20 DE OUTUBRO DE 1989 109
Nenhuma destas reservas e diferenciações que claramente enunciamos nos impede de votar favoravelmente a moção de censura, uma vez que esta, para além dos fundamentos em que convergimos, nos oferece o ensejo de darmos expressão institucional à frontal oposição do PCP ao Governo PSD, do Primeiro-Ministro Cavaco Silva.
São cinco essencialmente as razões desta oposição.
Em primeiro lugar, o PCP opõe-se frontalmente ao Governo do PSD porque, como prova a sua actuação, este Governo não se pauta, ao contrário do que apregoava, pela defesa dos interesses nacionais e da maioria da população portuguesa, mas está ao serviço dos interesses de uma minoria de grandes capitalistas e latifundiários e das clientelas políticas da direita. A prática política confirmou, o que aliás o Primeiro-Ministro já havia confessado, que a estratégia determinante da presente acção governativa é a reconstituição dos grupos económicos monopolistas. No momento, adquire particular relevo na concretização desta política a privatização das empresas públicas que dão maiores lucros (e não daquelas que são pesadas para o Estado) e as novas e escandalosas propostas de lei das privatizações e de revogação da Lei cia Reforma Agrária, através das quais o Governo pretende passar a uma nova fase qualitativa do esbulho dos 'bens do Estado a favor de grandes interesses privados.
Vozes do PCP: - É um escândalo!
O Orador: - Em segundo lugar, o PCP opõe-se frontalmente ao Governo de Cavaco Silva porque, como prova a sua actuação, este Governo desrespeita os direitos da oposição e a legalidade democrática, conduz uma política de afrontamento do sistema político e das instituições democráticas, de tentativa de governamentalização e partidarização do aparelho do Estado, de centralismo, de controlo e instrumentalização a seu favor da comunicação social do sector público, eliminação e contenção das liberdades e direitos dos cidadãos, de autoritarismo e incapacidade de diálogo com a sociedade. No momento presente adquirem particular gravidade as tentativas do Governo, conjuntamente com a sua bancada parlamentar, para se furtar à fiscalização daí Assembleia da República, pervertendo as comissões parlamentares de inquérito, obstruindo toda a iniciativa parlamentar que não lenha proveniência governamental, paralisando ou entorpecendo as comissões especializadas permanentes. São igualmente graves as tentativas de controlo e enfraquecimento do poder local através da nova lei da tutela, do bloqueio obstinado ao avanço da regionalização, do aumento dos encargos que recaem sobre as autarquias, sem que lhes sejam facultados os adequados meios. Assumem as raias do verdadeiro escândalo a manipulação e a instrumentalização da comunicação social do sector público, especialmente da RTP e da RDP, nas campanhas propagandísticas do Governo e dos objectivos eleitorais do PSD.
A terceira razão da oposição frontal do PCP ao Governo PSD de Cavaco Silva reside na comprovada incapacidade deste Governo para resolver os grandes problemas económicos e sociais do País e de, em vez disso, agravar muitos deles, não aproveitando uma conjuntura externa, prolongada e excepcionalmente favorável, para assegurar o desenvolvimento do País e provocando, ao contrário, a degradação das condições de vida da população laboriosa. Assumem particular gravidade, neste momento, o estrondoso falhanço governamental no controlo da inflação, o aumento da dívida pública, o agravamento dai balança comercial, sem que se verifique a melhoria da especialização produtiva. Ao mesmo tempo, piora a distribuição do rendimento nacional em detrimento do trabalho, baixam os salários reais pelo duplo efeito da derrapagem da inflação e da fixação de tectos salariais, e as reformas e pensões, apesar de serem em regra muito baixas, não tiveram no ano corrente, até agora, qualquer aumento intercalar. Assume proporções cada vez mais assustadoras a precarização do emprego, especialmente agravada com a entrada em vigor da iníqua lei dos despedimentos. Paralelamente, o ensino não avança, a saúde degrada-se, o problema da habitação é cada vez maior. A sociedade portuguesa resultante da governação cavaquista exprime-se através da persistência e do alastramento das chocantes zonas de pobreza e de profunda miséria, a par da crescente e revoltante ostentação do luxo desmedido e imoral. Tudo isto explica a extrema agudização da conflitualidade e da instabilidade sociais, desmentindo, de forma clamorosa, as promessas de estabilização e de paz com que o Governo se apresentava ao eleitorado em 1987, e cativou, nessa altura, uma grande votação dos Portugueses.
A quarta razão da oposição frontal do PCP ao Governo Cavaco Silva reside na comprovada incapacidade deste Governo para assegurar um projecto autónomo de desenvolvimento do País no quadro da integração na CEE, submetendo aspectos- centrais da política portuguesa a interesses estrangeiros, conduzindo a graves limitações da independência e soberanias nacionais.
Adquire particular gravidade para o presente e o futuro do País a aceitação passiva, por parte do Governo, na CEE de uma divisão internacional do trabalho que visa tornar a economia portuguesa um mero apêndice da economia dos países mais desenvolvidos. Torna-se alarmante a apropriação pelo capital estrangeiro das empresas e do solo nacionais, sem que tal signifique investimento produtivo, mas apenas a dominação da nossa frágil economia pelas multinacionais. As privatizações desencadeadas pelo Governo são hoje, crescentemente, o principal factor de aceleração e agravamento deste processo, como prova a privatização da Aliança Seguradora, sem que se vejam medidas credíveis, além de palavras balofas, para alterar a situação, salvaguardando os interesses e a dignidade do País.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O PCP opõe-se frontalmente ao Governo PSD de Cavaco Silva, esta é a quinta razão, porque, como prova a experiência, este Governo, lançando a náusea e o desrespeito ao que é público, tornando o apadrinhamento das clientelas e dos afilhados, o abuso do poder e a irresponsabilidade em comportamentos comuns, produz o caldo de cultura onde florescem as ilegalidades, as irregularidades, as arbitrariedades e a própria corrupção.
A preversão das comissões de inquérito da Assembleia da República, por parte do PSD, para impedir o esclarecimento da verdade e a simplicidade com que um membro, do Governo invoca o desaparecimento de documentos do seu gabinete para não justificar determinadas acusações são manifestações recentes e extremamente preocupantes de que o Governo não se quer dar conta do grave clima que a sua actuação sem transparência está a criar no País.