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17 DE JANEIRO DE 1987 1303

da legislação interna. Só que, a partir do momento em que a própria Constituição permite a imposição da prisão disciplinar a militares, não vejo qualquer razão para que se não possa retirar a reserva oposta ao artigo 5. º da Convenção.
A única objecção que, em sede de Comissão, foi invocada diz respeito ao receio das Forças Armadas de que a Convenção Europeia dos Direitos do Homem se pudesse sobrepor, na ordem interna, à própria Constituição da República. Contudo, não creio que esse receio seja de manter.
Porém, se realmente fosse de manter, diria então que no próprio artigo 5. º da Convenção, relativo à liberdade e segurança, se excepciona o caso do preso ou detido legalmente para garantir o cumprimento de uma obrigação prevista por lei.
O RDM é lei, e se não é, que se lhe dê mais dignidade legislativa - transforme-se em decreto-lei ou mesmo em lei. Porém, se assim for, penso que a própria Convenção, mesmo no caso, que creio não ser de acolher, de a considerarmos supranacional e impositiva em relação à própria Constituição da República, contempla, de entre as suas excepções, a excepção da imposição de penas de prisão a militares no caso previsto na Constituição da República.
Não há, portanto, que ter os receios que parecem ter levado à recomendação de última hora, por parte das Forças Armadas, relativamente a esta reserva.
Outra reserva que me parece retirável - e nisso estou de acordo com o Sr. Ministro da Justiça - é a relativa à televisão. Contudo, nem sempre pensei assim - devo dizê-lo com toda a honestidade. No entanto, não tenho, neste momento, a menor dúvida de que a reserva relativa à televisão, ou seja, a reserva segundo a qual o artigo 10. º da Convenção não impedirá que, por força do n.º 6 do artigo 38.º da Constituição, a televisão não possa ser objecto de propriedade privada, é perfeitamente retirável. E porquê?
Em primeiro lugar, porque, entretanto, houve jurisprudência do Conselho da Europa no sentido de que esta reserva não é impeditiva do monopólio estatal da televisão - é a interpretação das próprias instâncias do Conselho da Europa.
Por outro lado, há também uma discordância, no sentido de que a expressão «autorização», que se encontra no texto da Convenção (artigo 10.º), não exclui o monopólio do Estado sobre a TV.
Portanto, há hoje uma interpretação que, folgadamente, nos permite estar tranquilos na retirada de mais esta reserva.
No entanto, diria que, até com mais atenção, a simples leitura do artigo 10.º da Convenção permitiria esta conclusão, pois o referido preceito diz o seguinte: «O presente artigo não impede que os Estados submetam as empresas de radiodifusão, de cinematografia ou de televisão a um regime de autorização prévia.» Assim, e bem interpretado, este «regime de autorização prévia» contempla ou pode incluir, como é obvio, a não autorização a determinados sectores de actividade.
Isto parece-me claro e é certamente este raciocínio que se encontra na base da jurisprudência do Conselho da Europa.
Estou igualmente de acordo com o Sr. Ministro da Justiça, quando diz que o artigo 11.º da Convenção não tem nada, mas rigorosamente nada, a ver com a proibição do lock-out. Não sei de onde veio esta reserva, mas a verdade é que, mesmo lido à lupa de uma grande exigência ou de uma grande generosidade o artigo 11.º da Convenção, ele não tem rigorosamente nada a ver com a proibição do lock-out. Portanto, não teríamos nunca que recear que este artigo 11. º pudesse criar qualquer problema à permanência constitucional da proibição do lock-out.
Finalmente, com algumas dúvidas mais - e talvez isso dependesse de um estudo - mais cuidado -, penso que já não se justifica, hoje (justificou-se na altura em que foi formulada), a reserva consistente no facto de se dizer que o artigo 7. º da Convenção não obstará à incriminação e julgamento dos agentes e responsáveis da PIDE/DGS, em conformidade com o disposto no artigo 309. º da Constituição.
Não sei se há ainda algum processo à espera de julgamento, mas se não houver só esse facto permitirá a eliminação da reserva.
Porém, se existir ainda algum, nessa altura eu próprio porei reservas à eliminação das reservas, embora deva dizer que também aí um estudo mais cuidado me leve a supor - mas, por enquanto, não a concluir que a própria Convenção também contém elementos (as tais cautelas que caracterizam o pragmatismo desta Convenção) que permitiriam dispensar, mesmo originariamente, esta reserva.
Pois, o que é que diz o artigo 7.º da Convenção? Diz que «ninguém pode ser condenado por uma acção ou omissão que, no momento em que foi cometida, não constituía infracção segundo o direito nacional ou o internacional».
Sabemos que não a constituía no direito nacional, pois era um direito que protegia exactamente os agentes da PIDE/DGS, mas sabemos que no direito internacional houve sempre normas punitivas dos crimes cometidos profissionalmente por qualquer agente da PIDE/DGS e que estavam implícitos no facto de serem agentes de uma policia política.
Diz a Convenção que não pode ser igualmente imposta «uma pena mais grave do que a aplicável no momento em que a infracção foi cometida». No entanto, diz depois o seguinte: «O presente artigo não invalidará a sentença ou a pena de uma pessoa culpada de uma acção ou omissão que, no momento em que foi cometida, constituía crime segundo os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas.»
Os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas estão, em termos de defesa do homem, nas convenções universais de direitos, e todas essas convenções são a condenação mais formal e mais cabal daquilo que era um agente da PIDE/DGS, pelo facto de o ser ou em acção profissional.
Eis, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça, as razões pelas quais penso estarmos em condições de eliminar, uma a uma, todas as nódoas que sujam a nossa face de pais vanguardista na defesa dos direitos fundamentais.
E devo dizer que as convenções internacionais que começaram por parecer, ou até por serem consideradas em muitos aspectos como um delírio imaginativo de idealistas que não tinham os pés assentes no solo e na problemática do seu tempo, transformaram-se numa «bomba» mais explosiva que as armas mais explosivas inventadas pelos armamentistas militares. Desta «bomba» eu sou «bombista» e acredito que no momento em que esses idealistas - que, afinal de contas, merecem tanto e em tão alto grau o nosso respeito e a nossa admiração - resolveram ultrapassar