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2060 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 102

O Sr. Miguel Bastos: - Sr. Presidente: Está aberto o debate na generalidade sobre a revisão constitucional.
E é no curso deste debate que me propus fazer algumas considerações de ordem muito geral, fugindo à descrição do pormenor, para só me ater a alguns aspectos que reputo fundamentais, da matéria já aceite, em princípio, pela comissão eventual desta Assembleia de que tive a honra de fazer parte.
As constituições representam o arranjo cuidadoso de um equilíbrio de competências no sentido de estabelecer um limite geral ao exercício do Poder e, simultaneamente, numa compensação, um sistema de travões recíprocos às pretensões das várias sedes do mesmo Poder.
Deste modo, a Constituição é uma garantia fornecida à sociedade contra os abusos do Poder: uma garantia jurídica determinada pelo limite das competências; uma garantia política decorrente dos contrapesos das várias formas do poder.
Além disto, tornou-se corrente incluírem as constituições um elenco de garantias dos particulares dirigidas fundamentalmente contra o Poder Público. Trata-se da afirmação de direitos fundamentais que, sob a invocação de princípios jusuaturalísticos, se apresentam negativamente, como limites à actuação do Estado.
Mais recentemente, o quadro constitucional tende a fixar também princípios positivos, obrigações concretamente atribuídas ao Estado de promover a satisfação de certos interesses.
Do que acabo de dizer parece evidente o ter de se considerar, ao estabelecer-se ou ao rever-se uma ordem constitucional, um grande equilíbrio no conteúdo das regras a fixar e, especialmente, não afastar ou esquecer as realidades do meio social em que aquelas vão viver e o momento histórico em que as mesmas vão ser aplicadas.
O Doutor Freitas do Amaral ao fazer, no princípio deste ano, em Évora, uma magnífica conferência sobre esta nossa revisão constitucional, contou uma pequena história que aqui peço licença para reproduzir.
Um dia os Gregos perguntaram a Solou:

- Qual é a melhor Constituição?

- E Sólon retorquiu-lhes:

- Respondei primeiro: para que povo e em que época?
E neste espírito, creio, que nos devemos debruçar sobre o estudo da revisão constitucional em curso: uma constituição para a nossa gente e a corresponder à nossa época, indo, no possível, com equilíbrio e bom senso, na satisfação do grande desejo que a todos nos abraça, de servir sempre mais e melhor o bem comum.
Seguindo, portanto, o esquema exposto e com os olhos postos nas realidades que vivemos, iria, agora, aflorar os aspectos que mais feriram a minha atenção nesta revisão constitucional, pronunciando-me, desta forma, sobre a sua oportunidade e vantagem.
Antes, porém, assinalaria que a proposta é apresentada com o confessado propósito de manter a estrutura política da Constituição de 1933, não só pelas válidas provas que já dou no decurso de quase meio século de vigência, como pela evidente razão de que ir além disso nem é necessário, nem parece conveniente e até excederia o objecto assinalável a uma simples revisão constitucional.
Assentemos, pois, nisto: pretende-se aperfeiçoar; não se quer alterar principio algum da lei fundamental da Nação.
Esta perspectiva é essencial, não só ao entendimento das alterações propostas, como ao sentido a atribuir à apreciação que delas se fizer.
Mantém-se, na íntegra, o pensamento da Constituição actual; modifica-se a formulação dos mesmos princípios, caracteriza-se com mais rigor certas posições; ajusta-se, aqui e além, o funcionamento das instituições, sem prejuízo do espírito que presidiu II sua criação e dos fins que continuam a visar. Se esquecermos esta verdade primária- arriscamo-nos a entreter um diálogo de surdos: uns a atacar na proposta o que nela não está; outros a defender o que na Constituição nunca esteve. Penso que nenhum de nós se deixará cair neste equívoco.
Poderão certas definições tomar na vida nacional um particular relevo por virem agora a participar, por forma expressa, na lei fundamental da Nação, mas se elas já são uma realidade da nossa vida colectiva, então parece-me que nada deve obstar em que fiquem clara e nitidamente no texto constitucional. Somos o que somos e queremos continuar a ser.
A Constituição também deve ter uma forte e funda missão de clarificar situações, esclarecendo bem processos adoptados e seguidos, definindo modos de viver e estar no Mundo.
Sr. Presidente: Retomo, agora, o fio das minhas considerações iniciais, tratando, em momentos separados, aqueles pontos que ao meu espírito se apresentam como os mais importantes e de maior relevo.
Debrucemo-nos, em primeiro lugar, sobre alguns aspectos que dizem respeito à Assembleia Nacional.
Sobre esse aspecto acentua-se inegavelmente o prestígio e a autoridade desta Assembleia.
Assim, e antes de mais, propõe-se o aumento do número de Deputados de 130 para 150; depois o estabelecimento de um novo regime para o funcionamento efectivo da sessão legislativa, a qual se iniciaria mais cedo (15 de Novembro).
Isto por um lado. Por outro lado, preconiza-se o aumento da competência da Assembleia Nacional, designadamente pela atribuição de novos poderes e, sobretudo, pelo aumento das matérias da sua competência exclusiva.
Quanto aos dois primeiros pontos referidos, parece não haver motivo para uma larga justificação das razões do meu aplauso.
Todos sentimos a necessidade de se aumentar o número de Deputados de forma que a representação, nesta Assembleia, das nossas províncias ultramarinas seja mais justa e corresponda melhor ao que elas representam na vida nacional; acresce que o desenvolvimento económico e social de certos distritos do continente demandam que o número dos seus Deputados seja equiparado ao de outras regiões.
É significativo o caso do distrito de Setúbal, que mantém o número inicial que lhe foi atribuído de Deputados (4), quando a- sua população, o seu desenvolvimento económico e social o coloca hoje sem favor entre os primeiros do conjunto nacional.
Da mesma sorte, é evidente a vantagem de se fixar o início mais cedo da sessão legislativa, visto que todos o conhecem quanto é difícil estudar, discutir e votar a «lei de maios» no apertado prazo de quinze dias.
Nas matérias que constituem a competência exclusiva da Assembleia Nacional, propõe-se um aumento considerável. Assim, além daquelas que já constam do artigo 93.º da Constituição e se mantêm, mais as seguintes: definição do regime jurídico da nacionalidade portuguesa, do estatuto dos juizes, da definição do regime jurídico da nacionalidade portuguesa, do estatuto dos juízes, da definição das pernas criminais e das medidas de segurança, das regras sobre a expropriação, da requisição por utilidade pública, dos impostos e de regime geral de governo das províncias ultramarinas e ainda mais algumas pontos de menor importância.