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6 DE ABRIL DE 1990 2161

defendidos e protegidos os seus direitos. A televisão, quase todos os dias, dá-nos as horripilantes imagens de centenas de milhares de crianças abandonadas à miséria, atacadas de todas as doenças de malnutrição, vítimas de epidemias e chagas sociais, de violência moral, física e psíquica, vegetando sobre a superfície do nosso planeta, sem que se vislumbre o menor sinal de que esta situação poderá ser remediada no futuro previsível. Nas sociedades economicamente desenvolvidas é a discriminação racial, como nos Estados Unidos da América e na África do Sul, os tráficos, como o da prostituição e droga, o trabalho clandestino e outras formas de aviltamento, degradação e desumanidade.
No entanto, não faltam convenções internacionais para definir o enorme elenco de direitos da criança e códigos penais para reprimir, severamente, os crimes de que, diariamente, são vítimas.
Temos nós como certo - como, aliás, também foi aqui afirmado pelo Sr. Ministro Roberto Carneiro - que nenhuma criança poderá ser devidamente protegida e usufruir o seu direito natural à felicidade se, em primeiro lugar, não houver uma estrutura eficaz para a protecção e dignificação da família. Em vários relatórios dos países da CEE, ultimamente elaborados, chama-se a atenção para determinadas circunstâncias, que, embora não se possa estabelecer uma relação clara e demonstrativa de causa e efeito, atribuem a causa da violência contra as crianças ao facto de existir violência contra as mulheres, sublinhando que tanto num caso como no outro se trata de desfuncionamento da família no seu conjunto, que é devido às más condições económicas dos cônjuges, bruscas modificações sociais, perda de valores morais referenciais, à má urbanização, ao isolamento da família nuclear, ao desemprego, ao alcoolismo, etc... Em Portugal, alguns dos nossos sociólogos indicam, por exemplo, que os castigos corporais são considerados como parte da vida normal, embora a lei os proíba, e que não é um problema apenas das categorias sócio-económicas desfavorecidas, porque afecta todos os grupos económicos, sociais e culturais. No estudo recente feito, em 1986, com a colaboração do Centro de Estudos Judiciários, ao nível nacional, a proporção das famílias nas quais foi observada a violência psíquica e física para com as crianças é, respectivamente, de 13,2 e 14,2 por 10 000.
A falta de cuidados é muito mais corrente, subindo o número para 29,8 por
10 000. Todavia, o próprio relatório avisa que estes números são apurados por défice, não correspondem necessariamente à realidade, dada a complexidade do estudo. É sabido que à volta deste fenómeno da violência como no de trabalho infantil, existe uma conspiração de silêncio, que as próprias entidades oficiais - aliás, tal como sucede noutros países - recorrem a definições e sistemas de registo próprios para ocultar a realidade. Que o problema da criança é, ao fim e ao cabo, o problema da família, di-lo o relatório do perito alemão Gella, tão celebrado, nesta matéria, nos meios especializados da CEE. Escreve ele: «A violência no seio da família depende da hierarquia do poder. Assim só é utilizada, praticamente, nos casos em que todos os outros meios de assegurar a autoridade e a influência falham. Além disso, o comportamento violento no seio da família funda-se na função e na estrutura desta. Segue-se que não seria um fenómeno patológico particular do delinquente, mas o produto de um sistema familiar que favorece a agressividade. A violência nasce de um mal-entendido entre os pais e os filhos, entre a família e a vizinhança imediata ou o contexto social mais amplo, de um ponto de vista evolutivo, a vítima potencial correrá tanto mais o risco de conhecer a violência, quando existe ausência de calor afectivo nos pais e confiança neles próprios. Uma outra causa de violência nas famílias seria a falta de recursos sociais e pecuniários e a sobrecarga do esforço pedido aos educadores. A violência constitui, no fim de contas, um instrumento patriarcal do poder».
É tendo em consideração o valor primordial e fundamental que a família desempenha no bem-estar da criança que o CDS apresentou, em 1988, o seu projecto de lei n.º 65/V - lei de bases de política familiar - que, após a discussão, na generalidade, ficou congelado na arca frigorífica da comissão especializada, como sempre sucede com as iniciativas da oposição nesta legislatura.
Neste projecto definíamos a instituição familiar assente na igualdade total entre os pais, do ponto de vista jurídico, moral e social, na repartição igual das tarefas e responsabilidades educativas, domésticas e profissionais; na participação de todos os membros, incluindo obviamente os filhos, na vida familiar. É bom repelir e sublinhar, hoje, no contexto do debate sobre a criança, que, no tocante à educação, tal como é reconhecido em todas as sociedades preocupadas com esta problemática, o nosso projecto de lei consagra o direito originário, primário e inalienável de os pais assegurarem, promoverem e orientarem a educação dos filhos, tirando daí todas as consequências em domínios que vão desde a iniciativa da criação de escolas ao direito de participação activa a vários níveis, no planeamento e execução da política educativa, passando pela possibilidade de recusar que aos filhos sejam administrados ensinamentos contrários às suas convicções morais.
Também enunciamos que para o bem da criança é, desde logo, urgente adoptar medidas legislativas necessárias à dignificação do trabalho doméstico, à criação de condições remuneratórias que tenham em atenção a situação e as necessidades das famílias carenciadas e que permitam a qualquer dos cônjuges, em condições mínimas de segurança, optar entre o exercício de funções fora de casa ou a educação dos seus filhos. Exigimos também que, em matéria de habitação e urbanismo, sejam criadas condições para que a casa e o ambiente deixem de constituir obstáculos à constituição da família e ao normal desenvolvimento das relações familiares, definindo, de uma vez por todas, com clareza, uma política habitacional consciente das carências e possibilidades efectivas dos portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É nossa firme convicção, como partido
democrata-cristão, de que o direito inalienável de cada criança fazer parte da sociedade em que nasce depende, primeiro, de fazer parte da sociedade familiar de uma maneira activa e vivificante, de reconhecer os pais como entes não apenas progenitores mas membros solidários e livres da mesma célula familiar, e deles receber, além do calor do afecto, tudo quanto seja necessário para o desenvolvimento harmonioso da personalidade.
Em suma, o que uma sã política de defesa da criança exige é harmonizar as exigências de vida afectiva, económica, escolar, cultural e social com as aspirações legítimas de uma vida de família moderna e estável.
Esta é a pedra angular da política que queremos para as nossas crianças.
A preparação para o casamento e para a maternidade são os pilares fundamentais de qualquer política concernente à criança. Os direitos às condições normais de