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10 DE MARÇO DE 1989 1789

legislativa para legislar a seu modo sobre direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, inseridos no capítulo dos direitos, liberdades e garantias fundamentais da Constituição da República, e que são da competência reservada desta Casa.
Fê-lo em relação ao trabalho infantil - na altura, para esbater e impedir a passagem do projecto de lei do PCP -, fê-lo sobre a lei dos despedimentos e contratos a prazo, fá-lo agora sobre o regime jurídico do trabalho temporário.
Enquanto isso, a maioria PSD limita-se a obstaculizar as iniciativas da Oposição e a assinar quase de cruz todas as propostas de autorização emanadas do Governo.
Desconfiança do executivo em relação aos seus deputados apoiantes? Ninguém acredita nisso!
Incompetência da maioria? Não seremos nós a fazer tal acusação!
Mas então, porquê o Governo não recorre, na área da legislação laborai, à figura da proposta de lei no quadro da Assembleia da República, das suas prerrogativas constitucionais, da sua composição plural, como órgão de soberania de portas franqueadas, que iria permitir o debate aberto, os contributos das diversas bancadas e, porque não, a polémica e o confronto democrático das ideias e das soluções?
Por outro lado, não é a Assembleia da República, face aos seus poderes constitucionais, o órgão de soberania privilegiado para desencadear e materializar a participação das organizações dos trabalhadores?
Foi à luz dessa dimensão, com o sentido exacto da importância da participação democrática das forças políticas e sociais nas questões relevantes da área laboral, que a Constituição quis elevar os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores para o mesmo nível de dignidade constitucional de outros direitos, liberdades e garantias fundamentais e, consequentemente, dar à Assembleia da República a reserva de competência legislativa.
E isto é uma questão política e de relacionamento institucional, do entendimento que se tem sobre o papel e o funcionamento das instituições democráticas. A democracia não comporta que a Assembleia da República seja transformada em «jarrão decorativo», simples local de reconhecimento das assinaturas do Governo e onde a discussão seja um fim em si mesmo.
Refugia-se o Governo na legitimidade de poder recorrer, sempre que o entenda, à autorização legislativa. Por razões de celeridade e eficácia? Nem isso! A proposta de lei de autorização, hoje em apreço, desde o seu nascimento até aqui, demonstra mais uma vez que o Governo insiste no erro e na fuga aos pressupostos e exigências constitucionais e na desvalorização do direito de participação das organizações de trabalhadores na legislação laboral.
Em 9 de Dezembro do ano passado publicou o Governo na separata do boletim do trabalho e emprego nada mais nada menos que oito projectos de diploma, visando diluir a peça central que ali estava contida - a lei dos despedimentos e dos contratos a prazo.
Era evidente que as preocupações dos trabalhadores e das suas organizações se iria centrar no projecto de decerto dos despedimentos já que todos os outros constituíam medidas avulsas e malfeitorias legislativas de carácter subsidiário e complementar.
Naquela floresta de iniciativas legislativas lá surgia, mais uma vez, um «projecto» de proposta de autorização legislativa, sobre o regime jurídico do trabalho temporário, numa alta demonstração inequívoca da assumida incompetência orgânica do Governo para suscitar a discussão pública.
Aliás, sabendo-se, como se sabe, que tal matéria é da competência legislativa da Assembleia da República como prescreve a alínea a) do artigo 4.º da Lei n.º 16/79, seria inevitável que cometeria a este órgão de soberania a competência para promover a intervenção das organizações de trabalhadores na elaboração deste projecto de proposta de lei.
Negamos, porventura, a legitimidade que assiste ao Governo para colocar em apreciação pública aquilo que muito bem entende?
É óbvio que não! Mas esta legitimidade, essa apreciação preliminar não pode ser exercida e instrumentalizada para subverter e dar carácter redutor ao direito constitucional e legal da participação das organizações de trabalhadores na legislação de trabalho.
Curioso é o raciocínio linear de alguns deputados da maioria: se o Governo já promoveu a sua discussão, limite-se a Assembleia da República a votar, ou não, a proposta de lei de autorização legislativa (que só passou a sê-lo no momento em que é admitida na Assembleia). Ou mais radical ainda: se é só uma proposta de lei de autorização legislativa (e no entanto em conformidade com a Constituição ela tem de definir o sentido, o objecto, a duração e a extensão), na opinião de alguns deputados, não vale a pena discussão pública nenhuma.
Lapidar raciocínio este!
Na sua génese está encorpado o conceito real do Governo e, aliás, tivemos há pouco uma manifestação do Sr. Secretário de Estado nesse sentido - e de alguns deputados da maioria quanto à verdadeira dimensão que é dada ao direito de participação dos trabalhadores e das suas organizações.
Assume uma grande actualidade e poderia constituir lição para o Governo uma recente decisão do Tribunal Constitucional que, em acórdão publicado no Diário da República de 8 de Março, considerou inconstitucional o Decreto-Lei n.º 280/85, sobre contratos a prazo na Função Pública, precisamente por não ter havido consulta pública às organizações de trabalhadores.

O Sr. João Amaral (PCP): - É verdade!

O Orador: - Ou será que, face ao processo de revisão constitucional em curso, indiciada que está a manutenção da matriz da Constituição laborai e o direito de participação das comissões de trabalhadores e associações sindicais na legislação laborai, o PSD (arrecadado o bocado que está na Constituição económica) tente fazer vingar, por processos enviezados, jogando no tabuleiro da legislação ordinária, as suas propostas derrotadas?
Já o fez com o pacote laboral. A sua insistência deve constituir reflexão séria para todos os que se identificam com os direitos e liberdades dos trabalhadores e proclamam a necessidade de uma democracia participada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Cabe por último fazer algumas considerações sobre o conteúdo concreto da proposta de lei de autorização.