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23 DE MARÇO DE 1990 1953

A legislação existente não resolve por si só, especialmente no campo da educação, da cultura e da formação profissional, os enormes obstáculos que continuam a ter de ser enfrentados pelas mulheres.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — A situação da mulher é, entre nós, paradoxal. Socialmente iguais, as mulheres são, por vezes, afastadas, porque o sistema que assegura a igualdade democrática não evita o afastamento face às hierarquias estabelecidas pelo poder democrático.
A organização da vida política e laboral é feita em tomo do homem, sem horário, sem vida privada, sem deveres familiares, afastando assim as mulheres do acesso ao topo da carreira, pois estas são normalmente as responsáveis pelos encargos familiares.
Podemos dizer que é uma aberração da sociedade democrática ter no seu seio indivíduos que possam ser afectados no exercício legítimo do direito ao trabalho e à sua realização em função de razões de natureza discriminatória e não pela lógica natural do mérito de cada um.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para que as mulheres obtenham a igualdade de oportunidades é preciso não só aperfeiçoar, reajustar, completar e desenvolver a aplicação prática do princípio da igualdade, mas também modificar atitudes e comportamentos, formas da vida e estruturas sociais que impeçam as mulheres do livre desenvolvimento da sua personalidade.
O Governo, quando subscreve e ratifica convenções sobre a eliminação de toda a forma de discriminação, tem de comprometer-se a aceitar as condições internas para a realização do princípio da igualdade.
O poder político está, por isso, obrigado a promover as condições que garantam a liberdade do indivíduo e dos grupos em que se integra e a eliminar os obstáculos que impeçam ou dificultem a sua plena participação na vida política, económica, cultural e social.
A vida política, para ser realmente eficaz, necessita de definir objectivos, as acções necessárias ao cumprimento desses objectivos e constituir os organismos encarregados do seu desenvolvimento. O Governo tem, pois, o dever de apresentar soluções globais para garantir a igualdade plena e efectiva ao ordenamento jurídico da família, saúde, educação, cultura, formação profissional, emprego, protecção social e associativismo.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): — Muito bem!

A Oradora: — Todo este tipo de soluções necessárias obrigará a Administração Pública a uma maior intervenção nas questões da igualdade, articulando a Mia acção com as autarquias locais, as organizações sindicais, as organizações políticas e sociais e, com especial relevo, as organizações de mulheres.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos aqui hoje para analisar a situação da mulher em Portugal. Muitos de nós, incluindo algumas mulheres, pensam que isto é uma perda de tempo, porque hoje na sociedade portuguesa não há discriminação, uma vez que há leis que a asseguram e protegem e também porque a nossa cultura tradicional sempre lhe deu um papel interveniente social e cultural.
No entanto, a análise pormenorizada da nossa estrutura social mostra-nos que assim não é. Quando analisamos a situação laboral, verificamos que a mulher atinge os
maiores índices de desemprego, que prolifera o trabalho precário e o subemprego. Esconder estas realidades é, naturalmente, ignorar ou pretender esconder a verdade.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Ainda no passado recente, a 8 de Março deste ano, e de forma insuspeita, a presidente da Comissão da Condição Feminina, no programa televisivo Hora da Verdade, assumiu que a mulher em Portugal era discriminada no emprego, auferia salários precários e atingia os índices mais elevados de desemprego. Neste e noutros sectores da vida portuguesa a mulher continua, assim, a não ser protegida pela legislação, assistindo-se constantemente a desvios não só no sector do trabalho, mas também na protecção à maternidade, na defesa da sua dignidade, no desenvolvimento da personalidade e na protecção aos grupos de mulheres expostos a maiores riscos (prostituição, droga, marginalidade e exploração corporal).
No domínio da fiscalidade a mulher portuguesa é alvo de inaceitável discriminação.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Como pode entender-se que uma elevada percentagem de mulheres, ou seja, a mulher cuja principal ocupação são as tarefas familiares, não seja considerada um indivíduo de dimensão inteira, mas apenas 0,85 do mesmo?

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Explicando melhor: qual a razão para que nos agregados familiares onde a mulher tem uma actividade laboral por conta de outrem o cálculo do IRS é dividido por dois e nos agregados onde o trabalho da mulher é o doméstico é dividido por 1,85, passando a mulher, neste caso, a valer 0,85 de uma pessoa a corpo inteiro?

A Sr.ª Edite Estrela (PS): — É escandaloso!

A Oradora: — Será que a mulher doméstica produz um trabalho socialmente menor, cuja validade é depreciada por uma mentalidade fiscal discriminadora? Ou será que o princípio da igualdade gerou, insolitamente, contra natura, soluções de discriminação negativa uma vez mais?

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista já alertou o Governo para esta aberração que penaliza as famílias e que, acima de tudo, discrimina o que é contrário à nossa lei fundamental. Porque discordamos, e porque já alertámos várias vezes o Governo para este problema, apresentaremos oportunamente uma alteração à lei fiscal que corrija tão grande injustiça.
Sc é certo que a legislação de que dispomos é, no geral, avançada, a sua prática é muitas vezes insuficiente c os mecanismos de fiscalização não funcionam. Há, pois, que criar urgentemente as condições necessárias que lhes cabem de informação e fiscalização.
Não é, por exemplo, com um orçamento que cobre as despesas de manutenção que a Comissão da Condição