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1804 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 97

Esta cláusula da franquia no ramo «Automóveis», ou mais severa ainda, a cláusula do descoberto obrigatório, é defendida vivamente por toda a doutrina: Esmein, Ripert, Capitant, Mazzeauds, Colin, Savatier, etc. (cf. L'Assurance Automobile de Perraud Charmantier e Rauzy, p. 39).
E V. Ex.ª mesmo, Sr. Presidente, defendeu esta cláusula em responsabilidade civil, quando em 1936, a propósito do seguro obrigatório, afirmou que era necessário «organizar um sistema de a obrigatoriedade do seguro não representar uma forma de provocação à imprevidência», além de ser «imoral que uma pessoa possa transferir totalmente a sua responsabilidade por efeito de um facto ilícito».
Besson, no seu livro sobre seguro obrigatório de automóvel (1960), defende a cláusula, no plano do interesse geral e da moralização do seguro, por que o segurado que contratou com uma cláusula de franquia ou de descoberto obrigatório fica interessado em se mostrar diligente: trava-se assim o cometimento de faltas e, portanto, a verificação dos desastres.
Tal cláusula não tem apenas esta virtude de prevenção e de frenação; tem ainda a vantagem de favorecer o automobilista prudente e cuidadoso, permitindo-lhe a efectuação de um seguro sensivelmente mais barato.
Os outros automobilistas, os da meia bola e força, os do deixa andar que a companhia paga, esses, que hão-de ter desastres com certeza, não lhes convém fazer seguro com cláusula de franquia.
Mas o que não é justo é que uns c outros sejam tratados pela mesma bitola.
E antes de abordar o último ponto da minha intervenção, que é o da vigência ou não vigência da nova tarifa, farei uma breve alusão a um ponto que também já aqui tem sido versado: o do seguro obrigatório de responsabilidade civil.
Devo declarar que sempre fui partidário da instituição do seguro obrigatório, por me parecer absolutamente escandaloso e anti-social que possam circular livremente, nas ruas e nas estradas, automóveis muitas vezes conduzidos, dir-se-ia, com fúria assassina e sem que os seus condutores ou proprietários tenham feito seguro, ou tenham quaisquer bens para responder pelos gravíssimos prejuízos que causam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Nunca compreendi, por isso, o motivo por que esta Assembleia repudiou em 1936 o seguro obrigatório, quando um Deputado aqui apresentou uma proposta nesse sentido, apesar do parecer favorável da Câmara Corporativa e do contraprojecto de V. Ex.ª, Sr. Presidente, igualmente a favor da transferência obrigatória, mas ficando sempre o automobilista pessoalmente responsável por um quinto da indemnização a pagar.
Mais recentemente, também o Prof. Vaz Serra havia elaborado um anteprojecto para ser incluído no novo Código Civil, onde se instituía o seguro obrigatório para os automóveis, ou a prestação de caução.
Mas, relativamente ao problema que agora nos ocupa, julgo necessário ponderar que o estabelecimento do seguro obrigatório deve tornar mais onerosa a tarifa aprovada, por dois motivos: primeiro, porque há uma série de defesas que o segurador pode invocar, mesmo contra terceiros, em regime de seguro facultativo (embriaguez do condutor, falta de participação do sinistro, etc.) e que pode deixar de poder invocar em regime de seguro obrigatório: em segundo lugar, porque; estabelecido este regime, é necessário criar também um fundo de garantia, para indemnizar as vítimas de automobilistas desconhecidos, ou cujo seguro é nulo, está suspenso, é insuficiente, etc.
Ora esse fundo de garantia é alimentado com contribuições totais, ou parciais, quer das companhias de seguros, quer dos próprios segurados, estes mediante um adicional sobre os prémios que pagam às companhias.
Como disse, porém, as vantagens que resultam do seguro obrigatório excedem largamente as dificuldades que o seu estabelecimento possa trazer.
Relembro, de passagem, que, como todos sabem, o seguro obrigatório já existe entre nós para os transportes colectivos em automóvel; pode ser imposto, por sentença, a condutores que tenham cometido determinadas infracções; e no que respeita à propriedade horizontal o novo Código Civil manteve também a obrigatoriedade do seguro do prédio, que já fora estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 40 333.
Referir-me-ei agora, para terminar, à situação das companhias perante as novas tarifas.
Não havia na legislação portuguesa de seguros, salvo quanto aos seguros de vida, nenhum preceito sujeitando as companhias a pedirem a aprovação superior para a sua tarifa de prémios.
Sòmente o Decreto-Lei n.º 24 041, de 20 de Junho de 1934,- que criou o Grémio dos Seguradores -depois substituído pelo Decreto-Lei n.º 26 484 -, veio estabelecer que competia ao Grémio fixar tarifas mínimas para os vários ramos, tarifas mínimas (a repetição consta de ambos os diplomas) que ficavam sujeitas à homologação do Ministro das Finanças, depois de a Inspecção de Seguros ter emitido o seu parecer.
De harmonia com estes preceitos, as tarifas mínimas dos vários ramos não estão sujeitas a outro formalismo: proposta do Grémio dos Seguradores à Inspecção de Seguros, parecer desta, despacho ministerial, aplicação da tarifa.
A razão pela qual o legislador só tratou das tarifas mínimas, e não se preocupou com as tarifas máximas, foi porque o livre jogo da concorrência, às vezes desenfreada entre as numerosas companhias, constituía travão suficiente para que elas não fixassem prémios especulativos. Mas o extremo oposto já era de recear: que essa concorrência desordenada as levasse a praticar prémios insuficientes, colocando as companhias na situação de amanhã não poderem satisfazer os compromissos assumidos. Em tal caso, os segurados não só perdiam os prémios que haviam pago, como ficavam, a descoberto, se o risco contra o qual tinham querido segurar-se viesse a concretizar-se.
Este perigo da subtarifação não era, nem é, uma especialidade nossa.
Perraud-Charmantier e Rauzy, nos seus tratados sobre o seguro automóvel, escreveram em 1940:

A concorrência desenfreada, a guerra das tarifas, o seguro de rastos, opuseram, uma contra outras, numerosas companhias, dando em resultado falências e escândalos que, por força das circunstâncias, chamaram a atenção dos Poderes Públicos. Daí, em 1935, a instituição de uma fiscalização apertada, e generalizada em 1938.

Bem recentemente, em Dezembro de 1966, foi em França retirada autorização para funcionar à Mutuelle Nationale d'Assurances dês Automobiles, cuja ruína foi provocada por uma política sistemática de sous-tarification.