O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2072 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 108

certos problemas que apenas respeitam à organização administrativa e a maior ou menor descentralização e autonomia, problema acerca do qual "via muitas pessoas manifestarem-se altamente interessadas".

Para ele - dizia ainda - não se tratava de problema de princípio, mas sobretudo de possibilidades.

Apreciemos, pois, sucintamente a proposta do Governo em face dos pontos atrás enunciados. Não oferece dúvidas a preocupação de pôr especial acento em dois deles: a unidade nacional e a maior e mais ampla participação dos habitantes no governo dos respectivos territórios. O primeiro aspecto é repetidamente afirmado ao longo do texto e creio ser ponto indiscutível para todos nós. Quanto às mais largas competências conferidas aos órgãos locais e à maior intervenção das populações na sua composição para participar miais activamente na ponderação e resolução dos seus próprios problemas, julgo ser também evidente que a proposta segue um caminho que, na sua essência, presentemente não creio pudesse ser outro. Esta participação tem o mérito de conjugar ideias e vontades e tem também a vantagem de melhor fazer compreender aos povos os sacrifícios e dificuldades que lhes caiba suportar ou haja que vencer.

A proposta não traz grandes alterações de substância quanto à intervenção das populações ultramarinas na vida política do País: eleva apenas o número dos Deputados. Será, pois, de esperar que a sua repartição pelos círculos ultramarinos lhe dê adequada representação nesta Assembleia e, ao fazê-lo, sem esquecer evidentemente a fundamental importância e projecção de Angola e de Moçambique, não esqueça também as pequenas províncias. Algumas delas são hoje toda a presença física da Nação em continentes inteiros e .através de algumas delas se integram no corpo desta nação multirracial raças que são mundos.

Acerca do respeito devido às realidades locais - o multirracialismo nas leis e na vida - apenas direi breves palavras, pois penso ter ocasião de fazê-lo mais amplamente no exame na especialidade. Creio que a Constituição deverá dar abertamente guarida às nossas tão velhas e tão sãs tradições de respeito pelos valores culturais das populações, pelos seus usos, costumes, práticas e religiões, numa linha política que o Sr. Presidente do Conselho, aliás, acentuou igualmente no seu discurso de apresentação da proposta.

Não se trata de condescender paternalmente: trata-se de uma posição bem diversa, que é a de respeitar os diferentes estilos de vida e as diferentes escalas de valores humanos, com os seus diferentes modos de usar as coisas, de trabalhar e de se exprimir, de formar costumes e de criar as suas instituições peculiares, de praticar a religião e de à sua maneira cultivar as artes e criar beleza.

Concluo aqui a apreciação da proposta. Apenas me falta acrescentar uma palavra mais.

Disse há muitos anos o Prof. Marcelo Caetano, dirigindo-se a altos responsáveis ultramarinos, que "quantas vezes a coragem de se expor às balas que tem de ceder à coragem de conquistar aquela fria serenidade que permite dignamente não agravar perigos colectivos nem comprometer possibilidades futuras da Nação".

Ao meditar nestas palavras e nestes problemas, não me foi difícil reconhecer quanto tem de oportuno este pensamento e quanto é ajustado este apelo, e não me foi difícil reconhecer também - sem com isso tirar o devido valor aos textos, especialmente aos textos constitucionais- que nestas matérias transcendentes, que tocam o cerne da vida dos povos e que vão, por isso, bem para

além da letra das leis, o que mais importa é que a Nação, verdadeiramente, queira seguir unida e firme o seu caminho. E neste ponto essencial creio não poder haver lugar a dúvidas.

Afirma-o e reitera-o o Chefe do Governo com a força e prestígio da sua autoridade; proclama-o também o Chefe do Estado, figura respeitabilíssima do mais alto símbolo vivo da unidade da soberania da Nação; manifesta-o exuberantemente todo um povo que, apesar das suas dificuldades, se recusa a deixar-se contagiar pela subversão ou pelo derrotismo - e atesta-o, acima de tudo, quando tenaz e heroicamente vem empenhando o melhor da sua juventude numa luta que, se não fosse nacional, há muito já não poderia persistir.

Assim pensa e assim sente a Nação.

E nós, nesta Assembleia, não desmereceremos dela se, ao longo deste debate, houvermos contribuído para que seja mais forte e mais esclarecida a fé no seu futuro e mais sólida a união entre todos os portugueses à volta dos supremos responsáveis pelos seus destinos.

Este o meu propósito, que haverá sido provavelmente o único mérito deste meu modestíssimo contributo.

Vozes: - Muito bem

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Mota Amaral: -Sr. Presidente: Prevê expressamente a Constituição que nos rege a (possibilidade de ser revista, em período normal, de dez em dez anos, antecipável de cinco anos mediante certas condições.

Sabiamente procedeu neste ponto o nosso legislador constitucional. Com efeito, se ao estatuto político fundamental da Nação importa garantir a indispensável permanência de que decorre segurança para a vida colectiva, também .não se lhe hão-de negar as vias adequadas à necessária adaptação a circunstancias inovas, determinante de maior justiça e bem-estar.

Aliás, quase todas as (constituições modernas estatuem sabre os termos e o processo da sua revisão. Passado o entusiasmo jusracionalista dos constituintes da Revolução Francesa, que pretenderam deduzir da razão natural as formas políticas perfeitas, universais e imutáveis, generalizou-se a convicção ida "historicidade das soluções constitucionais. E que também elas estão submetidas à dialéctica da permanência e da adaptação, que se encontra no cerne do fenómeno político e reflecte afinal a própria situação do homem, ser num mundo em permanente devir.

Pelo expediente das revisões periódicas assegura-se a sobrevivência dos textos constitucionais, sucessivamente emendados, e a do peculiar estilo ide ordenamento político e social que lhe está subjacente, também correspondentemente corrigido. Mas isto desde que tais revisões satisfaçam, Ide forma inequívoca, as reais necessidades que em calda ocasião se manifestam. O acumular de tensões desagregadas são fruto da intransigente permanência de uma dada situação política e que a repressão, longe de destruir, exacerba, conduz, cedo ou tarde, à superação das suas deficiências, se não mesmo dela própria, por via revolucionária. A história, nossa e alheia, recolhe diversos exemplos, até de sinal (político contrário, que permitiriam ilustrar esta observação.

Vem tudo isto, Sr. Presidente, para sublinhar a transcendência da (tarefa que neste momento incumbe à Assembleia Nacional. Está a Constituição Política de 1933 em processo de revisão. Pesa, (portanto, sobre os membros desta Câmara a grave responsabilidade de decidir quais as (modificações a fazer, os (preceitos a revogar, as novas disposições a introduzir neste diploma de importância primacial.