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11 DE -MAIO. DE 1989

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Dou, pois, por terminada a discussão do artigo 74º. e esclarecidas as propostas que estão em votação.
Nestes termos, encontra-se em debate o artigo 75º. e, para uma intervenção, concedo a palavra ao Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, pedi a palavra para, ao abrigo de uma praxe que tem já alguns precedentes, e se não houver oposição de nenhuma bancada da Câmara, solicitar a troca do artigo 75.º Portanto, passaríamos ao debate dos artigos 76.º e 77.º, retomando o artigo 75.º no fim do debate sobre os direitos fundamentais e antes de entrarmos na parte relativa à organização económica.

0 Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por aquilo que observo, há consenso na aceitação da proposta do Sr. Deputado Costa Andrade. Nestes termos, está em discussão o artigo 76.º

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Evoco, às 23 horas e 15 minutos de hoje, uma efeméride que a Câmara não teve oportunidade, noutras circunstâncias, de memorar honrada e veementemente. Refiro-me a 17 Abril de 1969; à greve estudantil que, na sequência de um impressionante movimento de massas, se designou por «Coimbra-69» e foi, efectivamente, um dos meios mais esclarecidos de combate ao regime ditatorial fascista, de defesa de perspectivas para a democracia em Portugal e, desde logo, para uma universidade diferente.
Evoco através de uma frase simples, porventura não fielmente reproduzida, que constava de um comunicado que circulou de mão em mão e que faz parte do imaginário daqueles que como eu partilharam esse tempo, escrita por alguém que está nesta Sala: «Muitos foram os companheiros de berlinde que ficaram pelo caminho e e agora não estão ao nosso lado nos bancos da universidade.»
Alguma coisa repercute, cá do fundo da memória, na defesa de um projecto que continua inteiramente vital, na pluralidade das opções, e que se traduz, que se consubstancia no acesso tanto quanto possível amplo e total, dos portugueses, em função das suas qualidades, à escola, à escola superior, a um curso superior e àquilo em que ele repercute, não apenas no imediato da vida pessoal, mas também na circunstância colectiva e na vitalização das sociedades.
A celebração desse acontecimento vivaz não me merece palavras apenas de nostalgia, nem sobretudo de saudade; antes pelo contrário - a certeza de que valeu a pena ter feito 1969 para que outros momentos viessem e de que vale a pena, hoje, continuar a lutar por horizontes menos constrangidos, por futuros que sejam capazes de desbravar os trilhos que se antolham ainda difíceis diante da nossa esperança.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito da universidade, relembrou-se aqui, e bem, um momento particularmente agudo e importante de crise da universidade portuguesa que ficou conhecido na história como «Coimbra-69».

Também eu estive activamente nessa crise, também eu participei, à minha medida e dentro das minhas possibilidades, nessa luta e também eu posso de certa maneira dizer que «se os homens de hoje são capazes de destruir o presente e o futuro da loucura do holocausto permanece intocável e salva a imortalidade objectiva dos mortos, isto é, podem-nos roubar o futuro da vida a viver, mas nunca o passado da vida com o seu potencial futuro que, salvo da ameaça, pode-se tornar rememoração salutar em tempo de penúria».
Estas palavras que me permiti recordar devem-se
também a um homem de Coimbra: o filósofo Miguel
Baptista Pereira.
Naturalmente que nós poderemos questionar sobre a adequação da evocação de 1969 a propósito da discussão, em sede de Revisão Constitucional, do estatuto constitucional da universidade. No entanto, o momento parece-nos perfeitamente adequado, agora que passam precisamente sete séculos sobre a fundação da primeira universidade.
_Com efeito, a 12 de Novembro de 1288, 27 abades e priores de outros tantos conventos dirigiram ao Rei D. Dinis uma petição no sentido de que dotasse com os Estudos Gerais a nobilíssima cidade de Lisboa. E, em 1 de Março de 1290, D. Dinis escreveu a carta que institucionalizava a universidade que viria depois, em 8 de Agosto de 1290, a ser de certa maneira sancionada pela conhecida bula do Papa.

Também eu, Sr. Presidente e Srs. Deputados, vivi com experiência própria a crise de 69, embora não nos lugares de direcção e de liderança, os quais se encontravam felizmente bem entregues a uma plêiade de dirigentes, de que é justo destacar o actual deputado Alberto Martins, então presidente da Associação Académica de Coimbra, que, numa liderança de grande justeza estratégica, soube adoptar os esquemas de luta às condições de vida e de cultura da cidade de Coimbra, logrou levar para a frente aquilo que viria a ser um dos maiores movimentos de massas estudantis e um dos maiores abalos do regime no campo cultural e do ensino.

Como já referi, eu não era um líder. Pertencia, pelo contrário, àquilo a que na gíria se chamava «as massas». Porém, essa postura dava-me um certo privilégio, porquanto não tinha, em relação ao futuro, uma certa concepção finalista; a minha luta ou a luta daqueles que estavam comigo não se orientava em relação a um certo futuro. Era mais a luta da revolta contra as condições, do que a luta em nome de alguma coisa.

O que queríamos não era um futuro a construir, sobre o qual não tínhamos ideias concretas. Sabíamos apenas que queríamos democracia, participação e o fim de certas condições de opressão.

Connosco estavam também muitos professores: Paulo Quintela, Orlando de Carvalho, Ferrer Correia, Eduardo Correia, Figueiredo Dias e tantos outros que faziam das suas lições formas subtis mas verdadeiramente implacáveis de demolição do ordenamento jurídico-constitucional em que assentava o regime.