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10 DE DEZEMBRO DE 1966 791

Depois veio a proposta de lei relativa ao emparcelamento da propriedade rústica, sobre a qual a Câmara discutiu ardorosamente e se dividiu na sua votação. E, coisa curiosa, venceu a corrente de opinião menos conservadora e menos tradicional da Câmara.
Bastam-me estes dois exemplos citados por ordem cronológica para chegar aonde quero.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, apareceu então com toda a pujança da sua inteligência, com toda a capacidade do seu poder de síntese, com toda a tolerância do seu temperamento de homem político, com toda a generosidade do seu coração de homem de bem.
Creio que ninguém pode dizer que não usou da plena liberdade de expressão dentro desta Casa. Creio que ninguém, com verdade, pode dizer que alguma vez foi coagido a dizer o que não queria.
Esta foi a primeira lição que V. Ex.ª me deu, e, como para ela tinha uma grande receptividade, convenci-me de que não havia razões para receios ou dúvidas. Depois, ao longo das sessões da VIII Legislatura, V. Ex.ª foi ensinando, pelo exemplo, que a defesa dos interesses do Estado era a condição primeira da actividade política, que o interesse colectivo se devia sobrepor ao interesse individual, que não há boa administração pública sem uma determinada disciplina política... e não me alongo mais, apenas me permitindo recomendar aos Srs. Deputados que entraram de novo nesta legislatura a leitura do extraordinário depoimento político que o Dr. Mário de Figueiredo fez a esta Câmara no encerramento da legislatura passada.
Faltar-me-ia falar do amigo respeitado. Não o faço, talvez não fique bem. Apenas direi que a amizade, quando provém da inteligência e do coração, é o sentimento mais belo que se pode possuir.
E esta a minha homenagem, Sr. Presidente, e muito obrigado.
Srs. Deputados: Cerca de 50 por cento dos Srs. Deputados não estiveram aqui na legislatura passada. Por isso repetirei, ao mesmo tempo que lhes apresento os meus afectuosos cumprimentos, aquilo que disse a primeira vez que subi a esta tribuna: ofereço toda a minha modesta colaboração e a minha leal cooperação para tudo quanto respeite à defesa dos interesses do Estado e à boa governação do povo português.
Aos restantes Srs. Deputados, companheiros de quatro anos de trabalho, saúdo com respeito e amizade e digo-lhes que aqui estou como dantes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao discutir-se a Lei de Meios hesita-se sempre sobre qual o caminho que se deve seguir.
De facto, tratando-se de um enunciado dos princípios gerais do regime jurídico financeiro que o Estado se propõe adoptar no ano fiscal seguinte, parece que o caminho mais conforme seria, para que a discussão da proposta de lei se situasse dentro do objectivo em causa, analisar, de uma maneira geral, as grandes opções da política financeira que o Governo estabelece na proposta e, incidentalmente, referir e discutir, a favor ou contra, determinados aspectos particulares do seu texto. E assim têm cabido na discussão da proposta, ao longo dos anos, praticamente todos os assuntos que interessam à Nação, como um todo, como os que respeitam aos interesses regionais e locais.
Como é sabido, a Constituição não permite que o orçamento do Estado seja submetido à apreciação e aprovação da Câmara, ao contrário do que acontece na maioria dos países da Europa ocidental. A disposição constitucional é sã, porque assim evita as especulações e as distorções que os diferentes sectores de opinião, através de grupos de Deputados, poderiam exercer sobre as receitas e as
despesas do Estado, tirando ao orçamento o equilíbrio global que deve ter de acordo com as opções estabelecidas.
Essa disposição é ainda lógica em relação à estrutura política do Estado, que não aceita os partidos políticos e que não dá à Câmara poderes para aumentar e diminuir as receitas e as despesas do Estado.
Diz-se em certos sectores da crítica que a Câmara ao discutir e aprovar a Lei de Meios passa um cheque em branco ao Governo, que com ele poderá administrar a vida do País, como lhe aprouver.
A crítica não é válida, porque para que fosse seria necessário, primeiro, que o Governo não fosse capaz, segundo, que se desviasse, na elaboração do orçamento e na sua execução, das opções estabelecidas e aprovadas na Lei de Meios, terceiro, que não se submetesse à crítica da Câmara sobre a forma como executou o orçamento e, finalmente, que não aceitasse essas críticas como elementos de valor para a sua actuação futura.
As duas primeiras condições têm ao longo destes 40 anos sido satisfeitas e creio que, salvo casos especiais, ninguém de boa fé as pode contestar. A terceira traduz-se na discussão e aprovação da Conta Geral do Estado, que esta Câmara realiza todos os anos com toda a liberdade e competência. Finalmente, pode dizer-se que as críticas, quando bem fundamentadas, são aceites pelo Governo e são objecto de consideração de acordo com as possibilidades existentes na administração de anos futuros.
Vem tudo isto a propósito para dizer que é mais fácil (falo de um ponto de vista pessoal) abordar e discutir a Conta do Estado do que a Lei de Meios, desde que se queira ser objectivo e coerente, como parece convir nos tempos que correm, no campo da actividade política.
Apesar disso, tentarei abordar um problema da vida nacional e internacional para o qual o Estado tem contribuído, ao longo dos anos, com muitas dezenas de milhares de contos e sobre o qual algumas dúvidas, por vezes fundamentadas, têm sido levantadas.
Trata-se da nossa posição como País membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte, conhecida nos países de língua francesa como O. T. A. N.º e nos países de língua inglesa como N. A. T. O.
O problema tem especial oportunidade, julga-se, no presente momento e em relação à Proposta da Lei de Meios que estamos discutindo, por duas razões:

A França deixou a partir de 1 de Julho de 1966 a parte militar da Organização, obrigando assim a transferir todos os órgãos militares da aliança para fora do seu território.
O Tratado poderá ser denunciado em 1969 e a Organização deixar de existir em 1970.

A primeira obrigará a despesas adicionais em 1967 que o País terá de pagar na respectiva proporção e para as quais, julga-se, o Ministério das Finanças terá de estar preparado.
A segunda terá de ser analisada no quadro da política geral portuguesa e, como consequência, nas implicações financeiras que dela resultem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Organização do Tratado do Atlântico Norte nasceu em 1949 e na sua existência foi capital para a vida da Europa ocidental. De facto, imediatamente após o fim da segunda guerra mundial, a União Soviética anexou territórios habitados por 24 milhões de indivíduos e estendeu a sua dominação política sobre cinco países independentes da Europa (Polónia, Bulgária, Hungria, Roménia e Checoslováquia), assim como sobre uma parte da Alemanha, isto é, uma região contando cerca de 94 milhões de habitantes.