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4628 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 228

da proposta, tendo até o cuidado de chamar a intervir nos seus trabalhos um representante do Ministro proponente.
Foi, portanto, um trabalho levado a efeito, não só pelos juristas, como pelos que não são juristas na comissão, mas também com a assistência de um técnico especializado.
Procurou, por isso, tanto quanto possível, responder às dúvidas de uns e de outros.
Referiu-se o Sr. Deputado ao facto de a lei civil nos dar um conceito de reserva da intimidade privada. Cabe referir que o bem jurídico que a lei civil protege é, naturalmente, de conteúdo muito mais lato do que o daqueles bens jurídicos que exigem tutela penal.
O Sr. Deputado Teixeira Canedo defendeu que a intenção deve ser afastada da descrição típica do crime. Mas acabou, depois, por concluir - e isso é de algum modo incoerente - que o juiz, em cada caso, vai verificar se um indivíduo teve ou não o propósito de devassar a intimidade da vida privada. Pelo menos, neste estádio do nosso direito, em que ainda não se concede aos tribunais a faculdade de, perante cada caso concreto, arbitrariamente dizer se há crime - pois para nós ainda vale o princípio de nullum crimen sine lege -, há que definir os elementos que integram cada crime para que o juiz realmente possa considerar, como tal, certos comportamentos. Já na moldura penal, quando o juiz tem de aplicar a pena, aí sim, deve dar-se-lhe, com a maior largueza, a possibilidade de avaliação, em cada caso concreto, da medida da pena que lhe corresponde.
Nessa medida não me parece que também seja lógica e coerente a argumentação do Sr. Deputado Teixeira Canedo. É que ele vem dizer que não há mal nenhum em que as penas tenham um limite maior - esta foi uma afirmação -, pois que o que interessa são os limites mínimos, e nos limites mínimos sempre o juiz encontrará a medida correspondente.
Mas a verdade é que a moldura total da pena entre o seu limite mínimo e máximo há-de determinar o juiz ao buscar a solução de equilíbrio. E tanto é assim que o Sr. Deputado Teixeira Canedo teve necessidade de acrescentar uma base III, em que veio estabelecer, para um caso concreto, um máximo inferior, retirando esse caso da base I, o que não seria necessário na lógica da sua teoria.
Portanto, ao justificar a base III invalida toda a argumentação que produziu em relação ao facto de os limites máximos não terem qualquer influência na determinação do quantum concreto de cada pena.
Quanto ao problema da publicidade, desculpe o Sr. Deputado Teixeira Canedo a franqueza, parece-me que também aí há incoerência da sua parte. A sua proposta prevê como factos puníveis que se "utilize, transmita ou 'divulgue'". Se a divulgação é punível, isso obsta a uma punição autónoma para a publicidade, pois toda a divulgação pressupõe publicidade. Parece-me que iríamos punir duas vezes o mesmo comportamento. A maior ou menor publicidade deverá funcionar apenas no momento da graduação da pena, dentro da moldura penal.

O Sr. Gonçalves de Proença: - Peço a palavra, Sr. Presidente, para requerer que se consulte a Câmara se se considera ou não esclarecida sobre o assunto e se se passa à votação.

O Sr. Presidente: - Antes de fazer essa consulta tenho de dar a palavra a dois Srs. Deputados que acabam de a pedir, que a pediram enquanto V. Exa. falava.

O Sr. Teixeira Canedo: - Sr. Presidente: Eu suponho que o assunto ainda não está suficientemente esclarecido e fiquei até um pouco perturbado com um pedido destes. Voltamos ao assunto. O Código Penal, no seu artigo 1.°, diz que "crime ou delito é o facto voluntário, declarado punido pela lei penal".
E, se VV. Exas. tiverem o cuidado de consultar a anotação que o Sr. Dr. Maia Gonçalves, ajudante do procurador-geral da República, faz a este artigo 1.°, verão que a certa altura diz:

Para verificação do dolo são necessários por parte do agente a prática voluntária dos factos e o conhecimento do carácter ilícito ou reprovável da sua conduta, ou que tudo se passe como se ele tivesse tal conhecimento.

Ora, isto é a técnica geral do Código: desde que um indivíduo cometa os factos, pratique voluntariamente os factos e tenha conhecimento do carácter ilícito ou reprovável, comete o crime. Mas depois, no artigo 44.°, nós vemos as causas justificativas do facto e de extensão da culpa.
E diz o n.° 7:

Em geral os que tiverem procedido sem intenção criminosa e sem culpa.

Logo, um indivíduo que comete os factos que integram uma determinada moldura penal poderá demonstrar ao juiz que procedeu sem intenção criminosa e sem culpa. O juiz não o condenará. Ora, pela posição da comissão, o ofendido teria de provar que esse homem agiu com culpa, com intenção, e não é o réu que terá de provar que agiu sem culpa. Isto nesta matéria é importantíssimo, porque a ofensa à intimidade das pessoas é realmente muito grave. Daí, numa matéria em que a ofensa quase se pode dar pela simples presença de uma pessoa em determinado local, se é o ofendido que tem de fazer a prova, parece-me que, a votarmos uma lei nestes termos, mais vale não estarmos a discutir, porque efectivamente nunca o ofendido ou raramente o ofendido conseguirá provar que o arguido agiu com intenção criminosa. Portanto, quanto ao primeiro problema, parece-me que os receios da comissão não têm qualquer razão de ser. O indivíduo tem à sua mão processo de se defender. Demonstra perante o tribunal que, embora cometendo aqueles factos que objectivamente são lesivos da intimidade privada, agiu sem intenção nem culpa. Não vejo, pois, que nesse aspecto a comissão tenha qualquer razão. Mas dissemos já que o Código Civil nos dá, como lhes chama o Prof. Antunes Varela, duas bases objectivas. O Sr. Deputado João Manuel Alves disse-nos que o ilícito civil é muito mais lato. Não compreendemos que agora este Sr. Deputado entenda que não coincide o ilícito civil com o ilícito criminal. Não consigo perceber isto, porque só há crime quando há ofensa de um direito.
Onde está inscrito o direito ofendido, cuja ofensa nós queremos punir com. esta lei? Qual é a lei que dá às pessoas um determinado direito, cuja ofensa tenha de ser punida? A proposta da comis-