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I SÉRIE - NÚMERO 79

Queremos recordar que o Prof. Mota Pinto se revelou como um adversário do regime fascista português chegando até a participar em sessões públicas de campanhas da CDE, lado a lado com outros democratas, de variadas tendências políticas.
Notabilizou-se como professor da Faculdade de Direito de Coimbra, não só pela forma aberta com que soube dialogar com os seus alunos, como é geral testemunho daqueles que frequentaram as suas aulas, como ainda por se ter revelado como um dos mais destacados civilistas contemporâneos.
E como se isto não bastasse, o Prof. Mota Pinto ocupou no Parlamento o lugar de deputado, já a partir da Assembleia Constituinte.
Por esta razões, o MDP/CDE quer aqui, no Parlamento a que o Prof. Mota Pinto pertenceu, prestar a devida homenagem à sua memória.

Aplausos do MDP/CDE, do PS, do PSD, do CDS, da UEDS, da ASDI, e do Sr. Deputado José Magalhães (PCP).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Moreira.

O Sr. Adriano Moreira (CDS): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É doloroso verificar que, com mais frequência do que as nossas esperanças desejariam, os novos dirigentes que surgiram neste período de redefinição do País, de busca de um novo equilíbrio interno e de uma nova funcionalidade internacional, desaparecem quando a maturidade alcançada na luta fazia esperar uma acção mais frutuosa, construtiva e consolidadora da vida portuguesa. Não posso deixar de recordar ao mesmo tempo Sá Carneiro, Amaro da Costa, e, agora, Mota Pinto, porque todos sendo jovens nos lembram o poeta que falou nas velas acesas que dão luz e vão morrendo. Seria um sinal amargo de ruptura do nosso tecido social que não fôssemos capazes de reconhecer todos, num órgão de soberania, quando um combatente tomba, a autenticidade com que se entregou à luta, ainda quando as posições foram contrárias, porque então alguém não esteve à altura da disputa que sempre deve dizer respeito ao interesse nacional. Inscrito na corrente social-democrata, que luta em duas frentes, contra o capitalismo selvagem que tenta limitar o movimento operário nas malhas do sistema, e contra o aventureirismo revolucionário que prefere o milenarismo ao respeito pelo normativismo dos factos, é certo que, não obstante a igualdade das teses, são por vezes tão diferentes, por vezes tão pessoais, as hipóteses sociais-democratas na Europa de hoje. Tudo porque o normativismo dos factos, de que falava MacMillan, e em que também insistiu João XXIII, inclui o respeito por valores fundamentais da comunidade, e eles variam no espaço de cada uma, e cada uma os faz variar no tempo. É assim natural que cada um de nós retenha, de uma acção deste modo condicionada, condicionada por cada um de nós pela circunstância em que lhe aconteceu viver, os valores que um chefe político reconheceu e serviu como património comum.
Por isso, destacarei o profundo respeito pelo humanismo do legado político ocidental que sempre orientou o Dr. Mota Pinto, na luta pelo poder, no exercício do poder, no debate público, no confronto parlamentar, nas relações pessoais. Não sofreu alguns dos pecados mortais da vida política, designadamente a indulgência moderada no entendimento dos contrários, a arrogância no exercício do mando, o abandono da cortesia no trato das pessoas. Também registaremos a devoção ao serviço do interesse público, uma virtude talvez mais escassa do que necessitaríamos, e que frequentemente o levava a chamar a atenção para o dever patriótico que lhe impunha sacrificar projectos e comodidades àquilo que lhe parecia, em consciência, o interesse nacional mais urgente. Praticou com simplicidade a regra de que apenas serve bem quem está sempre decidido a ser substituído por quem julga servir melhor, deixando esse julgamento aos órgãos institucionais, cujas decisões exemplarmente respeitava, transitando com inalterável dignidade dos lugares cimeiros para a modéstia da base. Apercebeu-se, na crise que não pára da degradação dos nossos recursos e capacidades, da importância fundamental do patriotismo e, sobretudo no exercício do melindroso cargo de Ministro da Defesa, não perdeu uma oportunidade de apelar para o revigoramento das práticas patrióticas, para a dignificação dos símbolos nacionais, para a recuperação da função das Forças Armadas. Mas, porque a sua acção governamental melhor será referida pelas vozes do partido em que militou, não deixaremos de salientar a sua estatura de universitário, mestre da mais antiga das nossas universidades, que é a de Coimbra, numa das suas faculdades que maior número de servidores tem fornecido ao Estado: a Faculdade de Direito. Ela mesmo exemplo frequente de coexistência e cooperação frutuosa de tendências filosóficas diversificadas, mas todas convergentes no fim institucional da escola que continua, e que fornece ao corpo de estudantes e professores aquela identidade que acima de tudo prezam. Como escolar exemplar, dali partiu para a luta política, e sempre ali regressou para tomar a inacabada tarefa que é procurar a verdade, transmitir os resultados do estudo sem compromissos, reconhecer de tempos a tempos o engano e recomeçar com a mesma firme convicção de que um dia se poderá acertar. Que a Escola, para além das contingências da vida pública, dos afastamentos ocasionais ou prolongados, dos êxitos e fracassos das iniciativas, reconheça sempre o escolar como um dos seus e sempre digno de retomar o seu lugar, e sempre bem-vindo e indispensável para tomar parte na tarefa universitária, tenho para mim ser a melhor recompensa de uma vida de trabalho, como foi a do Dr. Mota Pinto, e o melhor galardão do grande professor que foi. Recolhido de novo e recentemente ao seio da alma mater, num dos incidentes de percurso da sua prestante vida política, não consigo ver nas manifestações de pesar dos órgãos do Estado, ou partidários, ou simplesmente cívicos, os actos que maior justiça lhe prestam. Reparo antes em que os estudantes sentiram que lhe deviam a homenagem de transportarem eles próprios a sua uma para e da capela da Universidade, e assim reconheceram que o seu futuro, hoje tão incerto, passou pelo esforço, pelo ensino, pelo exemplo do mestre que perderam; reparo em que a Cabra da Torre dobrou em aviso de amargura pela perda de um dos pilares da Universidade, chamando os discípulos ao dever de rapidamente se habilitarem a tomar o posto, porque a tarefa não pára; reparo em que muitos dos que correram a Coimbra, para lhe prestar as últimas homenagens, se despiram naturalmente das suas vestes do combate político, para se mostrarem apenas como escolares que voltaram à casa comum por