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12 DE NOVEMBRO DE 1986 235

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado António Osório, pedi para o interromper porque não posso invocar nenhuma outra figura regimental para lhe responder.
Simplesmente, tenho a impressão de que V. Ex.ª faz uma leitura errada do n. º 2 do artigo 59.º, pois penso que ele reforça a minha ideia quando diz que é o Governo que deve apresentar propostas de lei e que não é a Assembleia que deve apresentar projectos de lei para regular a matéria. Deste modo, o n.º 2 é contra a sua argumentação.
Além disso, V. Ex.ª vem-me dizer que o seu grupo parlamentar apresentou este projecto de lei antes da aprovação da Lei de Bases do Sistema Educativo. V. Ex.ª devia tomar em consideração a modificação das circunstâncias que se verificou entretanto. Isto é, o seu grupo parlamentar apresentou um projecto de lei antes da apresentação da Lei de Bases, ora, com a aprovação desta última, VV. Ex.ªs deviam retirar este projecto de lei porque votaram entusiasticamente uma lei pela qual se devolveu ao Governo a competência para a regulamentação desta matéria. V. Ex.ª não pode, agora, manter as duas coisas ao mesmo tempo!

O Orador: - Sr. Deputado Narana Coissoró, queria só esclarecê-lo de que a Assembleia da República não devolveu essas competências para o Governo. A Assembleia da República permite ao Governo que apresente, no prazo de um ano, sob a forma de decreto-lei, a legislação sobre esta matéria, o que não a inibe de tomar iniciativas próprias sobre a mesma. E esta situação verifica-se também com outras matérias e prosseguirá, certamente, para bem do ensino em Portugal.
A questão muito concreta - e permitir-me-ia «devolver a bola» ao Sr. Deputado Narana Coissoró - é a de saber se o CDS pensa ou não que esta situação é de grave injustiça e que urge resolvê-la rapidamente. Se assim é, por que razão não há-de a Assembleia aproveitar esta oportunidade para tomar as medidas necessárias para resolver a situação?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sá Furtado.

O Sr. Sá Furtado (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A ciência, a tecnologia, a cultura constituem nossa preocupação cimeira e permanente, por serem componentes essenciais, factores insubstituíveis, entendidos como expressão de modernidade, para a dignidade e para o progresso do povo português. A sua concretização, a nível do Estado, tem por agentes primeiros os docentes universitários e os investigadores que, imersos numa sociedade mutável e contraditória, sofrem o impacte das suas solicitações e apelos e vêm sentindo a degradação da sua condição e imagem.
É elemento chave na arquitectura das suas carreiras, componente fundamental sem o que tudo o mais não passará de vã retórica, gongorismo inconsequente, o valor e escalonamento das suas retribuições. Importa, pois, não descurar a sua correcta e justa adequação às alterações rápidas que vão ocorrendo, pois a desregulação e anomalias prolongadas afectarão seriamente a modernização e a recta evolução que os Portugueses desejam e a que têm iniludivelmente direito.
Os dois projectos de lei, hoje e aqui, em debate inserem-se nesta linha de pensamento e intervenção, e são por nós considerados como constituintes básicos de toda uma política de ciência e cultura, que não se quede por declarações platónicas, melhor ou pior intencionadas. Pretendemos reforçar os vectores propiciadores do nosso desenvolvimento no que tem de intrínseco e endógeno, fruto do nosso esforço e da nossa inteligência, tendo em mira as modificações estruturais indispensáveis a um progresso continuado e ininterrupto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A circunstância de ser um dos proponentes do projecto de lei n.º 177/IV, impõe-me a obrigação de, perante a Câmara, intentar produzir a sua justificação. O Decreto-Lei n.º 243/85, de 11 de Julho, constitui a mais recente tentativa para tornar a carreira universitária mais aliciante, aumentando os subsídios de exclusividade e de formação, fixados na Lei n.º 19/80, de 16 de Julho. Desde logo, não deu resposta satisfatória aos anseios dos universitários que, em virtude da sua grande autonomia funcional e hierárquica, consagrada por séculos de exercício, pensavam e continuam a pensar que, a exemplo do que acontece com outras carreiras de tradição e estatuto similares, deverão fugir ao espartilho anacrónico e naufragado do esquema das letras, sobrevivência necrológica da Administração Pública portuguesa. A erupção súbita e prodigiosa de universidades privadas veio agudizar toda esta questão, pela concorrência ad libitum a que as universidades públicas ficaram sujeitas. Se o Governo entendeu por bem, dentro da filosofia que o informa, enveredar por este caminho, compete ao Estado, jogando capazmente as regras deste jogo, defender o bem público, procurando acautelar as suas universidades e os nobres ideais por elas perseguidos através da criação de condições que levem à dedicação plena dos seus professores, numa disponibilidade total para leccionar, investigar, exercer a livre crítica, fazer escola e discípulos.
O aumento agora proposto fica muitíssimo aquém dos estimados 2000 contos, que, numa pura lógica de mercado, resultariam da extrapolação à luz da teoria marginalista do valor da centena e meia de contos correspondentes à repetição da matéria de uma disciplina numa universidade privada.
Por aqui se vê como se encontra aviltado o estatuto dos universitários! Não acudir a tempo, como pretendemos, a este descalabro é grave omissão reveladora de incúria e, mesmo, cumplicidade.
O recrutamento tornou-se mais difícil, a dedicação exclusiva tende a regredir face às sereias de um liberalismo serôdio, desordenado e amoral. A própria Administração Pública, fruto das confederações de ministérios que são os governos neste nosso Portugal, tem exercido uma acção manifestamente deletéria e anti-social, no encaminhamento dos nossos valores. No momento da integração europeia há que inverter este movimento, ir corrigindo, que é a forma democrática de ter esperança, dando particular atenção à criação de um corpo docente universitário competente, integralmente votado à docência de graduação e pós-graduação, à investigação e à reflexão crítica e criadora, sem o que, por muito que melhoremos a balança de pagamentos, permaneceremos, para a eternidade, na categoria de país em vias de desenvolvimento.