10 DE DEZEMBRO DE 1964 4069
Reconheço a impossibilidade, tal a vastidão e a importância das matérias, de dar aqui um ligeiro esboço da problemática económico-social dos dois grandes territórios portugueses de África. Tentarei, quando muito, referi-los em conjunto para acentuar a identidade de alguns problemas.
Comecemos pela estrutura populacional.
Angola, cerca de 14 vezes maior do que a metrópole, disporá de metade da sua população, o que significa uma densidade média 28 vezes inferior. É certo que o crescimento entre 1950 e 1960 foi superior a 16.5 por cento, o que representa um sucesso se tivermos em conta os índices anteriores, nomeadamente os anteriores a 1930 - cerca de 7 por cento.
A própria distribuição regional é desequilibrada. A uma densidade média de 3,9 habitantes por quilómetro quadrado na província correspondiam, ainda em 196O, 20,1 habitantes por quilómetro quadrado no distrito do Huambo, 12,6 no de Benguela, 11,3 no de Luanda, mas já 0,8 no de Moçâmedes, 1,3 no Moxico e 1,5 na Lunda.
Quanto a Moçambique, cuja população passou de 5 738 911 habitantes em 1950 para 6 592 994 em 1960, a densidade média de 8,4 habitantes por quilómetro quadrado, verificada em 1960, é obtida à custa de uma distribuição também muito irregular: 26,65 habitantes por quilómetro quadrado no distrito de Lourenço Marques. 18,39 no de Moçambique, mas já 2.3 habitantes por quilómetro quadrado no Niassa e 4,71 no distrito de Tete. Acresce que dentro de cada distrito a ocupação do solo é igualmente desequilibrada: o distrito de Tete, que, por exemplo, na Angónia acusava 23.25 habitantes por quilómetro quadrado, tinha no Zumbo apenas 1,39.
Os territórios vizinhos de Angola e Moçambique parece terem exercido uma forte atracção relativamente às nossas populações. São os resultados de uma acção polarizadora que, por exemplo, em relação a Angola, o Prof. Teixeira Pinto (cf. Angola: Pólos e Perspectivas de Desenvolvimento) sintetizava, mais ou menos, assim:
Uma polarização do ex-Congo Francês, que actua sobre a parte norte do enclave de Cabinda, traduzida na utilização de Ponta Negra; uma polarização do ex-Congo Belga sobre a zona fronteiriça de Cabinda e sobre a zona do Norte de Angola, nomeadamente sobre o nosso Congo; uma atracção da antiga Rodésia do Norte sobre as regiões da terminal do caminho de ferro de Benguela e das áreas de Bunda e Lufana: finalmente, a influência do Sudoeste Africano sobre os territórios que vão do Cuangar ao Mucusso.
Quanto a Moçambique, para lá da divisão dos grupos étnicos, como os Macondes, os Maganjas, os Angónis, etc., há a periódica e volumosa emigração para trabalho fora da província. Assim, segundo os elementos do Anuário Estatístico de Moçambique, de 1962, os registos das curadorias do Transval e da Rodésia do Sul acusavam, respectivamente, 166144 e 202 863 trabalhadores, ou seja um total de cerca de 370 000 indivíduos.
Qual o comportamento das populações de Angola e de Moçambique relativamente à economia de mercado?
Transcrevo do livro Promoção Social em Moçambique esta caracterização da estrutura sócio-económica:
a) Uma minoria (2,5 por cento) composta por europeus, asiáticos, mistos e também por alguns africanos, concentrada na parte urbanizada das cidades, vilas e povoações e também nas explorações mineiras e agro-pecuárias dispersas pelo interior;
b) Uma minoria (3,5 por cento) constituída por elementos de diversas raças, mas sobretudo por africanos, com tendência para se aglomerar, em condições deficientes, na periferia dos centros populacionais mais importantes;
c) Uma grande maioria (94 por cento) de africanos rurais que vive, basicamente, num regime de economia de subsistência, complementado pelo trabalho assalariado de tipo migratório e por alguma agricultura de rendimento.
Toda a panorâmica demográfica de Angola e Moçambique recomenda, assim, que se intensifique uma política de população: realizar a promoção económico-social das populações naturais; incentivar a fixação de populações deslocadas de outros territórios portugueses que assumam as características de territórios de emissão.
A luta contra a mortalidade, nomeadamente a mortalidade infantil, a consciencialização das noções de trabalho, nutrição, higiene, ambição económica e cultural, eis uns tantos temas que nos deverão prender ao considerar II sorte dos nossos irmãos de África.
Quanto à deslocação de populações metropolitanas para o ultramar, o nosso esforço tem sido modesto, se considerarmos a vastidão dos territórios a desenvolver e o número de portugueses que emigram para países estrangeiros. E se é verdade que em Angola o aumento da população branca se tem intensificado (de 43 por cento de acréscimo entre 1930-1940 para 79 por cento entre 1940-1950 e para 103 por cento entre 1950-1960), estamos muito longe daquele ritmo indispensável ao desenvolvimento das forças produtivas da província e à consolidação de uma sociedade multirracial que, nos tempos futuros, há-de constituir título de justificado orgulho para as gerações que hoje se batem pela paz e pelo progresso de Angola.
Mas quais os recursos que Angola e Moçambique oferecem à intensificação dessas forças produtivas?
De novo nos achamos perplexos ao considerar as possibilidades da agricultura, da silvicultura, da pecuária, das pescas, do subsolo, das fontes energéticas.
Do ponto de vista agrícola - acentua-se no projecto do Plano Intercalar a propósito de Angola -, as características oroclimáticas possibilitam, com as limitações derivadas das características pedológicas, uma gama de potencialidades para a produção agrícola e pecuária, que vai desde os produtos tropicais até aos dos climas frios. Bastará a este respeito apontar terem sido identificadas nada menos de 36 zonas agrícolas distintas.
Quanto aos recursos do subsolo, as disponibilidades já reconhecidas de Angola (diamantes, petróleo, ferro, manganês) e de Moçambique (carvão, ferro, cobre, berilo, colúmbio tantalite, urânio), e sobretudo as fundadas perspectivas de novas riquezas, permitem-nos aceitar as indústrias extractivas como um grande ponto de arranque para atingirem a maturidade económica.
Finalmente, os recursos energéticos, apoiados em ambos os territórios em mananciais quase inesgotáveis de energia hídrica em largas possibilidades oferecidas pelo petróleo, gases e carvões, apoiam um esforço de industrialização, que já não se pode dizer incipiente, mercê de algumas realizações já concretizadas ou em curso.
Alguns números, tomados ao acaso, poderão dar uma ideia deste esforço de industrialização.
Até 1955 o montante do capital investido nas indústrias de Angola era de 1 592 000 contos. Em fins de 1962 esse volume atingia já 3 100 000 contos. Em 1961 investiram-se 274 000 contos e em 1962 391 000.
Mas o esforço acelerou-se posteriormente. Assim, em 1963 dava-se conta, além de outros, de mais os seguintes empreendimentos industriais em Angola: laminagem destinada à produção de varão de ferro e de trefilados