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I SÉRIE - NÚMERO 27

O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O modesto jurista que sou sente-se com algumas dificuldades em tomar parte neste debate.
Com o Sr. Ministro da Agricultura aprendi algo sobre a Constituição; com o veterinário, Dr. Soares Cruz, aprendi algo sobre direito administrativo; com o Sr. Deputado Luís Capoulas aprendi alguma coisa sobre a Constituição e direito administrativo. Creio que terei que falar sobre pecuária, silvicultura e outras matérias!...

Aplausos do PRD.

E outras dificuldades terei, naturalmente.
Tentarei, portanto, desenvencilhar-me delas tão bem quanto puder, até porque me parece que, curiosamente, nenhum dos Srs. Deputados a que me referi terá lido o projecto que criticaram. Isto porque as críticas que formularam revelam inteiro desconhecimento do seu conteúdo.
Começando pelas afirmações do Sr. Ministro, e repetidas depois, devo dizer que nenhuma delas tem conteúdo.
Começaria por dizer que a taxa média de variação do produto agrícola bruto de 1976-1980 foi de mais 1,4 %, correspondendo 9,9 % ao ramo florestal, 1 % à pecuária e 0 % à parte vegetal; a superfície semeada anualmente diminuiu 2,2 % da taxa média de variação anual de 1970 a 1981; de 1975 a 1980 os preços dos produtos alimentares, no seu conjunto, cresceram 248 %, ou seja, claramente mais do que o índice geral dos preços, que subiu 214 % no mesmo período.
Não colocarei neste momento os problemas inerentes à adesão de Portugal à CEE e o modo como estamos, melhor dizendo, não estamos, a preparar-nos para lhe responder em termos agrícolas.
Apenas gostaria de citar uma afirmação recente de um técnico conceituado, segundo a qual imputar a estagnação da produção agrícola à existência em Portugal de um número muito elevado de pequenos agricultores familiares é uma explicação pouco consistente, se nos lembrarmos que, apesar das medidas políticas, desde 1960, terem sido tomadas em função da grande exploração, é à pequena agricultura que se fica devendo a quota-parte mais significativa da produção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Largarei, obviamente, este campo para me ater nas matérias que estão em debate, mas em que os dados citados constituem enquadramento que não pode ignorar-se.
Gostaria de dizer, em primeiro lugar, que aquilo que para nós é mais importante no nosso projecto não foi certamente preparado por nenhum dos Srs. Deputados intervenientes. Refiro-me à transformação dos actos discricionários do Ministério da Agricultura em actos vinculados.
A discricionariedade, tal como tem sido entendida pelo Ministério da Agricultura em sucessivos governos, não tem sido apenas uma escolha livre de critérios mas também uma livre escolha de oportunidade temporal; e essa discricionariedade de aplicação temporal tem sido a maior causa de agitação e de perturbação nesta situação, de tal modo que os Srs. Deputados, preocupados com a dificuldade do sistema, se tivessem atentado neste aspecto teriam concluído que só ele permite reduzir drasticamente as situações.
Na verdade, se os Srs. Deputados atentarem no artigo 28.º da Lei n.º 77/77, sobre majorações, ou no artigo 29.º, sobre os limites máximos de reservas, chegarão facilmente à conclusão de que o entendimento correcto, aplicável quer ao artigo 28.º quer ao artigo 29.º, é o de que quer as majorações quer os limites máximos de reserva deveriam entender-se aplicados temporalmente no momento da constituição da reserva.
Continuar indefinidamente a rever majorações e critérios de exploração é um critério de oportunidade que se traduz afinal numa perfeita, flagrante e espantosa ilegalidade.

Vozes do PRD: Muito bem!

O Orador: - E tão espantosa quanto isto: em primeiro lugar, uma situação de profunda desigualdade entre os agricultores do País. Qualquer agricultor de Trás-os-Montes ou das Beiras que chegue à conclusão de que a sua exploração tecnicamente aconselhável é do tipo silvo-pastoril não pode pedir mais 200 ha ao Sr. Ministro da Agricultura, uma vez que este não lhos pode conceder, não tem nenhuma forma de lhos conceder. Mas, se esse agricultor for do Alentejo, já pode, porque, se se considerar que a situação é «tecnicamente aconselhável», o Sr. Ministro vai julgar da oportunidade de rever critérios anteriores e considerar agora outro como mais adequado.
E mesmo agora, quase oito anos depois de encerrado o processo, vai revê-lo novamente e dizer: «Agora mudou de exploração; o critério é oportuno. Tome lá mais 200 ha.»
Creio que terão aqui os Srs. Deputados um exemplo claro de como a discricionariedade, utilizada não apenas, como é normal, no nosso direito administrativo em matéria de critérios, mas no tempo, é a causa provada e concreta da indefinição permanente de todas as situações.
O Sr. Ministro fará o favor de me corrigir se erro quando digo que 90 % das situações são situações deste tipo, ou seja, de majorações novas, de revisão de critérios, de aplicação de novas explorações. É quanto a isto que é preciso pôr cobro; e aqui teríamos, repito, 90 % dos casos resolvidos.
Um segundo aspecto, também importante e que vale a pena contemplar, tem a ver com as várias críticas que foram formuladas e que se pronunciaram em relação a situações variadas de direito constitucional.
Creio que a chamada de atenção para o artigo 104.º da Constituição que foi feita, a ter alguma pertinência, põe em causa a votação na generalidade da Lei do Emparcelamento Rural por referência ao artigo 98.º Vale a pena ter isso em consideração, mas não me alongaria nesse tema.
Gostaria de lhes lembrar que a Constituição, na sua forma revista em 1982, modificou o sistema dos nossos tribunais administrativos e transformou o contencioso, que era de simples anulação, em contencioso que pode pronunciar-se - di-lo o ponto final do n.º 3 do artigo 268.º da Constituição, para obter o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido. O artigo 268.º, n.º 3, resolve portanto as dúvidas constitucionais que foram colocadas, e creio que nesse aspecto a intervenção do Sr. Ministro teve pelo menos o mérito de pôr em causa o seu colega de bancada e Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, para quem a Constituição não é portuguesa.

Vozes do PRD: - Muito bem!