1400 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 78
Fátima foi, depois disso, santuário de milagres físicos. Mais: como acentuou o episcopado português na pastoral colectiva de 1 de Fevereiro de 1942, de milagres morais.
70 000 peregrinos em 13 de Maio de 1923, 80 000 um ano depois, 100 000 em 1925, 400 000 em 1926, eis a expansão numérica de uma apoteose de luz que mereceu a Paul Claudel esta luminosa síntese: «Fátima é uma erupção brutal, quase escandalosa, do outro mundo, através das fronteiras agitadas do mundo terreno.»
Sr. Presidente: Acentua o ilustre historiador Costa Brochado, no seu livro Fátima à Luz da História, que com a subida ao Poder de Sidónio Pais se iniciou em Portugal uma nova era, caracterizada pela abolição do jacobinismo democrático em política e pela tolerância religiosa no que toca à vida espiritual da Nação.
Triunfante a revolução em 8 de Dezembro de 1917, ou seja, no Dia da Padroeira, o ano de governo de Sidónio Pais distinguiu-se por um conjunto de medidas tendentes a servir a paz religiosa. Logo em 9 de Dezembro. Sidónio Pais anulava, em nome da Junta Revolucionária, as penas impostas aos bispos pelos Governos da República. Em 22 de Dezembro, era anulada a interdição de residência imposta a ministros da religião católica e considerada sem efeito a proibição de exercício de culto em edifícios do Estado. Em 2 de Fevereiro de 1918, era revista a Lei da Separação, abolindo-se o beneplácito, a exigência de licença das autoridades para o exercício do culto, a fiscalização sobre os seminários, a proibição do uso de hábitos talares e as disposições que concediam a sobrevivência de pensões às «viúvas» e aos «filhos» dos padres pensionistas. Em 2 de, Março de 1918," foram autorizados os estabelecimentos de assistência a aceitar doações, heranças e legados sujeitos a encargos pios e culturais e, por portaria de 5 do mesmo mês, reabriam ao culto inúmeros templos que tinham sitio profanados e encerrados.
Encarou-se igualmente o restabelecimento das relações diplomáticas entre. Portugal e a Santa Sé. As negociações foram iniciadas em Madrid, entre o Dr. Egas Moniz, ao tempo nosso ministro naquela capital, e o núncio de Sua Santidade em Espanha. Em 10 de Julho de 1918, o. secretário dos Negócios Estrangeiros, Espírito Santo de Lima, fazia publicar no jornal oficial um diploma restabelecendo a Legação de Portugal na Santa Sé, ao mesmo tempo que era nomeado o núncio em Lisboa.
A presença do presidente Sidónio Pais em actos de culto católico retomou também uma tradição que a República interrompera. Foi assim em 15 de Maio de 1918, aquando das solenes exéquias por alma dos nossos soldados, em 14 de Novembro, no Te Deum em acção de graças pela vitória dos Aliados, e na própria manhã do dia em que foi assassinado, no sufrágio pelas almas dos marinheiros do caça-minas Augusto de Castilho.
O golpe vibrado por Sidónio Pais na demagogia maçónica segue-se imediatamente às aparições de Fátima e, mau grado o regresso, depois do seu assassínio, à desordem política, as relações oficiais entre a República e a Igreja não conheceram retrocesso.
Em finais de 1922, dois acontecimentos de relevo, pelo seu significado, testemunharam os novos propósitos: confirmava-se que o Ministro da Instrução, Leonardo Coimbra, pretendia levar ao Parlamento uma proposta de lei favorável à prática do ensino religioso nas escolas particulares; ultimaram-se as diligências para a cerimónia da imposição do barrete cardinalício - o que efectivamente veio a acontecer em 3 de Janeiro de 1923 — ao núncio apostólico, restabelecendo-se uma antiga prerrogativa dos chefes de Estado portugueses.
E, embora com o protesto indignado das alfurjas e a agitação da rua, em Fevereiro de 1926, o Chefe do Estado, Dr. Bernardino Machado, acompanhado de elementos do Governo, associava-se às comemorações do quarto aniversário da coroação de Pio XI na Sociedade de Geografia. Cunha Leal, o inspirado orador da ocasião, terminou a sua «defesa das liberdades que à Igreja são devidas» afirmando que «nenhum político digno deste nome pode recusar à Igreja em Portugal as regalias e a consideração a que tem direito».
Quando eclodiu o movimento de 28 de Maio, congregavam-se em Braga cerca de 60 000 católicos, por ocasião do mais imponente congresso mariano até então realizado em Portugal.
Passou à história a resposta de Gomes da Costa aos que o interrogaram sobre a possibilidade de prosseguir tão grandiosa manifestação de fé. Tais palavras anunciavam o espírito que posteriormente viria a presidir às relações entre a Igreja e o Estado.
A Concordata e o Acordo, Missionário de 1940, a que V. Ex.ª, Sr. Prof. Mário de Figueiredo, ficou tão insignemente ligado, são testemunhos eloquentes da nova era.
Vozes: — Muito bem!
O Orador: — «Não tivemos a intenção de reparar os últimos 30 anos da nossa história», afirmou o Sr. Prof. Oliveira Salazar, «mas de ir mais longe, c, no regresso à melhor tradição, reintegrar, sob este aspecto, Portugal na directriz tradicional dos seus destinos. Regressamos, com a força e a pujança de um Estado renascido, a uma das grandes fontes da vida nacional, e, sem deixarmos de ser do nosso tempo, por todo o progresso material e por todas as conquistas da civilização, somos, nos altos domínios da espiritualidade, os mesmos de há oito séculos.»
Depois da assinatura da Concordata, Fátima continua a ser cenário de manifestações grandiosas, ponto de convergência do povo cristão.
Em 1942, no 25.° aniversário das aparições, Pio XII — o papa que assistiria à reposição do «milagre do sol» nos jardins do Vaticano — consagrou o mundo ao Imaculado Coração de Maria.
Em 1946, nó quarto centenário das Cortes Gerais de 1646, que haviam proclamado a Senhora da Conceição Padroeira do Reino e Bainha dos Portugueses, o legado do papa, cardeal Masella, perante 800 000 peregrinos, coroa a imagem que se venera na Capela das Aparições.
Em 1951, o cardeal Tedeschini, também como legado a laterc, preside ao encerramento do Ano Santo Mariano perante mais de um milhão de peregrinos.
Em 1964, já no pontificado de Paulo VI, é a Rosa de Ouro atribuída ao Santuário.
Nestes últimos 25 anos, príncipes da Igreja, entre os quais o futuro João XXIII, e governantes das nações oraram em Fátima. Peregrinos de todo o mundo afluíram à Cova da Iria e, renovados no perfume da Graça invisível, aprenderam que o Milagre de Fátima é também o Milagre de Portugal.
Mas a imagem da Senhora de Fátima transformou-se em peregrina do Mundo.
É uma expressão formal do universalismo da Mensagem de Fátima. Esta não se destina apenas a Portugal, ou mesmo à Igreja Católica. Dirige-se ainda aos cristãos separados, aos maometanos, enfim, a todos os homens.
«Fátima, explosão universal . . . representa, no colapso da vida moderna, o apelo sobrenatural às forças latentes da humanidade em declínio para que volte a matar a