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456 I SÉRIE-NÚMERO 15

a perspectiva correcta deve ser a de considerar o universo, o sistema, porque é aí que radicam os vícios apontados.
As consequências no campo económico e financeiro das deficiências e erros do sector empresarial do Estado foram a estagnação tecnológica e organizativa, o marasmo na produtividade, a falta de inovação e a diminuição do investimento, a acumulação dos resultados negativos. O Estado, através do enorme incremento da dívida pública, suportou as repercussões dos maus resultados financeiros. A sociedade portuguesa, por sua vez, registou, em geral, na falta de progresso e nas perdas de oportunidades de aumento de riqueza, os custos do mau funcionamento do sistema.
A uma escala, apesar de tudo, mais reduzida, reproduziram-se em Portugal, no sector empresarial do Estado, as mesmas falências que são agora tão veementemente denunciadas nos diversos países do Leste Europeu e na própria União Soviética -por forma, aliás, tão comovente como temos tido oportunidade de testemunhar na televisão -, varridos que estão, pelos ventos da Perestroika, o leninismo e o estalinismo asfixiadores da liberdade.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa Constituição, que, num primeiro momento, acolheu, ao lado do princípio democrático e das suas concretizações, o princípio colectivista marxista, tardou em reconhecer o falhanço total dos desideratos revolucionários da construção de uma sociedade socialista segundo o modelo de Leste, com direcção central e planificada da economia e apropriação colectiva dos principais meios de produção, solos e recursos naturais.
A revisão de 1982, importante que foi, quedou-se pela extirpação do Conselho da Revolução e dos elementos espúrios à organização e funcionamento de um sistema político pluralista. Foi só depois de nos tornarmos membros de pleno direito da Comunidade Económica Europeia, com a revisão constitucional de 1988-1989, que ultimámos, em Junho passado, que a Assembleia da República, no exercício de poderes constituintes, praticou o acto verdadeiramente histórico e de superior importância política de declarar a caducidade do princípio socialista colectivista e daí extrair as necessárias conclusões. Uma das mais importantes é, certamente, a da possibilidade da reprivatização da titularidade ou do direito de exploração de meios de produção e outros bens nacionalizados após 25 de Abril de 1974, conforme dispõe o artigo 85.º, n.º 1, da Constituição. Essa reprivatização - diz o mesmo artigo - só poderá efectuar-se nos termos de lei quadro aprovada por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções. O artigo 296.º da nossa Lei Fundamenta], por seu turno, vem referir os princípios fundamentais que deverão ser observados na citada lei quadro.
É em prosseguimento da direcção apontada pela revisão constitucional de desmontar o caduco edifício erigido pelo processo revolucionário de 1974-1975 e de dar concretização e cumprimento aos artigos 85.º, n.º 1, e 296.º da Constituição, que o Governo apresenta a proposta de lei n.º 121/V e o Partido Socialista o projecto de lei n.º 441/V, agora em apreciação e discussão, na generalidade, neste Plenário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É desde logo fundamental nessa discussão sublinhar que, com a aprovação da lei quadro sobre as privatizações, em complemento da revisão constitucional, não se consuma apenas uma importantíssima vindicta histórica sobre o 11 de Março. O acto que iremos praticar assume, para além disso, e em termos objectivos, um transcendental significado filosófico, cultural e político para o nosso futuro, como sociedade de homens livres, sociedade pluralista e progressiva que queremos ser. Com a revisão de 1988-1989 e com as leis que a implementam na legislação ordinária - das quais esta lei quadro é uma das mais relevantes - modifica-se a posição da pessoa e da sociedade civil face ao Estado.
Com a possibilidade de privatizar o que os mandatários do poder político do cidadão entendem dever ser privatizado, não se trata, com efeito, apenas de reparar um erro ou uma injustiça cometida, ou de corrigir, em termos tecnocráticos, as deficiências de um modo de produção.
A opção pelo sistema regra de competitividade baseada no mercado representa um acto de confiança na capacidade criadora do homem, na sua liberdade, no seu sentido de responsabilidade. Devolve ao círculo de decisão da pessoa, à sua autonomia, largos sectores de actividade social que estavam subtraídos à sua acção.
Antes da revisão de 1988-1989, a concepção do mundo e da vida dominante na Constituição presumia a superioridade e a natural bondade da acção do Estado em cotejo com a actividade dos particulares. Era assim, por exemplo, nos domínios da comunicação social, da saúde, do ensino, da segurança social e, naturalmente, no campo económico. A iniciativa privada era, em princípio, concebida como intrinsecamente negativa, qualificada como parcial, defensora de interesses prejudiciais ao bem comum, geradora de injustiça ou qualquer outro malefício. Só a muito custo esta verdadeira inversão do ónus da prova podia ser superada pela demonstração da pureza de intenções ou da valia da actividade desenvolvida.
Assistia-se, assim, à paradoxal situação de o cidadão ser exaltado nos seus direitos de liberdade e de participação política, mas ser afectado de uma capitis diminutio na sua actividade criadora de riqueza e na sua acção profissional. Agora, com a revisão constitucional de 1988-1989, é restituída à sociedade civil o que a esta deve caber.
As privatizações constituem, porém - é bom não esquecer -, apenas uma peça, embora decisiva, de uma estratégia de renovação e de progresso que há que encontrar e definir para que a sociedade portuguesa se desenvolva e progrida. Permitem, em síntese, que o Estado social de direito ultrapasse alguns dos obstáculos que o debilitavam e se afirme nos seus valores fundamentais de respeito pela pessoa humana, justiça e bem-estar. Mas um longo caminho há ainda a percorrer.
Existe, por parte de alguns, a ideia de que esta nova forma de situar o homem perante o Estado em Portugal é, sobretudo, senão exclusivamente, favorável aos empresários e que os trabalhadores seriam prejudicados por perder a protecção e as regalias de que até agora gozavam. Esta tese é, evidentemente e por razões óbvias, sufragada, acarinhada e particularmente exagerada pelo Partido Comunista.
É preciso, porém, dizer frontalmente que esta percepção se nos afigura, a nós, sociais-democratas, sem fundamento e profundamente errada.
A experiência vivida por outros países da Comunidade Económica Europeia ou além-Atlântico - nos Estados Unidos e no Canadá, por exemplo - demonstra bem que quem aposta no homem e na sua capacidade de realização projecta uma sociedade mais aberta à inovação e ao progresso. Não consta que os trabalhadores e a população em