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1080 I SÉRIE - NÚMERO 30

forma de lei à Alta Autoridade para a Comunicação Social. Na minha perspectiva, isto seria o lógico, mas, como há segredos que, às vezes, não conseguimos desvendar, pergunto qual é a razão para, na sua lógica, o projecto de lei que apresentou dever preceder um outro.
Segunda pergunta: no projecto de lei a televisão - e, quanto a mim, bem, não tenho crítica ou reparo a fazer - prevê a cobertura geral (que se poderia chamar nacional, regional e local), mas não indica, não tem qualquer sinal, acerca da precedência ou da prioridade nas concessões. Parece, à primeira vista, que seria a cobertura geral que corresponderia mais ao interesse colectivo e, portanto, que deveria aparecer primeiro. Mas também pode defender-se que seria a cobertura local, que está mais próxima das populações e que, portanto, seria a que previamente deveria ser estabelecida.
Seja como for, coloco-lhe agora uma pergunta, de estratégia, já que a primeira foi sobre a oportunidade. E a pergunta é esta: porque antes o licenciamento da radiotelevisão e só depois a Alia Autoridade? Esta é, repito, uma pergunta de estratégia. Portanto, no seu pensamento, no seu plano de institucionalização da televisão privada ou de abertura da televisão em Portugal, o que é que deve estar primeiro?
Finalmente, uma única pergunta, que vou reduzir em termos muito simples.
Diz o Sr. Deputado que a radiotelevisão constitui um serviço público - e compreendo que isso possa ter sido defendido até hoje; agora, num projecto como o seu, que olha para o futuro, pergunto como é que articula que a radiotelevisão seja um serviço público quando ela vai passar a ser exercida, em grande parte, por empresas privadas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Correia.

A Sr.ª Natália Correia (PRD): - Sr. Deputado Arons de Carvalho, apreciável, no seu conjunto, este projecto de lei sugere-me, contudo, algumas observações, às quais espero que me responda.
Logo no preâmbulo recomenda-se uma maior atenção ao gosto das maiorias. E logo aí me acodem as sensatas palavras do seu camarada António Reis. Diz ele: «A democratização da cultura não pode ser a ditadura do gosto das massas.» Aqui põe-se a questão dos fatais índices de audiência, usados como máquinas censórias que agem subtilmente nas democracias em nome da soberania do quantitativo.
Mas passo a abordar um problema que muito está a preocupar, como deve saber, os sociólogos do áudio-visual.
Quando se pretendia com a privatização da televisão a oferta da diversidade, verifica-se precisamente o contrário: a lógica do mercado apoderou-se do serviço público de televisão, que passou a estar submetido à tirania dos índices de audiência, do que resultou a uniformização do sistema televisivo. Impelido para a competição, o serviço público abandonou a sua competência cultural.
Eis o que há que evitar, reservando ao sector público a obrigação de procurar não a mais-valia financeira, mas a mais-valia cultural, observando rigorosamente o princípio do primado da qualidade sobre os ;índices de audiência.
Ora, nada neste projecto de lei salvaguarda a necessária vinculação do serviço público da TV a uma competência cultural. Fala-se, sim, no capítulo 6.º, na promoção da defesa e difusão da língua e da cultura portuguesas. Uma vaguidade que se esfumará, se não for legislativamente assegurada em termos inequivocamente vinculadores da função da TV pública.
Mas passando à TV privada, no capítulo do licenciamento, nas condições de preferência, figura (e bem!) a exigência de uma maior percentagem de tempo de emissão com programas culturais. Cuidado! Aqui é de exigir uma rigorosa salvaguarda legislativa, porque nestes nossos tempos da cultura inculta, como diz apropriadamente Allan Bloom, tudo é cultura. A cultura do rock, a cultura da droga, a cultura dos bandos da rua, a cultura da moda, a cultura da futilidade e até a cultura dá publicidade. E sob estas múltiplas capas vai-se abafando a cultura, que, segundo este projecto de lei, deve exprimir a identidade nacional.
Finalmente, no capítulo das proibições especiais no âmbito da publicidade, impõe-se-me um reparo: em concerto com o antitabagismo dominante, que quer defender as saúde física das pessoas (desnecessário, e não resisto a dizer isto), enquanto se «marimbam» para milhões de pessoas que morrem de fome neste planeta, proíbe-se a publicidade aos cigarros. Mas, em desconcerto com o que no mesmo artigo 29.º se determina, quanto a não causar prejuízo moral aos menores, esqueceram-se os autores do projecto de lei de incluir nas proibições especiais a exigível interdição da publicidade dos brinquedos bélicos, nefastos para a formação moral das crianças, que, ludicamente, são atraídas para a violência. Porquê esta omissão?
Não acha, Sr. Deputado, quo há que pôr a salvo do diktat publicitário a saúde moral, a par da saúde física?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Raposo.

O Sr. Mário Raposo (PSD): - Sr. Deputado Arons de Carvalho, o meu pedido de esclarecimento tinha em vista fundamentalmente, dar conta da minha concordância global com a iniciativa - e não com a metodologia usada quanto à iniciativa -, mas a Sr.ª Deputada Natália Correia acabou de introduzir uma vertente que me parece extremamente oportuna.
Na realidade, a televisão pode ser, por vezes, pervertida num consumismo de cultura, de uma massificação da cultura.
Eu próprio me dou conta de que, por vezes, quando chego a casa sinto necessidade de ver uma telenovela mal feita, até para me libertar de preocupações mais graves e mais fundas. Não é esse, evidentemente, o critério que deve presidir a uma radiotelevisão, cuja função fundamental e essencial assumida seja a de um serviço público. Portanto, esta vertente cultural, assinalada pela Sr.ª Deputada Natália Correia, tem plena pertinência.
Gostaria de perguntar, liminarmente e em virtude da intervenção da Sr.ª Deputada Natália Correia, qual é a forma de textualizar essa preocupação cultural que tem de estar subjacente quer ao serviço público que fale, como empresa pública de televisão, quer aos operadores privados de televisão.
O segundo ponto tem a ver com uma preocupação que, devo dizê-lo, faz-me assomar um certo sorriso, porque relativamente a cada posição somos tentados a ter uma perspectiva diferente do problema.