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27 DE FEVEREIRO DE 1987 1923

-lhe poder comunicar com o povo, que é, ele também, simples, também não rebuscado, também não sabedor dos rigores da música sofisticada.
Outra das origens da beleza da sua composição - a quarta - é a circunstância de, em África, ter contactado com o folclore africano. Quem viveu em África sabe que muitas das suas composições - sobretudo depois que por lá passou - têm uma originalidade que só é possível a quem viveu em África e conviveu de perto com o folclore africano e soube entendê-lo na sua essência.
Por outro lado, Zeca Afonso era um homem que tinha como supremo referencial o homem do povo, o homem simples. Ele próprio era um homem simples, despretensioso. Não o fazia por jactância, fazia-o naturalmente: desprezava as convenções. No Algarve , salvo erro em Olhão, conviveu com os pescadores mais humildes e tem composições que lembram esse período em que por 1á passou.
Mas uma outra grande fonte da originalidade e da beleza das composições de Zeca Afonso é a sua bondade como homem e é preciso que isso se registe aqui. Só a bondade, quando se consegue traduzir em arte, atinge os píncaros de beleza que atingiram as suas composições. A verdade é que ele é verdadeiramente um fenómeno. O que teria sido este homem se tivesse outros instrumentos para traduzir o seu imensíssimo talento?
Foi um artesão da canção popular portuguesa. Mas, talvez aí esteja o seu mérito, porque também as mais inspiradas composições do nosso folclore são de origem desconhecida ou têm origem em pessoas que também não sabiam música e que também não tinham outros dons que não fossem os do próprio génio.
O Zeca Afonso, para mim, é fundamentalmente um homem que soube interpretar o sentimento popular e a sensibilidade popular; que meteu a ideia dentro do fado de Coimbra; que harmonizou a ideia e o fado e os pôs ao serviço dos bons combates. Abril deve-lhe o seu hino; Portugal deve-lhe a ele, ao seu sacrifício e às suas trovas, como a muitos outros combatentes pela liberdade, a própria liberdade.
Referiu o José Carlos Vasconcelos - outro grande amigo dele - que na Balada de Outono, e é verdade, ele disse: «Eu não volto a cantar». Terá sido dos poucos enganos do Zeca Afonso. Ele vai voltar a cantar; o povo lhe emprestará a sua voz e cantará os seu poemas e a sua trova até que a sua mensagem reencarne definitivamente no homem português.
Morreu o trovador. Viva a sua trova!

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: = Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Vaz.

O Sr. Manuel Vaz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: « É preciso reforçar o poder local.» Eis a frase que permanentemente se vem ouvindo em todos os lugares e nos mais variados momentos. Quando é preciso unir as populações, quando urge defender alguma causa, sempre que se necessita de apoio não se hesita em proclamar aos quatros ventos que o poder local é algo de útil, extraordinário, eficientíssimo, ou até mesmo se fazem grandes apanágios daqueles que o servem. Teoricamente é assim.
Contudo, a realidade é bem diferente. Mal avisados andaríamos nós se acreditássemos em tais lindas palavras, belos discursos de verborreia fácil, sedutora, enganadora, mas infelizmente persuasora dos menos cautos. Passados dez anos de poder local ninguém, de boa fé, poderá dizer que o balanço não foi positivo. Sabemos que ninguém tem coragem de o negar aberta e francamente. Mas também não ignoramos que muitos o fazem subrepticiamente, generalizando, publicitando e valorizando exageradamente os erros que através dele se têm cometido.
Esquecem-se que os autarcas os assumem responsavelmente. Ignoram esses o que é o poder local e as condições em que o mesmo é exercido.

Uma voa do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Ignoram essa tremenda responsabilidade que é o aguentar todos os dias, a todas as horas, de dia e de noite as pressões de todo um povo cheio de carências das quais muitas nem sequer são da competência das autarquias. A todas elas o autarca tem que procurar atender e muitas vezes substituir o próprio governo para resolver os problemas nos tribunais, nos hospitais, nas escolas secundárias, nas do ciclo preparatório, na PSP e GNR e em tantas outras situações que não é possível aqui enumerar. Para evitar males maiores, e porque estão perto daqueles que podem ser chamados verdadeiramente «povo», que sofre na carne as consequências dessas insuficiências, procuram suavizar e minimizar as suas dificuldades à custa muitas vezes dos meios já parcos das autarquias, embora, repito, isso não seja da sua competência.

Uma voa do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Já ouvi dizer que o autarca é como um bombeiro. Ainda há muita gente a pensar assim, felizmente.
Ele está junto do povo. Conhece-o. Faz parte integrante dessa comunidade e sofre conjuntamente com ela o desprezo, o abandono e quantas vezes o tratamento discriminatório daqueles que têm por missão agir de modo que neste país tão pequeno não haja gentes nem mais nem menos favorecidas que outras.
Bom seria ver os Srs. Membros do Governo, os Srs. Deputados, a ter uma experiência autárquica para que melhor pudessem avaliar o esforço, o sacrifício que esse homens têm feito para transformar este pais, as cidades, mas sobretudo as aldeias, e o mínimo essencial para uma vida própria de seres humanos.

O Sr. José Garra (CDS): - Muito bem!

O Orador: - E quer queiramos quer não se alguém tem lutado por isso tem sido o poder local. Não é por mero acaso que um ministro deste actual governo dizia numa câmara municipal que um tostão administrado por uma autarquia era muito mais rentável do que muitos escudos administrados a nível central. Esta é, sem dúvida, uma verdade indesmentível.

Uma voa do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Não haja ilusões de que cada vez mais se centraliza. O Governo não quer perder poderes. E se algo se pensa dar às autarquias são única e simplesmente responsabilidades, não lhes atribuindo os necessários meios para resolução dos problemas que muitas vezes afligem o próprio Governo.