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2346 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 93

nem ao seu aspecto positivo. Orientam-se apenas para o que ela trouxe de negativo. Tem-se, com propósitos inconfessados, confundido o desenvolvimento material dos territórios e o enriquecimento económico, social, cultural e político de vastas camadas populacionais - fruto, aliás, do regime visado - com as instituições que os hão-de reger.

Tenho para mim que se deve duvidar de que se outro houvesse sido o regime administrativo do ultramar mais e melhores meios de ensino e de educação dos aborígenes se teriam posto em acção, ao tempo em que os decantados «ventos da história» eram diversos e os portugueses eram apontados como a vergonha dos europeus, por conviverem com aqueles e praticarem a mestiçagem ... Do mesmo modo, não se me afigura que outra administração tivesse podido no pós-guerra estabelecer um corte radical com o existente, enveredando pelos trilhos que agora se indicam e preconizam.

Conseguintemente, penso puder aplicar-se a este caso o pensamento de Salazar, objectivado nas palavras do teor seguinte:

... Como acontece em toda a parte, quando tais problemas (de governo) não encontram solução ou quando esta se processa em ritmo mais lento do que aquele que revelam as aspirações dos povos, logo se põem em dúvida, ou seja politicamente em crise, quer as instituições quer a competência da Administração.

Sr. Presidente: a política, como a natureza, é inimiga dos saltos. A política, como a natureza, é, sim, amiga cia adaptação. Além disso, é a arte de conciliar o desejável com o possível, consoante alguém opinou.

Pois é justamente uma coisa e outra que aqui temos na proposta de lei ora em apreciação.

Sr. Presidente: o Governo, ao gizar as alterações à Lei Orgânica do Ultramar Português, cônscio do dever que lhe incumbe de salvaguardar o património moral e material da Nação, a fim de o legar aos vindouros tal como o recebeu, respeitou religiosamente os princípios informadores e estruturadores da nossa acção transmarina, e que, tirante a forma como se expressam, são, rio fundo, os mesmos que de longe vêm - do remoto século de Quatrocentos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não podendo conceber-se a Pátria dividida, seguindo os seus filhos rumos diferentes e antagónicos; é que se reafirma a doutrina da solidariedade. Três são os pontos capitais desta doutrina: unidade da Nação; solidariedade entre todas as suas partes, isto é, territórios e populações; descentralização administrativa. A dispersão dos territórios portugueses opõe-se, naturalmente, a sua unidade política; a solidariedade implica a cooperação e o conhecimento mútuos; a descentralização opõe-se à autonomia.

A descentralização nada representa de novo. Mas vê o seu âmbito alargado no respeito escrupuloso do estatuído na Constituição e, no mesmo passo, das realidades das províncias ultramarinas, indo ao encontro das aspirações legítimas dos portugueses que ali se esforçam pela construção de um Portugal maior.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Vejo com desvanecimento que a proposta de lei em apreço preconiza uma representação adequada do ultramar em altos órgãos da política nacional. Nada melhor, decerto, para a formação e consolidação de uma maior consciência de ser português.

O mesmo sentimento conduz-me a sugerir que os serviços nacionais e os quadros comuns do funcionalismo público devem merecer cuidado aturado. Aqueles têm de ser ampliados e a estes facilitado o acesso. O ideal seria, até, que os quadros comuns abrangessem a própria metrópole, sempre que possível.

Que a livre circulação das pessoas por todos os territórios nacionais é poderoso meio e forma de integração - que todos anelam e para a qual, no domínio da economia, afanosamente se trabalha. Não importa tanto que um goês possa servir em Angola, um moçambicano em Cabo Verde ou na metrópole, como o poderem transitar de uns pontos para outros, sem perda dos direitos que assistem ao servidor do Estado.

Sr. Presidente: dentro de breve lapso de tempo vão os governantes do ultramar ter nas suas mãos outros e mais poderosos meios de trabalho útil. Espero que as esperanças e os anseios dos povos não sejam jamais logrados e que, no fim da jornada, a unidade nacional se encontre fortalecida.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Vítor Barros: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: generalizada a ideia de que não deve perfilhar-se o chamado sistema de integração administrativa, visto ser ele, no dizer do venerando Conselho Ultramarino, «contrário às realidades, se afastar do desejo das populações e comprometer irremediavelmente a eficiência da Administração», e assente, em contrapartida, que em matéria de política ultramarina a orientação que deve continuar a seguir-se é a da unidade da Nação e, à sua sombra, a da descentralização administrativa, será à luz destas duas concepções de base que analisarei, no seu mais amplo significado, a proposta de alteração à Lei Orgânica do Ultramar.

Muito embora não entenda bem como é possível conciliar tal princípio com a existência de preceitos constitucionais expressamente consignados ao ultramar e de uma lei orgânica para o ultramar, começarei por fazer notar que se essa unidade é ainda princípio aceite pela generalidade das suas populações é, todavia, minha firme convicção que ela não sobreviverá se lhes for .dado continuarem a verificar que essa tão aclamada unidade continua, de facto, a traduzir uma submissão dos interesses das províncias de além-mar aos da metrópole, como foi o caso de, durante a última guerra, toda a economia de Angola ter sido posta ao serviço de uma minoria de capitalistas metropolitanos através da fixação de preços, exageradamente baixa, dos seus produtos de exportação e da obrigatoriedade de os vender à metrópole, e como o é ainda o caso da comercialização do rícino, o do diferencial e obrigatoriedade dos fretes marítimos pela frota nacional, o de os automóveis das províncias apenas aqui poderem permanecer por tempo limitado e o dos entraves, cada vez maiores, postos à sua industrialização, e de que cito, como exemplos, os postos à construção de linhas de montagem de bicicletas, tractores e automóveis e à transformação, in loco, de certas matérias-primas aí produzidas, como seja o algodão.

Cito ainda um outro exemplo, cujo significado real, se não resulta dele próprio, resulta ao menos da circunstância de, em muitos outros sectores, e assaz frequentemente, se repetir.