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18 DE JUNHO DE 1971 2071

discordem do teor das alterações, penso não ser legítimo argumentar contra elas dizendo que ultrapassam o âmbito de uma revisão constitucional.

As modificações mais extensas- e mais profundas referem-se, como é sabido e logo acentuou também o Sr. Presidente do Conselho, aos preceitos (relativos ao ultramar. Esta circunstância e a representação que aqui me trouxe dispensam outras justificações para que saliente este aspecto e aprecie a proposta sob essa perspectiva.

Talvez simplificadamente se possa dizer que o futuro do nosso país está condicionado à solução que conseguirmos dar a três grandes problemas, que constituem outros tantos desafios à nossa coragem e à nossa capacidade. Todos eles são simultâneos e mutuamente se Condicionam, e todos serão decisivos para o futuro da Nação Portuguesa.

O primeiro será a tarefa, já de si hercúlea para um país que ainda é pobre, de promover aceleradamente o seu próprio desenvolvimento. A nossa tarefa é, porém, mais dura ainda por estarmos envolvidos numa guerra que mobiliza homens e recursos, tornando mais difícil e mais áspero o caminho a percorrer para proporcionar às populações os desejáveis níveis de prosperidade e de bem-estar - tão estreitamente ligados à paz interna, ao progresso nos domínios do espírito e à convivência "dos homens em sociedades mais livres- e para lograr que a Nação disponha a tempo do potencial que lhe permita impulsionar e desenvolver todos os seus territórios.

O segundo grande problema é o do convívio com um inundo em activa fase de ajustamento, em que a ciência e a técnica exercem um império crescente e inexorável, tornando cada vez mais poderosas as forças reunificadoras que promovem a aglutinação dos homens em espaços económicos, culturais e políticos de novas e acrescidas dimensões.

Será ainda utópico, é certo, pensar-se num mundo em que as actuais nações se reduzem a ser como que simples distritos de um estado mundial, em que a tecnologia, com o seu poderio e as suas férreas leis, consiga massificar totalmente a espécie humana, levando de vencida as diferenciações que a geografia e milénios de vida estabeleceram entre os homens, desenraizando velhos costumes, unificando as línguas e nivelando os interesses. As nações não se formaram por simples caprichos; correspondem a fundas realidades humanas, e estas, enquanto existirem, prevalecerão sempre sobre os sonhos, mesmo os mais generosos.

Não há "dúvida, porém, de que nos dias de hoje essas realidades buscam novas formas de equilíbrio entre as forças que unem e que separam a Humanidade: e uma das coisas que parece bem manifesta é que as forças divisórias dos velhos nacionalismos tendem a afrouxar, pois os homens sentem que têm de encontrar formas mais amplas e mais abertas para conviver.

O terceiro grande problema - e é para nós o mais aliciante - .consiste na criação da nossa própria dimensão interna, ou seja no estreitamento e fortalecimento dos laços económicos e humanos entre as diversas parcelas do espaço português, de modo que constituam uma unidade não só no domínio dos sentimentos ou dos ideais, mas igualmente no dos interesses, forjando um corpo suficientemente robusto e solidário, com uma alma comum, que possa viver coeso e que possa também conviver neste novo mundo em formação.

Ora, pensemos um pouco com a ajuda de alguns números.

No ano 2000, que já não dista de nós mais do que o tempo necessário para que os adolescentes de hoje notem que já possuem alguns cabelos brancos, tomando como base estudos realizados pelas Nações Unidas para obter uma estimativa da população mundial no fim do século, o espaço português deverá comportar cerca de 50 milhões de habitantes, assim repartidos:

Milhões

Metrópole e ilhas adjacentes ........ 12
Angola .................. 15
Moçambique ............... 20
Restantes províncias ............ 2,5

Portanto, com estas ou com taxas de crescimento mais modestas, que levassem Angola e Moçambique apenas à ordem dos 10 a 12 milhões, poder-se-á, porém, desde já concluir:

No ano 2000 a metrópole não terá mais do que um quarto da população do espaço português, estando, por conseguinte, em África o centro de gravidade da Nação;

Mesmo com as mais elevadas das curas mencionadas, Angola e Moçambique serão ainda, ao findar este século, territórios tentadoramente vazios, cuja riqueza, cujo espaço, cuja posição estratégica, constituirão certamente motivo de forte cobiça para as grandes potências. Daqui se conclui também quanto tem de insensato pensar-se que mesmo qualquer das maiores ou mais populosas parcelas do todo nacional possa, efectivamente, a curto prazo, constituir, por si só, uma unidade autónoma no plano político, possa, pelo caminho da desagregação, ser mais feliz, por através dele se tornar mais próspera e mais senhora dos seus destinos.

Parece, assim, bem evidente quanto se requer de prudência e de lucidez para criar estruturas ao mesmo tempo sólidas e ágeis, adaptáveis a uma nação como esta, com populações e territórios tão dispersos e com problemas tão diferenciados.

Penso poderem resumir-se nos seguintes pontos os princípios fundamentais que todos - ou quase todos - reconhecemos deverem nortear a política em relação ao ultramar:

Unidade nacional, que pressupõe a soberania una e indivisível do Estado e o direito de todos os portugueses servirem e trabalharem em qualquer fracção do território;

Respeito dos condicionalismos locais, que levou, como leva ainda, à especialização nas leis e à diversidade ,nos usos e costumes;

Intervenção, com iguais direitos e a igual título, de todos os portugueses na vida política do País;

Participação crescente dos próprios habitantes nos respectivos órgãos de Governo.

Compreende-se, assim, facilmente que em problema tão complexo cada um de nós, se o estudasse por si só, pudesse chegar- a soluções diversas, quer pelo acento >a pôr em cada um destes princípios essenciais, quer pelo modo de os combinar, quer até simplesmente pelo arranjo e pela redacção das disposições.

Quando me coube fazer desta tribuna a evocação da figura e da obra de Salazar, pressentindo já que as paixões iriam possivelmente tentar sobrepor-se à razão e à serenidade ao longo deste debate público que já se avizinhava, pareceu-me oportuno reproduzir algumas palavras suas, tão criteriosas e tão prudentes, que creio merecem repetirem-se:

"A unidade da Nação na pluralidade dos seus territórios" implica a unidade de direcção política com a colaboração de todos, mas não tem nada a ver com