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13 PE DEZEMBRO DE 1986 941

A Sr.ª Helena Torres Marques (PS): - Em primeiro lugar, queria realçar a sua presença, Sr. Presidente, nesta sessão de homenagem ao poder local. Ela simboliza o respeito desta Câmara por esse mesmo poder local.
Pena é que tantas comissões estejam a funcionar a esta hora, impossibilitando assim a muitos deputados a sua presença nesta sessão, que se quis solene.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estamos hoje a festejar os 10 anos do poder local. Poder local velho de mais de dez séculos. Mais antigo que a nacionalidade. Mais intrínseco à realidade portuguesa, porque mais perto; mais desejado pelas populações, porque mais experimentado e mais reivindicado. Reivindica-se mais o que já alguma vez se teve, se usou e se gostou.
E se hoje festejamos o poder local, a pretexto dos dez anos que passam sobre as primeiras eleições autárquicas, é porque, na verdade, o poder local renasceu, ressuscitou de um longo período de centralização feroz, que transformou os órgãos autárquicos em extensões menores da Administração Central, presididos por mandatários nomeados pelo Governo, que haviam de se caracterizar pelo seu espírito de obediência, acomodação e reivindicação controlada.
O resultado viu-se: definidas as prioridades de cada lugar do país a nível central, abandonaram-se vastas zonas do país ao seu subdesenvolvimento quase medieval e, como consequência da inexistência de condições mínimas exigidas pelo mundo moderno, verificou-se a partir da Segunda Grande Guerra e, em especial, da década de 60, o êxodo populacional para o estrangeiro e para as principais cidades do país. Portugal começou a desequilibrar-se, a esvaziar-se e a envelhecer. E parecia que nenhum poder se preocupava com este vazio, que se alastrava a uma parte cada vez maior do território, nem com as condições em que viviam os que ainda aí ficavam.
Dez anos de poder local, com eleitos locais, com autonomia, com capacidade financeira e técnica, transformaram o nosso país de tal forma que hoje já todos dizem que o poder local é a maior realidade da nossa jovem democracia, o que mais fez mudar o dia-a-dia dos Portugueses, o que mais contribuiu para melhorar a sua qualidade de vida.
Foram os caminhos que enfim se abriram, foi a água e a luz que afinal chegaram, foram os esgotos que ninguém acreditava possíveis, os mercados, os centros de saúde, de dia, da terceira idade, os infantários, as escolas, os transportes escolares: o que durante décadas se adiou e que enfim começou a chegar, e em muitos locais se conseguiu.
Alguém que estivesse dez anos sem voltar à sua terra, no interior das Beiras, no Minho ou no Algarve, teria, muitas vezes, dificuldade em a reconhecer.
Só quem andou «por dentro» de Portugal e ouviu os habitantes de cada local contar o que está diferente, se apercebe como se vivia ainda há dez anos em Portugal. E se percebe porque emigrava a população.
É que não há direito que, a 25 anos do ano 2000, as crianças ainda tivessem que fazer quilómetros a pé para chegar a uma escola, que não tinha instalações sanitárias, nem cantina; fossem alimentadas a vinho e não a leite; em que as aldeias não tinham estrada, quanto mais transportes públicos; as casas não tinham luz, qual água, quais esgotos, qual telefone; em que era preciso andar horas para chegar ao cemitério; e onde não havia nem centro de saúde, nem quartel de bombeiros, nem escola secundária, para quê falar de pavilhão gimnodesportivo.
Tive, pessoalmente, a oportunidade de conhecer por dentro o nosso país através dos seus autarcas, que me mostraram o muito que tinham feito e também o muito que havia para fazer: foram rios atravessados a vau porque não havia pontes, ou bairros por habitar por falta das infra-estruturas, ou sistemas de esgotos a que faltava a estação de tratamento, ou a estrada por pavimentar porque ainda o dinheiro não chegara para tanto. Mas o que o poder local conseguiu, podia, em termos tecnocráticos, ser considerado impossível.
Quem acreditava que este país, com uma administração autárquica quase inexistente e órgãos que, em 1976, aquando das primeiras eleições, nem legislação tinham que lhes definisse as atribuições e as competências, ou o sistema financeiro, seria capaz de se modificar desta forma, seria capaz de realizar investimentos de tal maneira vultosos?
Quem diria que, com uma administração local a reestruturar-se, com autarcas a iniciar as suas tarefas, seria possível a este país investir 300 milhões de contos em dez anos em domínios ligados ao poder local?
Podemos muitos de nós dizer que é insuficiente - é óbvio, face às carências. Só que se, em 1976, ano em que os municípios tiveram 5,5 milhões de contos para despesas de capital, alguém previsse que em 10 anos se investiriam 300 milhões de contos, haveria quem dissesse que este era um objectivo irrealista, que não tínhamos nem capacidade técnica, nem estruturas adequadas, nem conhecimentos suficientes, nem estudos, nem planos que permitissem tal aventura.
E, no entanto, esta é a realidade. E por isso Portugal está diferente e por isso estamos aqui hoje, na Assembleia da República, a festejar.
Com efeito, compete à Assembleia da República papel decisivo neste domínio, já que as matérias relativas ao poder local são constitucionalmente competência que lhe é reservada, e por isso também nós hoje estamos de parabéns.
Foi aqui, nesta Assembleia, que se elaborou a Constituição que institucionalizou este novo poder local; foi aqui que, em 1977, se elaborou e aprovou a primeira Lei das Atribuições das Autarquias e competências dos respectivos órgãos; que em 1978 se elaborou e aprovou a primeira Lei das Finanças Locais; que em 1981 se aprovou a Lei das Remunerações dos Eleitos Locais. Foi esta Assembleia que autorizou a criação, por decreto-lei, da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, que ratificou leis fundamentais à organização e funcionamento da Administração Autárquica e que, por último, acabou de produzir uma nova Lei de Finanças Locais.
Mas o grande mérito neste domínio está no trabalho dos autarcas, na generosidade, dedicação e interesse da generalidade dos autarcas, de todos os partidos, a quem eu, hoje e aqui, em nome do Partido Socialista, rendo a minha sincera homenagem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - E também à nova administração autárquica, aos seus funcionários e quadros e aos gabinetes de apoio técnico - os GAT -, cujo trabalho foi essencial para que fosse possível alcançar os resultados já obtidos.