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472 I SÉRIE - NÚMERO 15

económico, tecnológico e social existente no País, se é um acto de coragem política, exige também, ele próprio, muita transparência e muita responsabilização pelas decisões tomadas, que, salvo melhor opinião, não podem ser obra de um governo ou de um partido. Estamos perante um acto que exige plena responsabilização e participação de todos e que ninguém, qualquer que seja a sua posição no processo, deve impedir ou obstaculizar.
É do interesse do próprio Governo criar todas as condições, evitando o mínimo de suspeições, para que este processo seja o mais transparente e credível possível, tudo devendo fazer para que ele traga os maiores benefícios para o País e para o povo português. À Assembleia da República e à oposição, em particular, deverá caber o ingrato papel de, com os poucos elementos de informação disponíveis, fiscalizar o processo de privatizações, depois de, num diálogo aberto e franco, ter contribuído para enriquecer, clarificar, enquadrar e tomar mais operativas as normas que irão presidir ao processo das privatizações.
No processo de privatizações, que agora se pretende retomar em bases completamente novas, decorrentes do novo enquadramento constitucional, não pode haver vencedores nem vencidos: o que está em jogo é o interesse nacional. À Assembleia da República caberá a grande responsabilidade de procurar o justo equilíbrio quer na elaboração desta lei, quer no quadro fiscalizador que lhe deverá estar subjacente e fazer pane integrante do quadro normativo que agora está a aprovar.
O próprio facto de o PSD e o PS terem dado acolhimento, em sede de revisão constitucional, a um simples preceito de maioria para a aprovação de uma lei verdadeiramente estruturante da economia e da sociedade portuguesa mais evidencia a responsabilidade da Assembleia da República na elaboração desta lei e na sua subsequente fiscalização.
O que é curioso é que, se a proposta de lei e o projecto de lei apresentam alguma semelhança, sobretudo ao nível dos critérios que utilizam para materializar as opções que lhes estão subjacentes, divergem bastante na clarificação desses mesmos critérios. Àquilo que parece ser, em certos aspectos, uma excessiva pormenorização do projecto de lei na explicitação das principais normas do processo de privatizações sobrepõe-se o carácter vago e por vezes impreciso da proposta de lei, diríamos mesmo obcecadamente vago, remetendo para legislação posterior e procurando dar ao observador menos atento a ideia de que cada privatização é um caso particular. Poderia sê-lo, mas os princípios terão de ser os mesmos: a defesa intransigente da economia nacional e do património, que é de todos os Portugueses e que em caso algum ou pretexto não pode ser mal alienado.
Diríamos que ao Governo, pelo facto de o ser, lhe assiste o direito de tudo esconder, utilizando sempre a mesma falácia de que, até por o ser, tudo sabe e sempre age no interesse nacional, e à oposição o de assumir o seu papel de permanente agente de fiscalização da actividade do Governo, face aos erros que este incessantemente comete.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em nosso entender, não existem contradições insanáveis entre a proposta e o projecto de lei, mas existe, sim, uma lacuna de filosofia e de objectivos que se relacionam com o equacionar do processo de privatizações na economia e na sociedade portuguesa.
Não basta dizer que as privatizações se inserem na linha de «libertação da sociedade civil», que vão reduzir o peso do Estado na economia, que vão ajudar a disseminação do capital a alienar, que vão permitir a constituição de grupos empresariais nacionais capazes de concorrer com os congéneres estrangeiros ou que vão transformar, como já se ouviu, trabalhadores em capitalistas.
A grande lacuna que a proposta e o projecto de lei não explicitam é a de como e através de que garantias é que as privatizações vão ser úteis à modernização da economia portuguesa, ao fortalecimento das empresas, à diversificação sectorial e à diminuição da dependência da nossa economia.
Está aqui a grande responsabilidade que pesa sobre aqueles que, de uma forma directa ou indirecta, vão alienar um vasto capital acumulado ao longo de muitos anos e que é, sem dúvida, o maior e mais potente instrumento de política económica global e sectorial que alguma vez esteve na mão de um governo. E esta é uma responsabilidade a que o Governo não se pode furtar, nem mesmo os deputados que de uma forma directa ou indirecta participarem na elaboração desta lei. É isto que importava também e, por que não, sobretudo, discutir, é isto que pode passar ao lado desta discussão.
Diz o Governo que com esta proposta de lei se quer ir mais além, mas, infelizmente, sobre este aspecto, fica-se com a ideia de que ir mais longe é passar de privatizações a 49% para privatizações a 100%.
Provavelmente, e de uma forma inconsciente, estamos a prolongar a discussão que pairou na revisão constitucional: discutimos critérios, maioria absoluta, maioria qualificada, limites de subscrição, subscrição pública, concurso público, mas não discutimos a filosofia, os objectivos e sobretudo o que pode ganhar a economia e a sociedade portuguesa com as privatizações.
Salvaguardadas as questões atrás referidas, haverá que referir que o Partido Renovador Democrático - e nem creio que possam existir dúvidas - é claramente pelo processo de privatizações, porque pensa que ele é benéfico para a economia e sociedade portuguesas.
Não será aqui lugar nem tempo para chamar à discussão algumas das posições que defendemos em sede de revisão constitucional e que, infelizmente, não encontraram eco no PSD e no PS, mas entendemos que existe um conjunto de questões que são fundamentais para a transparência do processo e para o êxito de um processo, que desejamos tão alargado quanto possível, no espaço, no tempo e no cidadão português, independentemente do seu posicionamento no sistema produtivo.
Em primeiro lugar, um processo com as características do processo de privatizações, que vai influenciar de forma decisiva a economia portuguesa e irá movimentar centenas de milhões de contos, não pode ser obra exclusiva de um ministro das finanças, de um governo, por muito infalíveis que o sejam (e, infelizmente, já vimos que o não são), por muito transparentes e sóbrios que sejam os seus métodos de actuação. Este processo só pode ser acompanhado, participado e fiscalizado pela Assembleia da República.
Compreendemos que o Governo seja omisso nesta matéria na sua proposta de lei, mas consideramos que tal postura é politicamente inaceitável e propiciadora das mais severas críticas. A lei que sair desta Assembleia deverá consagrar, nos termos que explicitei, o papel da Assembleia da República no processo de privatizações.