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6 DE ABRIL DE 1990 2149

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio Martinho.

O Sr. Hermínio Martinho (PRD): - Sr. Presidente, antes de, propriamente, dar início à minha intervenção, gostaria de referir que para este debate, que reputamos da maior importância - não só por tratar da criança, mas principalmente porque a criança é o futuro do nosso país -, o PRD decidiu solicitar à Assembleia da República autorização para uma iniciativa que, penso, não tinha sido ainda tomada nesta Câmara. Tal foi a de proporcionar uma exposição relativa à criança e que se encontra patente no corredor entre o gabinete do Sr. Presidente e a Sala do Senado.
Gostaria, assim, de começar por agradecer à Assembleia, ao Sr. Presidente, aos funcionários que colaboraram, aos repórteres fotográficos (alguns dos quais nos acompanham aqui no dia-a-dia) e às instituições que forneceram a necessária documentação.

Aplausos gerais.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: 31 anos passaram sobre a adopção da Declaração dos Direitos da Criança pela Assembleia Geral das Nações Unidas.
Apesar do tempo desde então percorrido, se não houver uma alteração significativa na situação mundial, segundo dados daquela organização, mais de 100 milhões de crianças morrerão nos anos 90. Interessa, sobretudo, referir que a morte de cerca de metade não resultará de situações de catástrofes ou acidentes com origem no homem mas, sim, de causas cuja eliminação requer meios e acções relativamente insignificantes.
Hoje mesmo, a nível mundial, irão morrer cerca de 40 000 crianças: é, de facto, este o impressionante número médio diário de morte nas crianças! Poderemos dizer, Srs. Deputados, que estes números se reportam, essencialmente, aos países subdesenvolvidos da Ásia, África e América Latina, mas a verdade é que Portugal contribui para estas estatísticas com a taxa de mortalidade infantil mais elevada no seio da Europa comunitária.
De facto, nos últimos anos, a taxa de mortalidade infantil e a de mortalidade perinatal tem vindo a diminuir, mas é igualmente uma realidade que em 1988, com 13 % de mortalidade nas crianças com menos de 1 ano de idade, o nosso país mantém níveis superiores aos verificados em todos os outros da Europa comunitária já em 1986. Nessa altura, com excepção da Grécia, já todos os outros países tinham laxas situadas abaixo dos 10%.
Para além da mortalidade elevada, há a considerar ainda a enorme quantidade de crianças que sobrevivem mas que ficam afectadas, com anomalias motoras, sensoriais ou psíquicas.
Em Portugal, no ano de 1988, por cada óbito perinatal sobreviveram duas crianças com deficiências resultantes da falia de assistência materno-infantil pré, durante e pós-parto. Apenas estes dados permitem ilustrar a pertinência do debate agora iniciado.
Ao promover este debate, o PRD não pretende utilizar a criança como forma de fazer oposição! Tentaremos, por um lado, chamar a atenção para as responsabilidades que cabem ao Governo em áreas como a saúde, a segurança social, a justiça e a educação e, ao mesmo tempo, queremos assumir nós próprios as responsabilidades inerentes à nossa função na defesa e protecção dos direitos e interesses da criança.
Pretendemos, essencialmente, fazer uma reflexão conjunta do pouco que tem sido feito para defender as nossas crianças do abandono, da exploração, da pobreza, da marginalização - situações que, temos de reconhecer, proliferam no nosso país - e avançar também com propostas concretas que possam conduzir à tomada de medidas adequadas para a concretização dos direitos da criança consagrados em diversos diplomas.
Gostaríamos de referir, neste início do debate, o apoio recebido das várias instituições que trabalham com crianças tanto do sector público como, muito em especial, do sector privado, referindo a forma admirável como a maioria dos técnicos e profissionais leva a cabo o seu trabalho na defesa e protecção dos interesses da criança - aliás, esse trabalho é levado a cabo, na maior parle dos casos, em péssimas condições, com fortes l i m ilações físicas e materiais, pelo que não pode nem deve passar sem uma palavra de louvor da nossa parte.
Queremos salientar a acção desenvolvida pelo Instituto de Apoio à Criança, pela Emergência Infantil, pelas instituições particulares de solidariedade social, nomeadamente as misericórdias e outras instituições, e reconhecer o enorme contributo que têm dado para colmatar as lacunas em aberto na prestação de serviços e na protecção aos direitos da criança e da família.
As crianças em Portugal correspondem a 21,5 % da população portuguesa. Não obstante tratar-se de uma faixa etária bastante significativa, a sua representatividade em relação a outros grupos de idade tem vindo progressivamente a diminuir. Ou seja, a população portuguesa, à semelhança do que acontece nos países com maior desenvolvimento económico e social, está a envelhecer em consequência do decréscimo acentuado da mortalidade e do aumento da esperança média de vida.
A essa evolução demográfica, quiçá, em parte, por consequência dela, a temática respeitante à protecção e educação da criança não tem constituído matéria prioritária da política governativa.
Assim, a nível da segurança social verifica-se que o crescimento das despesas com as prestações familiares, bem como as despesas de investimentos com equipamentos para crianças, não tem crescido ao ritmo de outros sectores. Com efeito, em termos percentuais, face ao total das despesas de segurança social, a evolução daquelas tem vindo a diminuir!
No âmbito da educação observa-se que, não obstante a declaração deste sector como área prioritária, as despesas do respectivo orçamento têm sido canalizadas, insuficientemente!, para os graus de ensino posteriores aos níveis de educação pré-escolar e primário. Entre 1981-1985 o peso destes níveis de ensino sofreu um decréscimo de 28 % para 26 %.
Ao nível dos direitos das crianças e dos direitos familiares, se é verdade que a lei portuguesa contempla um elevado número de medidas de protecção da criança e da família, também existe uma cena unanimidade à volta da idade de que a sua regulamentação restringe o espírito e a aplicabilidade da lei, o que contribui para a manutenção de lacunas graves que impedem a prevenção adequada de situações de carência e abandono de crianças.
Mesmo quando não se verificam situações de lacunas legislativas constata-se, frequentemente e em múltiplas áreas, nomeadamente no respeitante ao trabalho infantil ou à lei de protecção à paternidade e maternidade, que por dificuldades económicas e sociais dos agregados familiares e por carência de mecanismos de apoio compensatórios,