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21 DE ABRIL DE 1989 3251

O Orador: - O que flui da Constituição em matéria de liberdades, em matéria de direito à diferença é, desde logo, a decorrente da consagração da autonomia privada da consagração da dignidade da pessoa humana em todas as suas vertentes...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ..., que exige inequivocamente esse respeito pelas diferenças, da consagração da ideia do Estado de direito democrático. O Estado de direito democrático não invade a esfera da liberdade pessoal; deixa uma esfera infragível de liberdade pessoal aos cidadãos, da qual estão arredados todos os poderes públicos e na qual não se podem meter os poderes privados, incluindo o grande capital, o poder dos grupos económicos. E isso aplica-se a diversas componentes - aos trabalhadores, aos jornalistas directamente. É um direito! A sua diferença também deve ser apresentada por isto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, Srs. Deputados, em Portugal não haverá nunca a «lei da decência» aprovada no Irão. Aqui ninguém dirá que pintar os lábios com batôn, os olhos com rimei, ou, de uma forma provocatória, qualquer parte do corpo é «punível com 74 chicotadas»! Disso estamos completamente livres! Com a inclusão do direito à diferença expressamente ou sem ele.' É isto que flui da Constituição da República.
As pessoas que na Lousa vivem a sua vida, típica e especial, continuarão a vivê-la com cobertura constitucional; os nómadas, os ciganos com os seus hábitos peculiares, continuarão a ter todos os direitos, mas não haverá nenhum direito para que sejam discriminados por força das suas opiniões, da sua natureza e da sua etnia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Aqueles que têm crenças esotéricas continuarão a tê-las desde que não procurem fazer lavagem de cérebros e violação de consciências, o que se aplica a certas seitas parasitárias, a que um jornalista doutamente chamou «parasitas de Deus». Isso continuará fora da Constituição (como está fora da Constituição) e nenhum direito à diferença se traduz nisso. Não é o direito à esquizofrenia, Srs. Deputados! Nem é o direito à exibição estrita e arrogante de práticas íntimas assumidas pelos cidadãos, intimamente e como próprias. Não é disso que se trata aqui, nem nunca se tratou!
Temos razões, no entanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, - e com isto terminarei -, para nos congratularmos. A liberdade de se ser o que é, que é um eminente valor constitucional, continuará a ser, e este debate foi útil porque parece haver um consenso. Assim o PSD, na prática, não violasse certos direitos e respeitasse o direito de todos a sermos diferentes!

Aplausos do PCP e protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Estão inscritos para pedir esclarecimentos o Srs. Deputados Costa Andrade e Natália Correia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, segui com atenção e com relativa concordância a sua intervenção. Também eu, à semelhança do Sr. Deputado - de resto já tentei demonstrá-lo por mais de uma vez -, penso que a Constituição vigente já consagra aquelas dimensões do direito à diferença com a consistência susceptível de serem erigidas em Direito Constitucional. Aliás, pela minha parte, também tentei, em algumas intervenções, demonstrar as dificuldades de carácter hermenêutico a que o Sr. Deputado se referiu, e eu não faria esta pequena intervenção a título de pedido de esclarecimento se uma tão inoportuna, quanto infundada, referência ao Partido Social-Democrata no final da sua intervenção não viesse, de certa maneira, apartar desnecessariamente as águas e obrigar de certo modo a criar um clima de conflitualidade num caminho que temos vindo a percorrer com relativa consensualidade até aqui. Tudo visto, Sr. Deputado, quem o ouviu fazer este elogio à diferença, quem o ouviu tecer estes louvores às formas de dispersão e de diversificação sub e contracultural que existem na sociedade portuguesa fica extremamente espantado quando a seguir lê uma proposta como a apresentada pelo PCP, dois artigos a seguir.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Qual é a proposta?

O Orador: - Sr. Deputado, quando hoje em Direito se fala em direito à diferença tem-se fundamentalmente em vista o direito de a pessoa recusar os modelos sociologicamente impostos, mesmo os modelos que têm atrás de si a legitimidade de um certo Estado. Ora, quando o PCP no espaço de três artigos, apresenta uma proposta...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Qual é essa proposta «horrível» do PCP!?

O Orador: - Vou lê-la já, Sr. Deputado!

.... quando a seguir o Sr. Deputado brinda esta Assembleia com uma proposta que, ao pé da letra, não é outra coisa do que a versão actualizada daquilo que, sob forma imaginária, procurei denunciar como a «Laranja Mecânica» permanentemente actualizada; quando o Sr. Deputado relativamente a três artigos a seguir faz esta proposta de que «as penas e as medidas de segurança privativas ou restritivas de liberdade têm como fim primordial a reinserção social dos deliquentes»; quando o PCP faz isso, Sr. Deputado - e este é um dos tópicos onde com maior propriedade e com maior urgência o problema da diferença se põe -, o Sr. Deputado quereria criar um subsistema dentro do sistema social, que é o sistema penitenciário e o sistema da execução das penas, em termos tais que quem quer que ali tivesse entrado teria de sair segundo o modelo uniformizado daquilo a que o Sr. Deputado, chama a reinserção social. Não há proposta que seja hoje mais contestada em nome do direito à diferença, Sr. Deputado! Se o direito à diferença tem hoje actualidade e relevo nos verdadeiros fóruns internacionais, um dos tópicos é precisamente este, para o qual o PCP se revelou tão cego e tão indiferente.

Aplausos do PSD.