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2 DE NOVEMBRO DE 1989 265

para não deturpar o seu espanhol): "A verdade não é minha nem é tua, vamos ambos buscá-la."
É fundamental que isto exista. A verdade tem de ser encontrada através de uma actividade plural. Ora este conselho nacional é realmente o caldo de cultura de uma problematização que até agora escasseava.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: -Faça favor, Sr. Deputado. Estamos a começar o diálogo! Vê que está a dar resultado ...?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Deputado, julgo que V. Ex.ª está a fazer um pouco de confusão sobre a ética e a verdade. É que não estamos, neste debate, a discutir qualquer verdade, porque tal é impossível, pois a verdade de amanhã é o erro de hoje. Na ciência a verdade obtém-se através dos erros que deixaram de ser erros para amanhã serem verdades. Não há verdades científicas, pois se as houvesse não haveria progresso.
Como diz o Prof. Adriano Moreira, nestas coisas a ética anda sempre atrás da ciência, isto é, não há um compasso entre ambas. Ora a verdade da ciência é indesmentível; quando a ciência é ciência, é mesmo verdade, pois não há duas verdades!
O que V. Ex.ª quer dizer é que a ética pode ser diferente para um cristão, para um islâmico, para um hindu ou para um ateu. Porém, dizer que há duas verdades e que há que as balançar é que não me parece muito exacto ...

O Orador: - Essa é uma questão de palavras. O Sr. Deputado chama "verdade" àquilo que eu chamo "ética". Trata-se de uma questão meramente terminológica. Penso que não há qualquer confusão. O Sr. Deputado é que a estabeleceu em relação ao meu padrão de terminologia, porque tem outro diferente.
A verdade é um conjunto de conceitos, de valores e de pontos referenciais que adoptámos e que se poderá chamar ética, chamar verdade, chamar fundo comum ou que se poderá chamar outra coisa qualquer. Mas realmente o termo mais dignificado e mais apto a qualificar esta realidade será o de ética, e esta tenderá sempre a aproximar-se tanto quanto possível da verdade.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Mário Raposo, peco-lhe que termine.

O Orador: - Sr.ª Presidente, não tive culpa de que a verdade do Sr. Deputado Narana Coissoró não coincidisse com a minha ética, e vice-versa.
Quero dizer ainda que foi um debate extremamente útil, que revelou as virtualidades de um Parlamento, o que também é uma coisa muito importante, porque um Parlamento não é só um órgão de conflito, um centro de duelos, um centro de contraposições. Nele também poderemos tentar encontrar por vezes a autenticidade das soluções consensuais, porque cada um de nós tem sempre a verdade, nenhum de nós vem para cá tentar inculcar alguma coisa que não seja verdade, mas por vezes as nossas próprias verdades estarão mais distanciadas do que neste caso. A nossa verdade aqui é, no fundo, o homem!'
É por ele que lutamos. Pela sua vida, pelo seu futuro, que, no fundo, é o futuro da humanidade!

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferraz de Abreu.

O Sr. Ferraz de Abreu (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: As ciências da vida, que desde tempos imemoriais atraíram os maiores espíritos de cada época, registaram um desenvolvimento notável a partir de meados do século XIX, desenvolvimento que se tornou espectacular nos últimos decénios.
É que ao estudo da vida através dos órgãos e das funções sucederam-se as incursões dos investigadores no microcosmos celular e molecular, com resultados que suplantam em importância a contemporânea pesquisa espacial, pela luz que têm lançado sobre a natureza e a essência dos fenómenos vitais. Mas a supremacia destas investigações é ainda mais acentuada pelas perspectivas que estão a ser criadas quanto ao nascimento de um novo poder, que pode influenciar para o bem ou para o mal a vivência do homem e a história da humanidade, conforme o uso que dele venha a ser feito. Daí os sentimentos contraditórios que estão despertando e que teólogos, médicos, psicólogos, juristas e sociólogos tentem deliberar sobre a definição dos parâmetros de uma nova ética e da regulamentação jurídica a que deverão subordinar-se tais investigações.
Os conhecimentos já adquiridos são tão inovadores e aumentam a uma cadência tão rápida que obras valiosas de divulgação como O Homem, Esse Desconhecido, de Alexis Carrel, best-seller dos anos 50 e lido com encanto por várias gerações, estão hoje totalmente ultrapassadas e apenas conservam o mérito da sua contribuição para a história da ciência.
Os nossos conhecimentos em áreas como as da hereditariedade e da engenharia genética, da fecundação artificial, da cultura de tecidos m vitro, da imunologia e transplante de órgãos e da biotecnologia estão não só a aumentar o arsenal terapêutico posto à disposição dos médicos, mas estão também a possibilitar a supressão, pela prevenção ou pela cura, de malformações e de doenças ligadas ao património genético do homem que até agora se transmitiam ininterruptamente de geração em geração.
Mas a aplicação destas técnicas não tem sido pacífica e é frequente cruzarem-se as vozes dos seus entusiastas defensores com as dos que as condenam por alterarem as leis naturais e pelos malefícios que delas podem advir.
Embora de modo superficial e com a mirada de um médico, abordemos algumas das mais controversas.
Pode dizer-se que um dos sinais de partida para a escalada dos conhecimentos no campo da genética foi dado por Mendel, ao descobrir as suas famosas leis da hereditariedade e a existência dos caracteres dominantes e recessivos.
Depois, a descoberta dos cromossomas, onde se localizam os genes, que são o sustentáculo dos caracteres hereditariamente transmitidos, e a descoberta das moléculas de ácido desoxiribonucleico -o conhecido ADN - como substracto bioquímico dos genes deram lugar à genética molecular, e com ela ao avanço espectacular a que se está assistindo e que abre perspectivas promissoras nos campos da medicina, da indústria e da agricultura.