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2082 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 108

tituição preceitua não se projecta nem na administração geral, nem nos órgãos de soberania.

Fazendo o ponto: com excepção do consignado, desde a Lei n.º 2100, de 29 de Agosto de 1959, no artigo 72.º, nada se encontra na Constituição que exija como necessário ou sugira como conveniente que os elementos estruturais da Nação devam intervir na eleição do Presidente da República.

O parecer de 1959 da Câmara Corporativa socorre-se também do direito constitucional comparado para apoiar a solução então proposta pelo Governo para a eleição presidencial.

Após caracterizar cada um dos quatro tipos de sistemas de eleição do Chefe do Estado nos regimes republicanos, o parecer procura relacioná-los com as diferentes posições que a um Presidente da República podem ser atribuídas na organização estadual.

Do texto do parecer não é fácil aplicar tal análise correlativa ao caso português, na medida em que não se define claramente o pensamento da Câmara no que concerne à posição que, objectivamente, ocupa o Chefe do Estado no nosso estatuto político fundamental: se por um lado se diz que "o Chefe do Estado há-de ser [...], além de um chefe da Nação, uma entidade indiscutida e indiscutível, grandeza neutral, moderadora e partidária- aquela espécie de pouvoir neutre de que [...] falava Benjamin Constant", por outro lado invoca-se a declaração do Prof. Oliveira S ai az ar de que se quis atribuir ao Chefe do Estado "todos os poderes e garantias necessários para se poder afirmar que é ele quem traça com toda a independência, à vida do Estado, as grandes directrizes".

Seja, porém, qual for o pensamento da Câmara Corporativa neste domínio, a verdade é que reconhece que a autoridade do Chefe do Estado tem de assentar na vontade da Nação. Apenas pensa -ao contrário do que pensava em 1951- que o sufrágio universal e directo não é forma válida dessa vontade se exprimir e proclama -já dissemos com que fundamento- que o colégio proposto pelo Governo elege "em termos de maior autenticidade". Assim, o Chefe do Estado, em vez de diminuído, sairia engrandecido desse sistema de eleição.

Por ter já exposto à Assembleia o meu entendimento sobre a posição do Chefe do Estado o conceito de Nação e de República corporativa consignados na nossa lei fundamental , dispenso-me ide os repetir para rebater esta posição da Câmara Corporativa. Apenas noto que, em reforço do seu ponto de vista de, por esse mundo í ora, "estar hoje muito longe de se admitir sem discrepância que o sufrágio universal e directo seja o único processo de apurar a vontade real da Nação" e de se reclamar "um sufrágio dualista, um sufrágio universal e um sufrágio social", o parecer invoca a Constituição Francesa de 1958, segundo a qual o Chefe do Estado é escolhido "por um colégio eleitoral constituído pelos membros do Parlamento (Assembleia Nacional e Senado), pelos membros dos conselhos gerais (isto é, dos órgãos deliberativos dos departamentos) e pelos membros das assembleias dos territórios ultramarinos, bem como por representantes eleitos dos conselhos municipais (órgãos deliberativos das comunas)" e ainda por "representantes eleitos dos conselhos das colectividades administrativas dos territórios ultramarinos [...] e representantes dos Estados membros da comunidade". Por que se valoriza o caso da França? "Interessa-nos particularmente o caso francês, mais que o alemão e italiano, dado que nas actuais leis fundamentais de Bona e Roma não há, como na francesa, sinais manifestos de desafeição pelo parlamentarismo, os quais, pelo contrário, são patentes na Constituição Francesa de 1958". E apresenta-se o paralelo: a proposta do Governo utiliza "para o efeito exactamente o sistema que em França, salvas todas as diferenças, foi considerado especialmente apto para a escolha de um Chefe do Estado de poderes reforçados, de poderes impressionantes".

Ora nem o paralelo pode estabelecer-se - pois não existe -, nem a achega é pertinente, por contra-demonstrativa. De facto, não pode aparentar-se o restritíssimo colégio eleitoral português com o amplíssimo colégio eleitoral francês: menos de 500 ver sus cerca de 80 000 membros. E não pode invocar-se - a favor de uma solução que elimina o sufrágio universal e o substitui por um sufrágio limitadíssimo - o exemplo de um país que eliminou um sufrágio limitadíssimo por, praticamente, um sufrágio universal indirecto. Trata-se, pois, de movimentos sufragistas de sentidos opostos: redutor, cá, ampliador, lá. Em Portugal, entendeu-se que a autoridade do Chefe do Estado ficaria mais legitimada contraindo drasticamente o número de eleitores. Na França de De Gaulle, também desiludida do parlamentarismo e desejosa de um Estado forte personalizado no Presidente da República, alargou-se consideravelmente o colégio eleitoral. E após referendo popular de 26 de Outubro de 1962, o Chefe do Estado passou a ser eleito por sufrágio universal directo: mas, claro, isto não podia a Câmara Corporativa adivinhar em 1959, nem seria de esperar invocasse em 1971 ...

Portanto, contrariamente ao que declarou, em tal data, a nossa Câmara consultiva, o direito Constitucional comparado confirma o que a mesma Câmara havia defendido em 1951: "Apesar de todos os seus defeitos, o sufrágio universal é ainda, nos regimes republicanos, a melhor forma que até hoje se descobriu de assegurar a intervenção popular na determinação do rumo do Estado."

A Câmara Corporativa, para quem o Presidente da República parece ser essencialmente "uma entidade indiscutível e indiscutida, grandeza neutral, moderadora e apartidária", "o homem da confiança do povo" e símbolo da unidade nacional, considera que "a eleição presidencial não pode servir de ocasião para um debate de concepções- sobre a vida política, para um veemente embate ideológico de facções" e que "o sistema da eleição do Presidente da República directamente pela Nação não fora concebido pela Constituição como destinado a dar ensejo [...] a que se submetesse à deliberação da Nação o mérito relativo de dois ou mais programas políticos globais: foi concebido, antes, para que, o mais possível sem debate, dada a dignidade da função presidencial, que dele poderia naturalmente sair afectada, se plebiscitasse o homem, que continuasse a dar efectivação ao programa fixado na própria Constituição". A eleição presidencial não deveria, pois, resultar de uma campanha eleitoral com debate, mas sim consistir na consagração apoteótica de um homem, "aclamado una você, ungido pela Nação". Ao ler estas passagens, logo me acudiu à mente, com intensidade e luminosidade da evidência, a única conclusão possível: o Chefe do Estado não deveria ser o Presidente da República, mas o Rei?

O Sr. Casal Ribeiro: - Apoiado!

O Orador: - É certo que o Presidente da República, como Chefe do Estado, personifica a Nação soberana, é expressão e garantia da unidade nacional e da sua independência. Como tal, está acima das ideologias e das opiniões sectoriais. Mas ele também concentra os poderes executivo e legislativo, já que o Governo é da sua exclusiva- confiança (artigo 112.º) e nomeia e exonera livremente o Presidente do Conselho (artigo 107.º, § 1.º), que perante ele responde pela política geral do Governo (ar-