1604 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 79
Como se depreende da analise dos valores comparáveis, as percentagens sobre o produto bruto, que são, respectivamente, 7 por cento no nosso caso e 9 por cento no caso do M. E. C., não nos ficam dúvidas de que estamos, mesmo neste campo dos subsídios, em atraso sobre a Europa, pois para que as percentagens fossem iguais teria a lavoura nacional de ter recebido subsídios que rondariam os 2 milhões de contos.
Se, porém, nos debruçarmos um pouco mais em profundidade sobre os termos de comparação que nos foram apresentados e entrarmos no campo dos preços percebidos pelas duas agriculturas, observamos que para a generalidade dos produtos agrícolas os preços são mais elevados no M. E. C. Tomando como referência os preços recebidos pelos agricultores do M. E. C em 1969, que tirámos das revistas da especialidade Monde Agrícola, n.º 441/442, e Marche Agricole, e aplicando-os às nossas produções só de cereais, azeite e corne de bovinos, verificamos que a lavoura nacional teria recebido, só nestes produtos e nesse ano, mais de 2 milhões de contos do que de facto recebeu depois de incluídos os subsídios, pois nos' cálculos os preços nacionais adoptados já incluem o tal milhão e meio de contos referidos. Propositadamente não incluímos outros produtos em que as diferenças contra nós são ainda mais favoráveis, tais como as outras carnes, as madeiras, porque já é suficientemente elucidativo o exemplo para mostrar quanto ganharíamos em ter um tratamento igual. Quanto teríamos recebido a mais, se se tivesse dado a conjugação dos dois factores apresentados, subsídios e preços, nos últimos anos?
Como se torna evidente, se estes factos tivessem sido. apresentados ao público, estamos certos de que a interpretação teria sido outra, pois que afinal até encontramos nestes dois pontos referidos uma das razões que fazem com que a nossa crise agrícola se mantenha e até se agrave. Com condições edafo-climáticas piores, preços de produtos mais baixos e custos de factores de produção - maquinaria, adubos, transportes, pesticidas, ferro, cimento, etc. - dos mais altos da Europa, havendo uma única excepção na mão-de-obra, se for tomada no seu valor nominal, mas não se formos para a relação custo produtividade, porque então já deixará de constituir excepção, não será para estranhar a situação em que se encontra a lavoura, pois milagres ninguém os faz.
Quanto ao que se afirma relativamente a não ter havido reconversão efectiva, a nossa admiração não pode deixar de ser grande. Os factos são tão evidentes que julgávamos não ser necessário referi-los, quanto mais repeti-los.
Ainda há um ano, nesta Câmara, dizia que, por virtude das técnicas de produção que a lavoura tem posto em execução, se permitiu aumentar a produção do trigo à tendência de 27 000 t anuais, embora reduzindo a área de cultura à taxa de 39 500 ha desde 1963. Como vemos, o avanço e aproveitamento de técnicas modernas permitiram elevai- produções por hectare, e se mais não se tem conseguido, isso se deve à pobreza dos solos de que dispomos e à incerteza do clima.
Praticamente hoje, pelo menos na região, responsável por 60 por cento da produção de trigo nacional, toda a cultura está praticamente mecanizada, não constituindo já motivo de admiração ver-se até o avião ou o helicóptero em trabalhos de adubação ou de mondas químicas, tão correntes são já essas práticas.
Mas os números falam por si, e recorrendo à estatística agrícola verificamos que de 1965 a 1969 - não nos foi possível obter dados oficiais de 1970 - foram adquiridas pela lavoura 1657 ceifeiras-debulhadoras, o que representa um investimento superior a 450 000 contos. De tractores agrícolas, as aquisições no mesmo período ultrapassaram as 11 900 unidades, o que mesmo considerando valores baixos, se pensarmos no custo das alfaias que necessariamente tiveram de ser adquiridas para os tornar operacionais, tais como charruas, grades, escarificadores, espalhadores de adubo e estrume, reboques, enroladores de feno, gadanheiras, enfardadeiras, etc., com certeza que, ponderando os valores médios dos custos e das cargas necessárias por maquina, temos um investimento que ultrapassa de longe o milhão e oitocentos mil contos.
Teremos, pois, de, mesmo sem considerar os outros investimentos em florestação, arranjo de terras, construção de instalações, etc., e toda a gama de investimentos nos gados, de muito foi ultrapassado o valor correspondente à verba de $30 por quilograma de trigo concedida para reconversão, e temos mais, pois estes investimentos são em si mesmo uma prova da reconversão de técnicas e métodos de cultura que, conjugados como o que ficou dito quanto a taxas de redução dos áreas cultivadas e ao aumento de produção de carne e leite de todos conhecido, prova que houve reconversão autêntica e no sentido preconizado; pois tudo isto não se consegue sem a reestruturação interna das empresas e das explorações, sem modificar rotações e métodos de trabalho. Mas também encontramos aqui nestes investimentos cujos valores se indicam, e nos que se referiram sem cálculos, outra das razões de ser de o sector agrícola éster descapitalizado e endividado, pois fez investimento a que não foram mantidas os rentabilidades previstas, porque se seguiu uma política estática de contenção de preços no produtor, com base nos valores de 1965, perante uma subida de todos os factores de produção, simultaneamente com o lançamento de novos encargos.
Como para fazer os investimentos a lavoura teve de recorrer ao crédito e não conseguiu o aumento de receitas proporcional aos gastos, ficou ainda pior do que esteva, como é evidente.
Outro ponto que agora vimos renascer é a ideia de uma agricultura competitiva, de que, alias, as comparações que se fazem no preâmbulo são um reflexo.
Já em 1964, referi aqui que os preços dos produtos agrícolas internos são diferentes de país para país e não coincidem com os do mercado mundial, sendo em regra muito superiores a estes. A propósito referi até o que numa reunião da C. E. A. tinha ouvido ao então Ministro da Agricultora francesa Mr. Pisani - que fez a afirmação de que não havia competição entre agricultores dos diferentes países, mas sim entre os seus Ministros das Finanças, e ouvi-lhe também dizer que a melhor maneira de manter um país subdesenvolvido era fornecer-lhe produtos agrícolas a preços baixos, pois assim se evita o desenvolvimento da sua agricultura, se não for mesmo caso de provocar a sua ruína.
Se recordarmos a citação que atrás fiz quanto a uma publicação na imprensa alemã em 1969, só teremos a confirmação de uma verdade já anunciada há anos por Pisani e que se mantém talvez ainda mais viva que então.
Raríssimos serão os produtos alimentares básicos que hoje são exportados por qualquer país ou grupo de países que não beneficie de fortes dumpings. Mesmo dentro dos grupos associados, tais como o M. E. C., os preços são diferentes de pois para pais, havendo fundos de compensação que trabalham automaticamente, não só para manter viáveis agriculturas de cada país, mas também para assegurarem os rendimentos dos explorações. Grande parte dos 75 milhões de contos referidos são gastos nestes equilíbrios e outra paute substancial nas ajudas à exportação de excedentes.