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4 DE ABRIL DE 1990 2123

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Secretário de Estado falou de uma pequena minoria da agricultura portuguesa. Preocupa-nos, a nós, socialistas, a agricultura no seu lodo e manifestamos grande preocupação com a evolução do sector. O ano de 1992 aproxima-se a grande velocidade. As alterações da política agrícola para lhe fazer frente, essas, progridem a passo de caracol.
O ano de 1989 foi o melhor ano agrícola de sempre, agora a contagem crescente para o difícil e para a sobrevivência de muitos começou.
O Governo não se pode queixar de falta de solidariedade comunitária; deve é penitenciar-se de não ter tido uma política nacional para o sector, que complemente tal solidariedade.
É conhecida a grande debilidade técnica e económica das nossas empresas agrícolas: de um lado, mais de 80% minifundiárias, sem nenhuma defesa num sistema concorrencial aberto; do outro, uma agricultura extensiva de sequeiro, sempre superprotegida por uma política de preços e um sistema comercial de recolha do Estado, ambas já em desmoronamento.
As empresas familiares com dimensão técnica e económica, pólo dinamizador do sector, são uma minoria, e nestes últimos cinco anos tem diminuído. Hoje, os dados conhecidos levam-nos a concluir que o minifúndio é cada vez mais minifúndio e o latifúndio é cada vez mais latifúndio.
Assim, à beira do maior desafio económico da nossa história, este Governo tem-se servido da solidariedade comunitária, não para robustecer a malha produtiva e diversificar a produção, mas para adiar políticas, como a dos cereais, ou atirar para o cesto dos papéis projectos decisivos para o futuro, como o dos regadios, ou protelando medidas fortes e altamente sedutoras, como a das reformas antecipadas, para a reconstituição do minifúndio em empresas com dimensão suficiente para sobreviverem.
Embalado por um deslumbramento da abundância, graças a uma conjuntura externa favorável, a um Orçamento do Estado cada vez mais pesado nos bolsos dos cidadãos, de fundos comunitários volumosos a brotarem como cogumelos, acrescida das centenas de milhões resultantes das privatizações, gere a conjuntura, adopta a política dos países ricos da Comunidade, esquece as medidas de política nacional correctivas e inovadoras.
Acreditando no milagre da transformação de rosas em empresas agrícolas técnica e economicamente viáveis, segue a política de supermercado: entre e sirva-se dos fundos.
A optimização dos recursos naturais disponíveis, a consolidação e aumento das explorações válidas do ponto de vista técnico-económico, o estudo no enquadramento comunitário das capacidades produtivas específicas da agricultura portuguesa, valorizando as condições de clima e luminosidade existentes e impossíveis de serem transportadas para o resto da Europa, ficam para quando a conjuntura favorável já mio existir.
A Comunidade optou por uma agricultura não produtiva. O seu grande dinamismo em todos os outros sectores permite-lhe tal opção. O tempo dirá se tal política é correcta! Nós, Portugueses, é que não podemos fazer tal opção. A nossa economia e o nosso nível de vida não o permitem.
Sem entrarmos numa agricultura produtivista, agressora do meio ambiente e da qualidade de vida, é imperioso sermos concorrenciais numa produção de qualidade.
Não podemos continuar com uma agricultura minifundiária como complemento das baixas reformas e dos baixos salários industriais e dos serviços ou dos latifúndios baseados na posse da terra.
A esta inércia há a juntar escândalos que não podemos calar.
Como é possível que quatro celuloses dominem já, por compra ou aluguer, mais de 250 000 ha de solo nacional, alguns com a ajuda de fundos, o que provocará, a curto prazo, estarem auto-abastecidas em eucalipto, deixando milhares e milhares de pequenos produtores privados sem mercado ou com as cotações que bem apetecer às celuloses.
Como é possível continuar a deixar aumentar a trituração do eucalipto e, ainda por cima, procurarem recorrer aos fundos em pasta em vez de obrigar a respectiva indústria a produzir papel?
É o mesmo que esmagar as uvas e exportar o mosto, para no estrangeiro ser feito o vinho.
Com é possível deixar expandir desordenadamente a produção de eucalipto, alguns também com a ajuda de fundos, sabendo que é uma produção de conjuntura que não tem nenhuma hipótese de concorrer a prazo com a América Latina ou com a África? A massa lenhosa é menos de metade por hectare/ano do que nessas regiões.
Como é possível aguentar uma política cerealífera com 40 % dos preços acima das cotações internacionais, sem haver um plano de reconversão para toda essa área? O proteccionismo tem os dias contados, mas o futuro dos produtores, esse vai ficar ao sabor das ondas. São centenas e centenas de milhar de hectares que hoje produzem cereais que, a curto prazo, não o poderão fazer, e o Governo, numa inércia total, só para adiar decisões e políticas, vai aguentando um sistema altamente proteccionista contra os interesses futuros da evolução da agricultura portuguesa.
Como é possível manter o sector produtivo mais envelhecido da Europa, sem medidas fortes de rejuvenescimento, criando condições de acesso à terra aos jovens?
Opta-se pela estatística dos 5000 que receberam ajudas para a instalação, mas todos sabendo que em boa parte por lá não ficaram.
Os Regulamentos n.ºs 797, 355, etc., deviam ser mais orientativos. Os 180 milhões de contos dos fundos já distribuídos pela agricultura portuguesa teriam de servir como mecanismos de orientação política da agricultura.
Teriam de ter em conta a especificidade nacional.
O regime de self-service em que funcionam retira-lhes a forte característica estruturante que deviam ter e de que nós precisamos mais do que qualquer outro país da Europa.
Os nossos problemas, infelizmente, são bem maiores do que os dos restantes países da Comunidade: suo 50 anos de atraso!
Os Srs. Ministros e os Srs. Secretários de Estado negoceiam em Bruxelas, esquecendo-se do país real em que vivem.
Os meios, felizmente, graças à conjuntura e à solidariedade comunitária, não faltam; o que escasseia é a capacidade política, o projecto transformador e, acima de tudo, a genica de galvanizar o País, numa situação em que nada falta, só falta a capacidade, a inteligência, a forma inovadora de mudar Portugal.