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18 DE JUNHO DE 1971 2077

E quanto ao ultramar, Sr. Presidente, não haverá também opções a tomar, neste momento em que se aborda frontalmente o problema da revisão da nossa lei constitucional? Respondo com outra pergunta: se na metrópole a alteração dos condicionalismos sócio-políticos impõem correcções de vulto na Constituição vigente, como pôr sequer em dúvida esta necessidade relativamente ao ultramar, em especial Angola e Moçambique, onde na última década se tem assistido a um progresso, que voz especialmente autorizada já qualificou de frenético?

Falta-me conhecimento directo para longamente poder falar sobre o ultramar. Entendo, porém, que a lógica da participação, que já afirmei dever ser a principal ideia-força da revisão constitucional em curso, exige para os territórios ultramarinos crescente autonomia que vá a par do seu progressivo desenvolvimento. Os problemas da África portuguesa são, antes de mais, dos portugueses que lá se encontram, fazendo brotar riqueza daquelas terras, alguns há já muitas gerações: é preciso garantir-lhes, no quadro jurídico-constitucional, a autonomia, não só administrativa, mas também política, de legislação e de governo, que lhes permita proceder rectamente de acordo com as suas necessidades e aspirações.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - De resto, já hoje a Constituição, ao dispor que a autonomia das províncias será a compatível com "o seu estado de desenvolvimento e os recursos próprios", reconhece implicitamente o princípio da expansão dessa autonomia segundo vá exigindo o crescimento económico e social dos territórios.

A política que o Sr. Prof. Doutor Marcelo Caetano propôs ao País é a este respeito inequívoca. Recordo palavras por ele proferidas, falando pela rádio e pela televisão, em 17 de Junho de 1969:

Anunciei nos discursos que fiz em África os pontos fundamentais da nossa política: consolidação das sociedades multirraciais que cultivamos e das quais está ausente toda e qualquer discriminação de cor, raça ou religião; autonomia progressiva do governo das províncias, de acordo, segundo a Constituição, com o respectivo estado de desenvolvimento e os seus recursos próprios; participação crescente das populações nas estruturas políticas e administrativas; fomento dos territórios com ampla abertura à iniciativa, à técnica, ao capital de todos os poises, sob a única condição de se proporem valorizar a terra e a gente, e não explorá-las.

Sobre este programa se pronunciou a Nação, na metrópole e no ultramar, por ocasião das eleições de Outubro de 1969. Que dúvidas podem agora surgir? Que haveremos de aguardar para lhe dar realização?

Sr. Presidente: Expus ao longo das considerações que antecederam, que só lamento não ter conseguido tornar mais claras e breves, o meu modo de ver sobre a conveniência e a oportunidade da revisão constitucional, as suas grandes linhas orientadoras, as matérias de primacial interesse político que deverá alcançar.

Estas opiniões estão plasmadas, antes de mais, no projecto de lei n.º 6/X, de cuja autoria me honro, em colaboração com o meu ilustre colega Sr. Deputado Sá Carneiro, e que subscrevi juntamente com vários outros Srs. Deputados. Mas a mesma ordem de preocupações, com uma ou outra divergência mais saliente, não é alheia à proposta de lei n.º 14/X, onde, por forma tão lúcida e corajosa, se aborda a questão ultramarina em termos que merecem a minha total adesão. E também consigno a sua existência

em pontos do projecto de lei n.º 7/X, apresentado pelo Sr. Deputado Duarte do Amaral e outros Srs. Deputados. Tanto me basta para dar à proposta e a ambos os projectos de lei em discussão a minha aprovação na generalidade.

Vozes: - Muito bem l

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Ricardo Horta: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Segundo as normas reguladoras do trabalho da Assembleia, a discussão na generalidade da proposta do Governo sobre a revisão constitucional deve incidir sobre a oportunidade do texto submetido à nossa apreciação, a sua conveniência e a estrutura fundamental dos seus princípios.

São estes os temas sobre que recairá a minha análise sumária e breve, pois não desejo ultrapassar o plano em que devo confinar-me, nem transcender os limites que entendo dever impor às minhas considerações.

Os aspectos que enunciei foram largamente versados na comissão eventual a que tive a honra de pertencer e a cujo trabalho exaustivo, valioso e útil devo render o testemunho da minha homenagem.

Quanto à oportunidade da proposta de lei, suponho que ela se apresenta com evidência insusceptível de contestação.

A última revisão constitucional teve lugar em 1950; isto significa que, depois dela, decorreu um longo período, em que. as instituições sofreram a erosão do tempo, deixando de corresponder às novas necessidades e exigindo, por consequência, um esforço de actualização e de aperfeiçoamento.

Ninguém pensa em alterar a essência profunda da Constituição de 1933, cujos grandes princípios permanecem válidos e que importa preservar na linha da continuidade que inspira a acção do Governo, e que radica profundamente na consciência nacional.

O próprio relatório da proposta o afirma, ao delimitar o âmbito da iniciativa governamental e ao salientar o objectivo a atingir, que não é o de uma mutação radical, mas sómente o de renovar estruturas esclerosadas, rejuvenescer princípios envelhecidos, atender à evolução dos tempos e satisfazer exigências que naturalmente foram surgindo.

Não se trata, pois, de uma reforma no sentido revolucionário da palavra, mas sim de uma revisão na sua acepção restrita, isto é, limitada na sua incidência e no plano confinado onde se exerce. A revisão, aliás, decorre da própria Constituição, é imposta pelos seus preceitos e corresponde ao imperativo do exame periódico dos seus princípios, com o objectivo de os manter ou modificar, em consonância com as rápidas mutações da vida moderna, e a que se não eximem a contextura do Estado e as normas fundamentais que presidem à sua vida.

Creio não ser necessário reforçar as considerações precedentes para demonstrar de modo nítido e inequívoco a oportunidade da proposta de lei, aliás apresentada à Assembleia numa conjuntura grave da vida nacional, em que importa salvaguardar o que é irrenunciável, mas também caminhar sem hesitações no trilho das renovações necessárias e das melhorias estruturais e formais, que as circunstâncias reclamam como exigência imperiosa.

Cabe-me tratar agora dos dois outros aspectos do debate parlamentar: o da conveniência da proposta e o da sua economia, encarados em termos gerais. Não ocultarei as dúvidas que se me ofereceram, as preocupações que me dominaram, as incertezas que tive de vencer.