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30 DE JUNHO DE 1971 2299

O Sr. Júlio Evangelista: - V. Ex.ª poderia substituir a palavra «oportunismo» por «oportunidade»?

O Orador: - Não fui só eu que a empreguei. Foi, salvo erro duas vezes, o Sr. Deputado Ávila de Azevedo.

O Sr. Júlio Evangelista: - Então V. Ex.ª ponha a palavra entre aspas, se faz favor.

O Orador: - Não, Sr. Deputado. Eu aceito pedidos de interrupção; não aceito colaboração na autoria: é só minha!

O Sr. Júlio Evangelista: - Não. Segundo V. Ex.ª, é do Sr. Deputado Ávila de Azevedo.

O Orador: - Este ponto transita já em julgado.

O Sr. Júlio Evangelista: - Está transitado!

Risos.

O Orador: - Veremos os resultados que isso dá na especialidade.
Mas há que assinalar desde já que não concebemos jamais o sufrágio directo como forma de secessões, que repudiamos. Nem admitimos que a nós, e a quem a favor dele se manifestou, se impute essa concepção do sufrágio directo.
Pelo contrário, pretendendo que o Chefe do Estado seja eleito pela Nação, queremos ver reforçada a imagem da unidade nacional que ele garante.
Não queremos que se possa sequer supor que a escolha do Chefe do Estado resultou apenas do entendimento de um pequeno colégio; desejamos que ele seja a expressão viva do voto da Nação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não deixou de aludir-se a golpe de Estado constitucional, velha expressão que não pode deixar-se sem reparo.
O uso dos meios constitucionais para obter a substituição dos membros dos órgãos de soberania e alteração da política por eles prosseguida não pode ser qualificado como golpe de Estado.
Os meios constitucionais são legítimos e lícitos para procurar essas mudanças; visá-las não é golpe de Estado.
E se os meios se não contêm dentro das normas da Constituição, o tal golpe não será constitucional.
A expressão referida equivale a pôr os meios constitucionais ao serviço de uma personalidade, de um governo, de uma política, identificando-os com a ordem constitucional, o que é inaceitável.
Mais do que um contra-senso, a expressão em causa implica menosprezo pela Constituição e pela Nação que ele rege. Pode ser expressiva como imagem oratória; mas é inaceitável como categoria jurídico-política.
Ainda quanto ao modo de eleição do Presidente da República, esgrimiu-se com a estrutura corporativa.
Partindo da concepção orgânica, alegou-se que, não a tendo posto em causa, haveríamos de aceitar-lhe as consequências quanto ao sufrágio; seríamos, pois, incoerentes.
As premissas são inexactas; e o virtuosismo conceptual do raciocínio não resgata o erro da conclusão.
Ficou patente, para quem quis ouvir, ler e entender, que consideramos inexistente o corporativismo político a nível nacional, ou seja, que, quanto aos órgãos de soberania, não consideramos a Nação corporativamente organizada.
Ficou claro que impugnamos mesmo a aptidão do corporativismo para uma organização política nacional, confinando como está na Constituição aos domínios do económico, do social e do político local.
Foi evidente que não reputamos sequer corporativo ou orgânico o actual modo de eleição do Chefe do Estado.
São opiniões contestáveis, como todas; mas não podem ser ignoradas para verbalizar conclusões de suposta incoerência.
A este respeito, a imagem tomista evocada em defesa da concepção orgânica é altamente elucidativa; merece reflexão.
É certo que S. Tomás, designadamente a propósito do hilemorfismo aristotélico, dá a imagem da casa e das pedras, desenvolvendo as ideias de forma acidental e forma substancial com referência à relação da alma e do corpo.
Ouvimos essa imagem ser aplicada à Nação e à comunidade política.
O tomismo está só na imagem; o personalismo tomista exclui necessariamente a sua aplicação às relações da pessoa com a comunidade: pessoa não é pedra a que a organização corporativa dê forma.

O Sr. Pinto Machado: - Muito bem!

O Orador: - Logo foi notado que tal aplicação conduz ao transpersonalismo, que não é mais do que um aspecto filosófico do totalitarismo.

O Sr. Miller Guerra: - Muito bem!

O Orador: - Assim o confirma a origem da aplicação política da imagem tomista.
Foi para ilustrar a doutrina de Mussolini que se fez essa transposição, para concretizar o seu conceito fascista de organização política: já não há as pedras que eram os indivíduos, mas só edifícios e cidades; o todo absorveu as pessoas através dos elementos estruturais.
Essa concepção do corporativismo rejeitamo-la em absoluto.
Nessa rejeição estamos com a Constituição e a ordem sócia; vigentes, estruturada esta «na base do respeito da personalidade humana, da propriedade individual que a completa e da liberdade de iniciativa que expande».
O edifício da imagem que se transpôs para o campo político é inevitavelmente totalitário.
Para empregar as palavras de um dos oradores que agora me antecedeu, essa «transposição contende com a realização do homem no que ele tem de mais essencial».
Em política, o que parece, é.
É indiferente que pintem o edifício de vermelho ou de rosa, que lhe dêem o colorido das camisas simbólicas outrora vestidas, ou o branco dos sepultemos calados.
Essas construções rejeitamo-las sempre, qualquer que seja. a sua cor; e lutamos para estabelecer uma origem constitucional que cus tome impossíveis, que dedais mos defenda.
Comecei por evocar uma revisão passada.; volto à lição que nos dá.
A maior parte dais alterações então recusadas são hoje acolhidas pelo Governo e serão, por certo, aprovadas., treze anos volvidos; não deixam de ser hoje necessárias, mas já não são suficientes.
Oxalá isso se não repita.
Não defende-mos precipitações, nem exageros, nem ingenuidades, nem utopias, nem «gauchismos»; mas também não queremos avançar de costas voltadas ao futuro e olhos fitos no passado.