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15 DE FEVEREIRO DE 1964 3229

contra a vontade de toda a população algarvia veio a acontecer com a indústria de álcool de figo.

Para uma verdadeira reconversão de culturas na lavoura algarvia, para uma nova e melhor vida agrícola, precisamos antes de mais fazer regressar a terra o homem do campo, dando no agricultor uma maior e mais segura rentabilidade agrícola, para que este assegure ao trabalhador um melhor salário e, consequentemente, um melhor nível de vida.

Urge estancar a emigração, a emigração algarvia. Só em 1962 emigraram oficialmente 1 045 indivíduos, pertencendo só ao concelho de Loulé 461. Isto oficialmente, pois não se pode calcular ou avaliar com precisão o número dos que emigram clandestinamente.

Sem a necessária mão-de-obra, dada a especial agricultura algarvia, mormente pelos seus frutos secos, não é possível obter-se uma maior produção, tanto mais dado o exagerado custo da mecanização agrícola, que tanta ruína já causou por falta de boa organização colectiva. É urgente, á absolutamente necessário, criar-se no Algarve, junto de cada uma das suas escolas técnicas, cursos elementares de instrução agrícola, criando-se também dois cursos complementares nos mais importantes centros agrícolas, Silves e Tavira.

Não se compreende como achar colocação na indústria e no comércio nacional de tantos e tantos milhares de rapazes que frequentam as escolas técnicas. Só no Algarve e nas suas sete escolas técnicas a frequência deve ascender a 4 000 rapazes, e, não tendo aumentado a indústria algarvia e não sendo diferente a sua vida comercial, como colocar e onde os rapazes que vão saindo das escolas técnicas?

Há que criar ainda no Algarve, pelo menos, três fábricas de álcool para figo e alfarroba, uma em - Silves, outra em Loulé e outra em Tavira. Proteger devidamente a indústria da pasta de figo, valor importante de exportação para a América do Norte e que cada dia mais se torna a melhor aplicação para o figo comestível do Algarve.

Uma fábrica de celulose em Monchique, cuja serra tem condições climatéricas excepcionais para a florestação e onde já existe a maior zona de floresta do Algarve. Demais ao abrigo da Lei n.º 2 069 e da Lei n.º 2 017, começaram já os serviços florestais a instalar viveiros, a projectar zonas de arborização, algumas já com parecer favorável da Câmara Corporativa e outras até com a aprovação do Conselho de Ministros, como as dunas da Carrapateira.

Se nos lembrarmos de que há no Algarve uma área de 248 400 ha por arborizar, nomeadamente nas serras do Espinhaço de Cão, Monchique, Caldeirão, Monte Figo, em barroca! e terrenos arenosos, e de que apenas se encontram arborizados 18 por cento, vemos a extensão deste importante problema agrícola do Algarve.

Vou terminar, Sr. Presidente, fazendo votos para que este aviso prévio sobre os problemas agrícolas seja escutado e apreciado pelas entidades oficiais, por forma a encontrarem-se as melhores soluções, já tanto prejudicadas pela grande demora havida, e que venham ainda a tempo de não se perder de todo o melhor sentimento das gentes portuguesas: o amor a terra.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Cutlieiro Ferreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: quis a lúcida inteligência do nosso brilhante colega Eng.º Amaral Neto levantar nesta Câmara, através de um oportuníssimo aviso prévio sobre a crise agrícola, a discussão dos actuais e prementes problemas que afectam um dos mais' sacrificados, sectores da economia nacional - a lavoura.

Bem haja,. Sr. Deputado Amaral Neto, peia justeza dá sua intenção e pela esperança que todos depositamos nos resultados benéficos deste debate.

Porque represento, nesta Câmara, um distrito essencialmente agrícola - o distrito de Évora -, muito embora outros ilustres colegas, certamente mais qualificados, possam, brilhantemente, apresentar suas queixas, suas dúvidas, seus aplausos e suas soluções, não devo eximir-me a dar o meu contributo e colaborar, como posso e sei, na discussão das causas e efeitos da crise que, tão gravemente, afecta a minha região. Já por várias vezes, sempre modestamente é certo, me tenho ocupado dos problemas causadores e resultantes dessa crise do alto desta tribuna, que deveria ser, e nem sempre é, escutada com interesse por quem de direito, porque aqui se exprime a vontade da Nação. Mesmo quando se critica, e essa missão é tão honrosa como a de louvar, se pode, e deve, proceder de conformidade com os sagrados interesses da Pátria. Nessa disposição aqui estou.

Que existe uma grave crise agrícola, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é já um lugar-comum nas constantes afirmações de todos os sectores da vida nacional e pelas mais autorizadas vozes dos nossos governantes e governados.

Mas, antes de tudo, por que existe essa crise?

São fundas, longos e envelhecidas as raízes dessa crise. Há culpas dos homens, do clima, dos sistemas ...

As culpas dos homens começaram quando estes não se aperceberam da evolução que a exploração racional da terra os obrigava ao estudo, à experiência, à luta permanente com os elementos, as pragas e as doenças. Quando o homem se esqueceu, como dirigente, da existência de outros homens e não agiu em jeito de ser útil a si e, mais ainda, ao seu semelhante.

Quando o homem, por falta de directrizes superiores, abandonou a terra, muitas vezes na falsa miragem de outros bens mais fáceis de adquirir, mas também mais fáceis de perder.

Quando o homem, desamparado, se esqueceu de que é um ser sociável e não actuou dentro do meio social, procurando, com exagerado individualismo, resolver todos os seus problemas com exclusão da ajuda dos seus concidadãos porque lhe faltou a orientação superior. E é tão verdade que o homem aparece como o maior culpado quanto é certo que todas as doutrinas, tanto emanem de órgãos políticos ou religiosos - caso das mais recentes encíclicas -, culpam o homem, criticam o homem, ensinam o homem e aconselham o homem.

Perante esta culpa só resta melhorar o homem.

Como? ... Certamente pela educação, pela instrução e, sobretudo, pela aceitação das mais elementares normas de respeito pelos interesses de todos, qualquer que seja a sua posição na ordem geral da sociedade humana. Atingida esta meta, muito teremos conseguido em benefícios, tanto morais como reais.

As culpas do clima, tão sobejamente conhecidas, agravam, na mais larga escala, as possibilidades, a existência e a duração da crise agrícola. Inconstâncias de temperatura, pluviosidade incontrolada, secas, ventos nocivos e mutações, inteiramente imprevisíveis, das estações do ano dificultam, impossibilitam até sementeiras, mondas, adubações de cobertura, ceifas, debulhas, carregos, etc. . Contra esta culpa, talvez a mais grave, pouco pode a astúcia do homem. O clima constitui, certamente, o factor decisivo no carácter aleatório que predomina na agricultura.