental que aqui se apontará como ideia base que preside à reforma do contencioso, e a integral jurisdicionalização do processo declaratório fiscal. Pretende-se, assim, uma nítida separação entre os aspectos administrativos e jurisdicionais do contencioso, passando toda a competência de decisão, como princípio geral, em processo declaratório fiscal, para a exclusiva pertença dos tribunais fiscais, órgãos com o monopólio do julgamento, «suprapartes» e delas independentes pela sua constituição.
Trata-se de uma ideia já com assento no actual sistema e cuja continuidade reveste, sem dúvida, particular importância como realização do espírito de efectiva defesa dos interesses dos contribuintes.
A reforma do processo do contencioso fiscal havia de, lógica e necessariamente, abranger a do processo executivo.
O actual Código das Execuções Fiscais acha-se naturalmente desactualizado, embora represente para a época da sua elaboração um assinalado progresso.
A execução ocupa, no ordenamento processual, um lugar de suma importância, pois através dela se realiza a garantia prática do direito do credor que, neste caso, é o Estado.
A natureza e destino das receitas tributárias e de outros rendimentos públicos determinaram, para a sua cobrança coerciva, a criação de um processo dotado de características especiais.
Na reforma em preparação mantêm-se essas características, que- podem resumir-se: numa simplicidade de rito, numa supressão de actos e diligências inadequados à estrutura do processo e à sua finalidade, numa oficiosidade que se revela no impulso inicial do processo sem dispensar a promoção do representante da Fazenda Nacional, por indispensável, o que tudo lhe confere uma particular eficiência, que é sem dúvida o seu natural escopo.
Contudo, isto não significa que se minimizem as garantias do executado, que terá à sua disposição os fundamentos e os meios para se opor a uma pretensão ilegítima ou infundada.
Poderá, ainda, ao impugnar a validade do lançamento e liquidação da dívida no contencioso competente, pedir a suspensão do processo executivo.