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16 DE JANEIRO DE 1964 2875

Cabida se nos afigura a afirmação de que se não pode abstrair, portanto, do sistema de apropriadas relações entre o Estado e as autarquias, «pois o que importa - conclui - é que tais relações se estabeleçam e funcionem com o espírito próprio, não com o propósito de absorção que destrói ou enfraquece a iniciativa e o sentido das responsabilidades, mas, pelo contrário, com ânimo de colaborar, de analisar, de suprir deficiências, procurando sempre salvaguardar o prestígio dos órgãos e a eficiência das funções».
Ora não tem sido, infelizmente, este o pensamento que tem dominado alguns altos departamentos do Estado e dos seus serviços quando contactam com as autarquias locais.
Estas não são encaradas, a maior parte das vezes, como elementos activos e valiosíssimos com quem importava colaborar decidida e amplamente. Ou se olham e tratam com desmedida sobranceria ou, o que ainda é pior, se desconhecem ostensivamente.
Estou em crer, Sr. Presidente, que para semelhantes julgamentos dos órgãos estaduais concorre muito a subalternidade que deriva de certos passos da nossa lei administrativa e das extravagantes, que criam às autarquias toda a sorte de obrigações ...
Mas voltaremos a este assunto ...

O Sr. Martins da Cruz: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Martins da Cruz: - Tenho estudo a seguir com toda a atenção a intervenção de V. Ex.ª, mas verifico não poder estar de acordo com algumas considerações, sobretudo nas que respeitam à análise financeira da vida municipal, a por ora não desejo tomar posição quanto a aspectos doutrinários que V. Ex.ª acaba de focar e que poderiam ter incidência na reforma fiscal que está a ultimar-se.
Penso que mereceria a pena, para ajudar a compreender bem a situação financeira dos municípios, registar alguns números que, a meu ver, não consentem conclusão tão categórica como aquela que se me afigura que V. Ex.ª está a pretender tirar das considerações que fez. E, assim, reportando-me apenas aos primeiros vinte anos de vigência do actual Código Administrativo, ou seja de 1936 a 1956, direi que nesse período, salvo erro, as despesas do Estado aumentaram cerca de três vezes e meia, enquanto as despesas dos municípios aumentaram na ordem das cinco vezes, se a memória me é fiel.
Quer dizer: foi possível aos municípios nestes primeiros vinte anos de vigência do actual Código Administrativo despenderam verbas que perfazem cinco vezes o total despendido em 1936, enquanto o Estado via os dinheiros por ele despendidos aumentados apenas em cerca de três vezes e meia.
Poderia supor-se que este aumento era feito à custa de dívidas contraídas pelos municípios e, por conseguinte, esse aumento não teria o significado de exprimir igual aumento nas receitas. Mas também quanto a esse possível argumento direi que a dívida dos municípios em 1929 andava à volta de 130 000 contos e representava cerca de se por cento das receitas normais dos municípios.
Vinte anos depois a dívida dos nossos municípios é da ordem dos 450 000 contos, mas este aumento representava apenas cerca de 30 por cento daquelas receitas.
Em face disto, talvez não seja exacto concluir - e eu estava a seguir a ordem de considerações de V. Ex.ª - que, mercê do Código Administrativo em vigor, se tenha

criado aos municípios uma situação financeira calamitosa. Talvez se possa concluir que a sua situação financeira lhes permitiu, nos primeiros vinte anos do Código Administrativo, um fomento tão extraordinário que lhes exigiu um aumento de despesas igual a cinco vezes o volume das despesas anteriores à vigência daquele código.

O Orador: - Agradeço as apreciações de V. Ex.ª e devo declarar que não é a primeira, nem a segunda, nern até a terceira vez que tenho ouvido isso, e também li essa opinião certamente na fonte em que V. Ex.ª a leu. Mas essa opinião não me convenceu, e é pena que tenha convencido V. Ex.ª

O aumento das receitas a que V. Ex.ª se referiu, esse aumento de possibilidades, toda essa grandeza, refere-se, infelizmente, a uma escassa, não chega a meia centena de municípios, precisamente os mais favorecidos, os das cidades, onde a vida experimentou uma sensível melhoria.

Estamos aqui no caso das estatísticas, e lembro-me da história, que V. Ex.ª também conhece, do pobre e do rico que dispunham de dois bifes. Como havia dois bifes a distribuir por dois, estatisticamente cada um comeu o seu, quando a verdade é que o rico comeu os dois. Assim, também os municípios pobres deste País permaneceram sempre pobres, enquanto os municípios ricos sempre se mantêm ricos, por virtude do gigantismo da urbe, por virtude de estarem mais ao «pé do lume».

Dentro do condicionalismo criado pelo Código Administrativo, os municípios pobres só podem fazer o que lhes deixam. Se as suas contribuições vêm através das contribuições do Estado e através da comparticipação, necessariamente que a sua percentagem é maior onde a vida enriqueceu, onde as condições do progresso ...

O Sr. Alberto de Meireles: -Onde há dois bifes!

O Orador: - Exactamente, onde há dois bifes. Não estou aqui a defender os graúdos, mas aqueles que, como no distrito de V. Ex.ª, já se lhe têm chegado ao pé a dizer: «Dr. Martins da Cruz, veja lá se pede uma fontinha cá para a terra».

Suponho que esclareci V. Ex.ª O que V. Ex.ª citou são tudo normas estatísticas que podem convencer no papel os tecnocratas, mas não convencem o bom povo e aqueles que como eu sabem que, com estatística ou sem estatística, o que é certo é que a vida local da zona desfavorecida continua submetida a toda a sorte de inibições, e não lhe podem acudir as câmaras que servem essas zonas!

Eeferida a importantíssima gama das missões que. dentro de um objectivo espírito de compreensão, se entregaram às autarquias, cumpre agora apreciar, ainda que rapidamente, os meios que se lhes facultaram para as realizarem - as suas receitas- e o montante do que gastaram.

As receitas as classifica o código em ordinárias e extraordinárias, referindo-as nos artigos 671.º e 703.º e seguintes.

Nas ordinárias, as mais importantes são: os impostos directos e indirectos, os rendimentos dos bens próprios e as taxas. Nas extraordinárias, as de mais vulto -o produto de empréstimos, o produto da alienação de bens - as comparticipações e os subsídios eventuais do Estado.

As despesas, segundo o mesmo código determina no artigo 675.º, são: ordinárias ou extraordinárias e obrigatórias ou facultativas.

Das obrigatórias tratam os artigos 750.º e 7õl.º

O breve cotejo dos elementos fornecidos nos sumários da Direcção-Geral de Administração Política e Civil referentes aos anos de 1957 a 1961 demonstram que nestes