O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

13 DE FEVEREIRO DE 1985 1755

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a morte de José Gomes Ferreira o Pais perde não só um dos maiores escritores portugueses de todos os tempos mas uma grande figura de cidadão exemplar, de democrata, de lutador resistente antifascista, de lutador pela democracia no nosso país.
Os seus versos, que foram cantados durante o fascismo como a bandeira da luta da resistência dos democratas, continuarão a ser entoados por todos os democratas que nele vêem a mensagem que José Gomes Ferreira nos deixa, o seu apelo permanente à liberdade, à solidariedade que sempre manteve com o seu povo.

Por isso, o MDP/CDE se associa, comovidamente, ao voto de pesar à memória de José Gomes Ferreira.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos agora ao voto de pesar pelo falecimento do escritor Nuno Bragança.

O Sr. Secretário (Leonel Fadigas): - O voto de pesar é do seguinte teor:

Voto de pesar

Autor de uma obra marcada de profundo rigor e pessoalidade, Nuno Bragança afirmou-se como das vozes mais autênticas da literatura renovadora das últimas décadas.
Mercê de uma escrita imaginosa e fluente, plena de sugestão, ritmo, inesperados cambiantes, grangeou uma grande e generalizada admiração.
Antifascista por convicção e acção, companheiro de esperanças com múltiplas e diversificadas raízes, deixou-nos um raro testemunho de inteligência criadora. Dele se dirá que, tendo morado na angústia, ajudou a mudar a face dos dias baços em favor de uma humanizadora claridade.

A Assembleia da República, reunida em Plenário no dia 12 de Fevereiro, expressa o seu pesar sentido pela morte de Nuno Bragança, grande escritor do nosso tempo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar este voto de pesar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nuno Bragança foi um dos mais lúcidos e inovadores temperamentos de ficcionista revelados pelos últimos anos da literatura portuguesa. Quando, nos finais da década de 60, publicou A Noite e o Riso, seu primeiro livro, romance de uma consciência definindo-se e assumindo-se no meio de múltiplas inquietudes, os leitores saudaram toda a estratégia do rigor e beleza formal que o percurso posterior aprofundaria. Acolheram ainda, com significativo entusiasmo, o gosto pela coloquialidade, o convívio desinibido com mundos lisboetas de só aparente toque marginal, o virtuosismo de uma escrita marcada profundamente pela audácia e pela esperança.
De Directa a Estação, colectânea de contos vinda a lume há escassas semanas, passando por essa obra rica e problematizadora que é Square Tolstoi, Nuno Bragança prosseguiu o seu itinerário de indagação psicológica e solidariedade, mercê da mesma poesia narrativa, do mesmo discurso imaginoso e fluente.
Os sinais da resistência antifascista açodem-nos, de forma viva, ao longo dos seus textos: sejam os de um perseguido pela PIDE que, a salto, passa a fronteira para o exílio diligente ou os do trabalhador alentejano submetido à injustiça e à tortura. O fundo religioso que murmura na fundura ou na epiderme das palavras que escreveu não escamoteiam o senso de participação na vida, o militar das vicissitudes transformadoras. Pelo contrário: as malhas de uma e outra vertente integram-se sem conflitos insanáveis.
Por isso, como se diz do voto a que esta Câmara acaba de dar unanimidade, tendo morado na angústia, Nuno Bragança ajudou a mudar a face dos dias baços em favor de uma humanizadora claridade. Por isso, a sua morte, ocorrida em pleno labor e quando muito projectava num devir que não teve, abre um lugar impreenchível, como cidadão e grande escritor do nosso tempo. Cabe-nos, porém, continuá-lo no meio de nós e para além dos dias que vivemos. Só assim honraremos a sua memória digna e cumpriremos as exigências culturais que se nos impõem, como democratas e eleitos pelo povo.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião.

O Sr. Lemos Damião (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fim de semana trágico enlutou os homens das Letras do nosso país.
Faleceram Nuno Bragança, José Gomes Ferreira e José Gomes Bento.
Com o seu desaparecimento ficou o País mais pobre, muito mais pobre. E, sempre que tal acontece, salienta-o a Assembleia da República, num verdadeiro sentimento de unidade e coesão, exprimindo um só sentimento - a tristeza.
Tristeza que invade todos os corações, mesmo aqueles que em vida discordassem dos seus ideais, dos seus pontos de vista.
É que, Srs. Deputados, as horas de angústia conseguem fazer esquecer o que dividiu, e unir o que é essencial, o que é patriótico.
E todos eles, cada um à sua maneira, foram patriotas, defenderam os seus ideais, lutaram pelas suas convicções, deram de si o seu melhor, legaram a sua obra.
Morreram na realidade três grandes portugueses, ficam três notáveis exemplos, que a todo o momento podem ser revividos na expressão da sua arte, na sua escrita, na dádiva da sua cultura.
Quanto não seria de esperar de um Nuno de Bragança, se a morte o não tivesse ceifado tão prematuramente?
Quanto não poderiam ainda esperar os professores da acção do Dr. José Gomes Bento, na luta travada pela dignificação da função docente?
E, apesar dos seus 84 anos, quanto falta não faz José Gomes Ferreira, com os seus protestos contra a injustiça e o viver de um mundo desconcertado?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós, sociais-democratas, choramos estes três homens, estes três vultos com o mesmo sentimento.
Permita-se-nos, porém, recordar de uma maneira mais profunda José Gomes Ferreira. Pela sua obra literária, pela sua variedade, pelo seu conteúdo, bem merece este «poeta militante» um lugar de destaque.