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29 DE MAIO DE 1983 3231

a protecção legal do direito de autor, que é um dos direitos do homem segundo a Declaração Universal de 1948.
Um diploma que regulamente esse direito e os que lhe são afins, não pode ignorar este imperativo constitucional.
O mais estranho é que o projecto submetido ao Conselho de Ministros - resultante da reelaboração parcial de um texto que havia sido aprovado na generalidade em 3 de Maio de 1984 - podia considerar-se, de um modo geral, um diploma actualizado, inovador sob certos aspectos, digno de emparelhar com a legislação mais recente publicada noutros países sobre esta matéria.
Que aberração terá levado o Governo a introduzir nesse projecto modificações que assim o desfiguraram e desvirtuaram?! Até as próprias inovações louváveis que conseguiram escapar a esta operação descaracterizadora sofreram amputações ou emendas que vieram reduzir-lhes consideravelmente o alcance. É o caso da compensação devida pela fixação e reprodução das obras, instituída pelo artigo 83.º, de que foram arbitrariamente excluídos os editores e os produtores fonográficos e videográficos e cuja determinação se remeteu para um despacho conjunto - ou decreto regulamentar, não se entende bem - de vários ministros, que bastará nunca chegar a ser lavrado para que essa compensação permaneça puramente teórica. E o caso dos direitos conexos ou afins, pela primeira vez reconhecidos na nossa legislação, mas em termos manifestamente insatisfatórios quanto ao seu conteúdo e ao prazo da respectiva protecção.
E tais foram a precipitação e a leviandade com que se agiu, que ao longo do Código aprovado se sucedem as remissões erradas, as imprecisões de ordem técnica e terminológica, as contradições irredutíveis ou simplesmente caricatas. Algumas dessas contradições foram já corrigidas, em declaração recentemente publicada na folha oficial. Mas outras subsistem ainda, sem dúvida muito mais graves do que essas. Assim é que, por um lado, se reconhece ao autor o direito exclusivo de autorizar a radiodifusão sonora ou visual da sua obra e a sua comunicação em lugar público... e, por outro, vem dizer-se, mais adiante, que «é desnecessário o consentimento do autor» para a radiodifusão de obra fixada comercialmente (como se toda a fixação desta não visasse um objectivo comercial) e que «é livre a comunicação pública da obra radiodifundida»! O que é também contrário ao princípio, enunciado no n.º 4 do artigo 68.º, de que as várias utilizações de uma obra são independentes uma das outras.
Para se tentar justificar estas anomalias, estas e outras, recorre-se ao estafado argumento de que é necessário «conciliar» os interesses do autor com os dos consumidores das suas obras, e de que há que atender ao facto de sermos um país mais importador do que exportador de bens culturais. Argumento falacioso, por trás do qual se oculta a protecção de interesses espúrios e a incapacidade de definir e aplicar um política cultural que sirva, realmente, os interesses do País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, quem são os consumidores das obras protegidas pelo direito de autor? O público em geral, sem dúvida, mas também aqueles que as utilizam e exploram. Ora, não pode haver conflito ou choque de interesses entre o autor e o público a que as suas obras se destinam, porque eles são coincidentes: o que ambos acima de tudo pretendem é que a criação literária e artística possa efectuar-se livremente, sem peias nem entraves, e que o património cultural da Nação se desenvolva e valorize. Nada disto é possível sem uma protecção eficaz dos direitos dos criadores - que são, em primeira linha, os autores e os artistas -, pois onde e quando essa protecção não existe, ou é insuficiente, o estímulo à criação desaparece e esta acaba por definhar e extinguir-se.
Por isso, se entre o autor e aquele que explora a sua obra, já pode surgir um conflito de interesses, é em sentido favorável ao autor que ele, necessariamente, terá de ser dirimido.
E quanto ao falado «equilíbrio da balança importação/exportação de produtos culturais», são outros os mecanismos de que o Governo deveria lançar mão para incentivar e promove a criação de origem nacional, desde a exigência do cumprimento das leis que regulam a transmissão de música portuguesa na rádio e na televisão, escandalosamente complacentes perante a invasão de subprodutos de baixa importação, à elevação da quota orçamental destinada aos assuntos culturais, e desde a abolição de taxas e impostos que sobrecarregam uma actividade, já de si notoriamente deficitária, como acontece como o tenebroso IVA, à repressão da pirataria que entre nós assume a proporção de um verdadeiro flagelo. Não é justo que sejam os criadores, os trabalhadores intelectuais, a pagar os custos da incapacidade governativa, neste como noutros domínios. A mais comezinha experiência mostra-nos que os direitos retirados aos autores não vão beneficiar nunca a colectividade. Quem daí tira proveito são sempre, e apenas, os que exploram as suas obras.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sem dúvida!

O Orador: - O alegado interesse público é, aqui, um sofisma, uma máscara que esconde e serve afinal os mais suspeitos interesses privados.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

É claro que nem tudo são defeitos neste Código, que alguma coisa ficou do projecto aprovado na generalidade há l ano. A sistematização das matérias, a regulamentação do contrato de edição literária, o reconhecimento dos direitos afins, apesar das reservas que já tive ocasião de formular, são aspectos positivos que não podem negar-se. Mas, para além disso, quantas soluções inaceitáveis, quantos preceitos aberrantes e até inconstitucionais! Sobre a necessidade de corrigir ou eliminar alguns deles, tão clamorosa era, já foi possível formar-se consenso na subcomissão parlamentar que está a apreciar o diploma. É o caso das disposições penais - matéria particularmente delicada, se tivermos em conta a situação portuguesa, caracterizada por uma intensa e persistente criminalidade neste domínio, sobretudo no que se refere à pirataria fonográfica e videográfica.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Portugal é, com efeito, e para vergonha nossa, o País europeu em que esta atinge os índices mais altos (na ordem dos 80%), o que, por isso mesmo, exigia do legislador uma atitude drástica com