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14 DE MARÇO DE 1973 4741

cias, ser considerado benéfico, já o mesmo não se poderá dizer do seu abuso, que, insidiosa e progressivamente, conduz à habituação.
Mas, para além destes produtos empregados como estimulantes, outros há com o uso dos quais o homem procura atenuar dores físicas ou morais, esquecer a sua ansiedade e preocupações, ou que emprega por mera curiosidade, o que, para muitos, pode conduzir a uma dependência do produto ensaiado. Assim se modifica o comportamento do indivíduo perante a sociedade, atitude que se pode manifestar de diferentes modos, mas que representa sempre uma degradação.
Encarado sociologicamente, o problema é complexo, complexo em todas as suas facetas, e pergunto, muitas vezes, se o expô-lo cruamente no seio de sociedades em que a maioria dos seus elementos, por condições várias, se mostram mais receptivos, não terá efeito contrário ao desejado. É um dos problemas com que se debate o mundo de hoje, tão intimamente ligado a outros campos, como o do sexo e o da violência, que difícil se torna dissociá-los; todos concordam que são índices de degradação de sociedades, mas discorda-se profundamente nos métodos a adoptar para anular, ou pelo menos limitar, os seus efeitos perniciosos.
Não apresento o problema como motivo de polémica, até porque nem para mim tenho uma ideia definida, mas não posso evitar que baile em meu espírito o argumento de que nada de benéfico se tem verificado pela apresentação de filmes de violência, do género da Laranja Mecânica, ou pornográficos, como o Último Tango, ou pela multiplicação das lojas de sexo, com todo o cortejo de exibicionismo a elas ligado. Na base da minha dúvida está uma pergunta: ter-se-á verificado a evolução espiritual do homem, necessária para que a maioria dos elementos da sociedade esteja preparada para reagir da melhor maneira?
Não fiz esta fuga ao assunto da dependência das drogas com qualquer espírito de crítica ao completo trabalho que temos perante nós; afirmei que tinha dúvidas sobre determinado caminho, mas não as tenho quando se apresenta o problema sem especulações, com o intuito de alertar, e assim o vi na exposição apresentada pelo ilustre Deputado avisante. Ela é apresentada perante uma Assembleia responsável, com o intuito de informar. Tenho somente que congratular-me por ter sido apresentada e congratular aquele que resolveu apresentá-la?
Não quero, nem talvez me fosse possível, analisar os diferentes aspectos que aqui têm sido focados, mas gostaria de referir alguns nascidos de estudo e de observação:
O comércio ilícito de drogas é, por desgraça, um comércio muito rentável, e isso justifica a minha despenca em que, combatendo-o, se consiga um resultado positivo total. Se, por exemplo, limitarmos a nossa análise ao campo da produção do ópio e seus derivados, assim como ao da marijuana, esta das menos perigosas, mas grave o seu uso porque constitui como que um degrau para o emprego de outras as mais perigosas, teremos de focar as suas fontes de origem e, secundariamente, as correntes que formam para a introdução das drogas nos seus mais rentáveis mercados.
Deve ser materialmente impossível limitar as culturas, através do Mundo, ao que se considera como necessário para fins terapêuticos; certo que há exemplos louváveis, como o do Governo Turco, que procura, julga-se que com êxito, limitar a cultura da papoula - Papaver somniferum - à região central da Anatólia, proibindo as das regiões fronteiriças, a partir das quais mais facilmente se processaria a saída ilegal, indemnizando os cultivadores pelo prejuízo verificado, incrementando outras culturas e comprando, para o comércio lícito, toda a produção das culturas autorizadas; louvável também o esforço verificado no México na repressão da cultura do Cannabis sativa.
Mas que representa este esforço, se se sabe que as culturas se incrementam em outras zonas do Globo onde a possibilidade de semelhante actuação é, poderemos dizer, impossível?
No que se refere às correntes de entrada em diversos países, conhecem-se esforços nacionais e os que resultam de uma eficiente acção internacional desorganizando essas correntes, sobretudo pelo ataque aos laboratórios clandestinos de transformação do produto bruto; um exemplo frisante foi a destruição - será temporária? - da corrente do Sul da França, que da Turquia recebia a matéria-prima, manipulando-a e encaminhando-a para a costa oriental dos E. U. A. Mas também outras correntes nasceram e encaminham os produtos, profundamente adulterados, para os países onde mais facilmente encontram os mercados clandestinos.
E é esta clandestinidade do mercado que o torna assustador, não só porque facilmente expande o consumo da droga, mas também porque o indivíduo drogado, ou somente viciado, transforma-se com frequência em criminoso na sua ânsia incontível para a obtenção da droga.
Como exemplo direi que na República Federal Alemã as autoridades apreenderam, em 1963, 38 kg de marijuana, quantidade que subiu para 4300 kg em 1970. Os crimes em relação com o uso de drogas passaram, no mesmo período, de 820 para 4800, e, o que representa maior gravidade, dos 820 crimes em 1963 foram praticados por delinquentes juvenis 19, o que representa 2,5 por cento, ao passo que dos 4800 de 1970 o número dos praticados por idêntico grupo etário foi de 2110, cerca de 50 por cento. Isto significa qualquer coisa: algo a que é necessário pôr cobro.
Em Portugal europeu não me foi possível colher elementos que me permitam referir números, mas receio que estejamos atravessando um período de latência em que os casos que vêm à superfície são relativamente poucos, mas passado o qual se poderá temer um aparecimento explosivo.

O Sr. Cancella de Abreu: - Agravado nos três últimos anos.

O Orador: - Gostaria de me referir ainda a uma outra faceta do problema: o da sociedade perante o dependente da droga.
Torna-se necessário analisá-la, não esquecendo o que se relaciona com o tráfico da mercadoria. Começo