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1980 I SÉRIE —NÚMERO 55

Esta conivência de silencio por pane do Governo é que tem permitido o aborto clandestino. A realidade é que as mulheres continuam a abortar! Assim, para tentar ter uma ideia quanto às causas da morte materna devido a complicações por aborto clandestino, andei à procura de estatísticas.
Não é por acaso que as organizações de mulheres defendem a criação de centros de dados para o estudo e a reformulação das estatísticas a fim de poderem ter uma ideia exacta da realidade que as afecta. Ora, neste momento, quanto ao abono clandestino, a realidade é a de que as mulheres caiem nas mãos de abortadeiras que funcionam impunemente mas que, apesar de tudo, constituem um último recurso.
Não vale a pena retomarmos agora a velha discussão sobre o aborto. Pela nossa parte, defendemos o abono como último recurso face a uma gravidez não desejada. Poderemos ter diferenças de opinião em relação a outros partidos, mas, quer concordem ou não com o acto em si, todos os Srs. Deputados têm de reconhecer que, em Portugal, o abono é clandestino e continua a ser praticado com o silencio do Governo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Leonor Beleza (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Leonor Beleza (PSD): — A Sr.ª Deputada Luísa Amorim acaba de acusar-me de conivência e de hipocrisia em relação a práticas que repudio totalmente e que constituem uma exploração das mulheres através do aborto clandestino.
Enquanto titular do Ministério da Saúde, nunca tive qualquer prática de conivência ou de hipocrisia em relação a tais atitudes.
Acontece que, em relação ao acesso das mulheres ao planeamento familiar em Portugal, a Sr.ª Deputada insiste em fornecer-nos números que são completamente falsos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Muito bem!

A Oradora: — Como referi há momentos — não via necessidade de o repetir mas, pelos vistos, as coisas nem sempre são suficientemente ouvidas—, em Portugal existem consultas de planeamento familiar em todos os centros de saúde. Enquanto assumi a pasta da Saúde foram criadas centenas de consultas de planeamento familiar e entendo que é através do acesso generalizado a este que deve ser exercido o direito dos cidadãos a uma maternidade e paternidade conscientes.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Muito bem!

A Oradora: — Hoje em dia, em Portugal, o planeamento familiar é um caso de sucesso internacionalmente reconhecido, há um enorme caminho que foi percorrido neste sentido e lamento imenso que as Sr.ªs Deputadas do PCP queiram continuar a ignorá-lo.
Na verdade, desde os anos de 1976 e 1977, em que, nalguns distritos, não se encontrava qualquer médico disposto a fazer planeamento familiar, até à situação actual, em que todos os centros de saúde dispõem de uma
consulta desse tipo e em que a cobertura do País é superior a 80 %, continuar a querer negar esta realidade e a sua enorme e decisiva influência na diminuição significativa dos números de aborto clandestino é fechar os olhos à realidade.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Oradora: — Diminuiu o número de abortos clandestinos em Portugal. Temos todas as razões para supor que assim é, através da informação de que tem conhecimento o pessoal em serviço nas urgências hospitalares de obstetrícia, onde é dado acolhimento a situações deste tipo.
Não há nenhuma comparação entre os efeitos de tais situações, hoje em dia e noutros tempos.
Quanto ao que diz respeito ao cumprimento da lei, Sr. Presidente, enquanto Ministra da Saúde, nunca persegui nem me imiscuí nas situações de objecção de consciência de qualquer pessoal de saúde para saber se estavam ou não de acordo com a lei sobre a interrupção voluntária da gravidez.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Amorim.

A Sr.ª Luísa Amorim (PCP): — Sr. Presidente, é evidente que não acusei a Sr.ª Ex-Ministra como pessoa, mas sim a política do seu ministério.
Por outro lado, gostaria de esclarecer que tenho dados em minha posse.
É evidente que a política de planeamento familiar não é só mérito do Governo do PSD e que, na verdade, tem sido implementada. No entanto, a forma desta implementação nos centros de saúde levar-nos-ia a grande discussão, nomeadamente quanto ao número de médicos afectos àquelas consultas, embora reconheça que está a fazer-se um esforço no sentido da formação dos médicos de clínica geral quanto ao planeamento familiar.

Vozes do PSD: — Ah! Reconhece-o!

A Oradora: — No entanto, Sr.ª Deputada, não estou aqui para reconhecer o que é positivo mas para dizer que. concretamente, existem dados oficiais, segundo os quais, em 1987, 70 % das mulheres em idade fértil praticavam contracepção, embora não esteja especificado se era através dos centros de saúde. Só que, de entre aquela percentagem, 50 % o fazia através de coito interrompido.

A Sr.ª Leonor Beleza (PSD): — Esses números estão ultrapassados.

A Oradora: — Não estão nada.

Na verdade, em relação a seis distritos nacionais, a própria Direcção-Geral dos Cuidados Primários de Saúde informou que 30 % a 40 % das mulheres inquiridas utilizavam a contracepção, embora sem qualquer aconselhamento médico.
A Sr.ª Deputada sabe perfeitamente que as consultas de planeamento familiar estão a ser feitas graças à muita dedicação de médicos de clínica geral que, também tendo de dar consultas de saúde escolar e materna, obscuram o eventual mérito da política de saúde do Ministério.