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2174 I SÉRIE - NÚMERO 62

Às situações de pobreza rural e urbana tradicionais vieram juntar-se novos tipos de pobreza, os desempregados qualificados, desemprego tecnológico, as crises de mudança não acompanhadas por investimento alternativo e reconversão profissional.
De acordo com os últimos inquéritos às despesas familiares da CEE verificou-se que os países com rendimentos per capita mais baixos consomem a maior percentagem dos seus rendimentos com a satisfação das necessidades básicas.
Portugal, com 51%, vem à cabeça; a Espanha, Grécia e Itália, de 40 % a 45 %; França, Inglaterra e Irlanda, 34 % a 37 %; Alemanha, Dinamarca, Holanda e Bélgica, 26 % a 25 %.
Felizmente, funciona a solidariedade dos pobres e acode o espírito de entreajuda fortemente enraizado no povo português, de brandos costumes e piedosas esperanças, de milagres e de fados, fados de feiras e tabernas que velhos pequenos cantores animam a quem só a voz não dói.
O pitoresco destas situações não pode esconder a realidade mais amarga de um quotidiano sem esperança para muitas crianças portuguesas que deslustra a - nossa democracia.
Há crianças abandonadas, obrigadas à mendicidade e vítimas de violência e negligência, que' são largos contingentes para a marginalidade, a delinquência e a prostituição, como já aqui foi dito.
A violência no seio da família, já referida nesta Câmara, é um fenómeno bem conhecido do Sr. Ministro da Justiça, que exige uma vigorosa resposta e não piedosas declarações de intenções e actos simbólicos, para calar consciências.
Os números revelados pelo Gabinete de Estudos Jurídico-Sociais, em cumprimento do dever de informação que o Governo deve à Assembleia da República, em particular, e aos cidadãos, em geral, são alarmantes. Aliás, Sr. Ministro, o Governo, por vezes, cumpre mal este dever, pelo que não se compreendem as suas palavras a este respeito!...
Como dizia, os resultados do referido inquérito são claramente alarmantes: detectou-se que cerca de 20 % das famílias maltratam psicologicamente as suas crianças, 13,2 % maltratam fisicamente e os negligenciados atingem os 30%.
Mais uma vez, é nas famílias numerosas e de trabalhadores não qualificados que as situações de abandono são mais frequentes e que a rota do desemprego é o caminho de todas as desgraças.
O alcoolismo e a doença são também causas de agressividade e violência.
É evidente a relação causa/efeito de que são vítimas as crianças: baixos salários; precariedade de emprego; ineficaz protecção social; ineficaz inspecção e detecção das situações; ausência de infra-estruturas de acolhimento - já referimos que estas crescem mas as suas insuficiências continuam a assinalar-se - das crianças nas situações de incapacidade temporária, durante o período de trabalho, ou permanente das famílias; ineficaz resposta da escola adequada às situações culturais e económicas de região para região.
Em certas regiões do País, quanto maior e a pobreza mais se acentuam os contrastes, sob a febre liberalizante do Governo, que assiste, quase indiferente, ao aparecimento em manifestações exuberantes de um novo-riquismo, sem valores morais e sem princípios, que se afirma pelos consumos sumptuários face à população carenciada, de que as crianças e os velhos são os mais indefesos;
Nos distritos de Braga e do Porto é mais elevado o número de automóveis per capita, por outro lado, quanto à população infantil, apesar de ser a mais elevada no plano nacional - é a população mais jovem da Europa -, pouco mais de metade frequenta os diversos níveis de ensino.
É mais elevada a taxa de ocupação, quase não há desemprego - para gáudio das estatísticas do Sr. Ministro do Emprego, que, infelizmente, não está presente -, mas salários do trabalho legalizado são inferiores à média nacional em 30 % a
40 %.
O trabalho clandestino ou à peça prolifera e o trabalho infantil, na fábrica ou em casa, é aceite com naturalidade, fazendo parte da educação, do evangelho do trabalho, sem se cuidar que contribui para reduzir em muito o salário dos adultos.
Ninguém deseja hoje uma sociedade colectivista e igualitária, mas há que construir os alicerces de uma sociedade de igualdade de oportunidades.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!

A Oradora: - A vontade colectiva e a opinião pública exigem mais justa distribuição da riqueza, mais justiça fiscal e salarial.
As crianças têm direitos, na terra e não apenas no céu, que os ricos dificilmente alcançam, por ser mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha.
Não tememos os ricos, mas os que enriquecem à custa da exclusão de outros. Os empresários que geram riqueza, dinamizam a economia e são motores de desenvolvimento têm o nosso respeito e devem ter o apoio dos poderes públicos na defesa da sua actividade, que a concorrência desleal dos pobres de espírito põe em causa.
O trabalho infantil resulta inequivocamente, em primeiro lugar, da pobreza, sem todavia esquecermos outras componentes culturais, religiosas e sociais, específicas de região para região.
Nem todo o trabalho infantil tem as mesmas consequências para a vida futura das crianças, mas sabe-se que as crianças que trabalham com máquinas sofrem mais frequentemente acidentes de trabalho graves do que os adultos.
Não foram avaliadas ainda as consequências da fadiga, do esgotamento, da falta de higiene nos locais de trabalho, de funções penosas, do transporte de cargas, da manipulação de materiais poluentes, do contacto com gases venenosos e poeiras; todavia, sabe-se - e não é pelo Governo - que crianças da mesma estatura até aos 12 anos de idade, quando se dividem em estudantes e trabalhadores antes dos 14 anos, são mais baixos quatro centímetros do que os que só entraram na vida laboral aos 18 anos.
Em 1919, a OIT fixou a idade mínima de admissão das crianças em 14 anos, para a indústria. Há II anos, a Convenção n.º 138, tendente à abolição do trabalho infantil, que Portugal parece ir finalmente ratificar, estando, neste momento, ao que supomos, com o processo em mãos - tardiamente, também -, em matéria de direitos, coloca-nos na cauda da Europa. Preconiza a admissão no emprego depois da escolaridade obrigatória e nunca antes dos 15 anos de idade.