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7 DE JANEIRO DE 1987

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A quadra natalícia que ora termina, quadra por excelência para reflexão sobre o amor e a paz entre os homens, foi perturbada pela montagem de um conflito absurdo e destinado a levar a confusão e a divisão ao povo português.
Quem percorreu nesta quadra aldeias e vilas, onde as fontes de informação continuam a ser sobretudo a rádio, a televisão e as homilias, viu-se confrontado com a inquietação e a perplexidade de pessoas que manifestavam o seu veemente desejo de conhecer a verdade sobre os actos atribuídos ao Parlamento. E isto porque à habitual campanha de desinformação do Governo se juntaram agora vozes inesperadas e revelando grande exaltação.
Os factos têm sido distorcidos, a verdade tem sido frequentemente omitida e até se tem recorrido a agressões verbais ressuscitando expressões e vocábulos ainda possuidores da carga de suspeição que lhes foi atribuída num passado recente e que denunciam por si só a verdadeira marca de alguns dos protagonistas.
Isto talvez explique o modo como está a ser aproveitada a contestação a uma das últimas leis aprovadas na Assembleia da República para se atacar, em termos inaceitáveis, o Parlamento, o órgão que melhor representa e simboliza a democracia. Desprestigiar a Assembleia da República parece ser de facto um dos objectivos de toda a absurda campanha a que vimos assistindo a propósito da chamada «lei da rádio». Por outro lado, não havendo nesta lei qualquer ataque à Igreja ou tentativa de coarctar o seu legítimo direito de informar e comunicar com os seus fiéis, como adiante se demonstrará, estamos a ser testemunhas, mais uma vez, de uma tentativa de criação de uma falsa questão religiosa, certamente para obter, através dela, dividendos políticos inconfessáveis e a divisão dos Portugueses.
É pois legítimo e necessário repor a verdade e é legítimo esperar que a Igreja analise serenamente os factos sem deixar que dela se utilizem os representantes encapotados dos saudosistas de uma sociedade autoritária, defensora de privilégios e inimiga do pluralismo democrático.
Custa ouvir os responsáveis da Igreja inverter os dados de um problema e afirmar que a lei de licenciamento da rádio «é um diploma legislativo vincadamente estatizante, de cariz totalitário, que não respeita a justa autonomia e a correcta liberdade de expressão da Igreja».
Estatizante e totalitária uma lei que, pelo contrário, pretende pôr termo ao oligopólio do Estado e da Rádio Renascença? Uma lei que recupera da própria emissora do Estado, e não só da Rádio Renascença, as frequências, que lhes tinham sido concedidas, a título provisório, para tornar agora possível o aparecimento de outras emissoras concorrentes e assegurar assim o pluralismo da informação?
Estatizante uma lei que vai desgovernamentalizar o processo de licenciamento de novas emissoras, fazendo-o depender de parecer favorável de um órgão plural e independente, à semelhança do que passa em muitos países democráticos?
Por que foi dito que esta lei punha em risco a sobrevivência da Rádio Renascença?

Por que não foi dito claramente ao povo português que, na data da sua aprovação, a lei em nada afectaria a capacidade da Rádio Renascença para continuar a fazer-se ouvir em todo o País como a mais poderosa emissora existente? A verdade é que a Rádio Renascença dispunha já, no nosso reduzido espaço radioeléctrico, da melhor e maior cobertura do País em frequência modelada e em onda média e é a única emissora privada da Europa autorizada a emitir em onda curta.
Aliás, a lei não exclui a Rádio Renascença dos futuros concursos nem de vir a obter através deles a tão desejada frequência.
Porquê então esta campanha contra uma lei reconhecida, por uns e outros, como uma necessidade, para disciplinar e regulamentar a utilização do nosso espaço radioeléctrico?
Sinceramente desejamos que não tarde a reflexão sugerida pelas interrogações que aqui deixamos formuladas e aguardamos que a tradicional serenidade e prudência de julgamento regressem aos espíritos para que se reconheça que é insustentável manter uma situação de excessivos privilégios, privando o povo português de outras vozes na informação.
E desejamo-lo sinceramente para que se afastem de nós as legítimas suspeitas de que estamos perante uma luta contra a democracia, para além da luta pelo controlo da informação e dos lucros da publicidade.

Uma voz do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Como se lê no recente comunicado da Subcomissão Parlamentar da Comunicação Social, a Assembleia da República aprovou uma lei democrática, transparente, não consagradora de privilégios e que procura assegurar a liberdade de expressão e o pluralismo na radiodifusão.
Em que se baseiam então as acusações e as censuras dirigidas contra a Assembleia da República quer pelo Governo quer pela Rádio Renascença e seus porta-vozes?
Todo o mal estaria contido nas disposições que permitem a recuperação para o domínio público disponível das frequências atribuídas, a título provisório, por um despacho do último governo e nas que criam o Conselho da Rádio, órgão de cujo parecer vinculativo dependerá a atribuição ou não de licenciamentos radiofónicos.
Quanto à reversão para o domínio público dos dois canais em litígio, o Governo sempre esteve de acordo com ela, através do Secretário de Estado da Comunicação Social, que espontaneamente enviou à Assembleia da República o parecer por ele solicitado à Auditoria da Presidência do Conselho de Ministros sobre o despacho em causa, ao qual deu o seu acordo.
Este parecer concluía pelo carácter precário das autorizações concedidas, com possibilidades da sua cessação a todo o tempo e nos termos que a lei da radiodifusão viesse a estabelecer.
(A propósito, o embaraço do Secretário de Estado, na sua intervenção televisiva de domingo, era notório. E a escapatória que arranjou foi fraca - não falar nas conclusões do parecer quanto à precariedade da concessão e limitar-se a repetir que o despacho do anterior governo era legal...)
Pois era. Pobre Sr. Secretário!