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19 DE ABRIL DE 1990 2233

De facto, executando uma das conclusões das Jornadas Parlamentares do PSD, que era de imprimir maior eficiência aos trabalhos do Parlamento, os deputados deste partido mostram que esta é uma das formas de imprimir a tal eficiência, obrigando a Câmara a discutir as mesmas matérias duas ou três vezes, perdendo-se assim algumas tardes, porque o PSD e o Governo entendem que esta é a melhor forma de prestigiar o Parlamento e dar maior eficiência aos trabalhos.
Na verdade, quer nesta como noutras sessões legislativas, esta eficiência repetir-se-á sempre que a oposição apresentar um trabalho, porque esse trabalho irá para o frigorífico, e depois temos outra vez a tal eficiência a funcionar com requentadas iniciativas do Governo ou do PSD.
Foi aqui dito que a revisão constitucional obrigou esta iniciativa já vimos a que é que a revisão constitucional obrigou... Enfim, trata-se de uma falsa desculpa, porque não houve absolutamente nada de novo.
Em relação àquilo que o Sr. Deputado Carlos Encarnação disse - e digo deputado, porque foi nessa qualidade que referiu que a «muito breve prazo», repito, a «muito breve prazo», o Governo traria aqui uma iniciativa legislativa nesta matéria... Mas, «muito breve prazo» para o PSD são pelo menos oito meses, de modo que ... Aliás, sabemos que o prazo normal é aquele do nunca mais...

Risos do PS e do PCP.

De qualquer modo, também nada temos a acrescentar ao nosso discurso só porque o Governo nos obriga a discutir esta matéria duas vezes!...
Se o Governo trouxesse alguma coisa de novo, nós diríamos também alguma coisa de novo, mas como o Governo traz as mesmas coisas, traz os pormenores que deviam ser tratados na especialidade, não se pode obrigar nenhum partido, principalmente um partido da oposição, a fazer outra vez um discurso sobre a mesma matéria, dizendo as mesmas coisas para gáudio do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.
Por estas razões, vou dizer coisas gerais relacionadas com os dados informáticos, uma vez que é isso que o Sr. Secretário de Estado pretende ouvir, porque o debate principal consta do Diário da Assembleia da República e o Governo, principalmente o Sr. Secretário de Estado Carlos Encarnação tem o seu dossier dos recortes de imprensa tão bem organizado que sabe de cor o discurso do CDS sobre essa matéria.

Risos do PS.

Quando Gcorge Orwell escreveu a frase big brother is watching you estava ainda a humanidade e o PSD longe da preocupação, hoje globalmente sentida, de protecção do indivíduo face ao enorme e incontrolável avanço das tecnologias de informação. Hoje, no entanto, a questão renasce e põe-se com uma agudeza que não se punha quando o livro foi escrito.
De facto, este assunto tem grande relevância! Quem tem informação tem poder e quem tem poder usa-lo, como o demonstrou o ex-ministro Miguel Cadilhe nos factos e enredos, da sua atribulada vida no Terreiro do Paço, quando usou muitos dos dados fornecidos ao Ministério das Finanças numa célebre sessão de esclarecimento realizada no Porto. Na verdade, este facto não vem no seu livro Fados e Enredos, porque ele enredou-se mal nessa sessão de divulgação. Do seu livro não consta, e devia constar, como é que os dados constantes dos dossiers fiscais poderiam ter sido utilizados na acusação aos seus adversários políticos, oralmente feita naquela lamentável sessão em que culpou vários destes adversários para justificar as suas desgraças quanto às Amoreiras.
Quem tem poder usa-lo, e pode usá-lo mal, como no caso que demonstrei. Vale a pena, uma vez mais, recordar o exemplo de Edgar Hoover, cujo poder à frente dos destinos do FBI se viu por largos anos incontestado pela forma eficaz de fazer saber aos detentores do poder político da existência de dossiers pessoais comprometedores de cada um deles.
A ciência jurídica foi, melhor ou pior, sendo adaptada à cada vez maior concentração de dados, sobretudo a nível estadual. Estes dados, cujo suporte, essencialmente papel impresso e fotográfico, requeria ainda tempo para a sua circulação e a sua sistematização, interconexão ou fusão, implicavam procedimentos visíveis e morosos que podiam assim, com alguma eficácia, ser limitados e sujeitos a controlo, pelo uso dos tradicionais mecanismos que a ciência e técnica jurídicas vinham oferecendo.
Com o advento do computador, tudo isto se altera. O crescente abaixamento dos custos dos sistemas, o aumento progressivo das velocidades de tratamento de dados, o crescimento constante das capacidades de armazenamento, a internacionalização dos sistemas e a sua compatibilização mudam completamento as regras de jogo.
E é preciso aqui lembrar que a realidade hoje é a seguinte e aplica-se, nomeadamente, a todos os que me ouvem, deputados e jornalistas, e que sabem como é que estes dados podem ser utilizados contra as pessoas.
Todos nós temos dados pessoais registados em variadíssimos ficheiros informatizados: ficheiros de identificação civil, de identificação fiscal, de segurança social, nos bancos, nos CTT/TLP, em companhias seguradoras, nas escolas e universidades, etc.
Ficheiros parcelares, é certo, mas computorizados, o que quer dizer que não é difícil, não é moroso, não pode ser visível, o trabalho de reconstituição do puzzle que é a vida de cada um de nós, sendo a junção dos dados constantes de todos estes ficheiros e o seu respectivo tratamento feitos em poucos segundos.
Sem serem colocados limites à sua utilização, a técnica informática e o engenho humano tratam de forma célere de tornar realidade a profecia assustadora de George Orwell.
Não deixamos de aplaudir a evolução da tecnologia, mas também não poderemos deixar de entendê-la como algo que deve ser sempre colocado ao serviço do homem, e que nunca será desculpa para a limitação da sua liberdade e privacidade qualquer critério mecânico ou científico que, mesmo com eficácia, planificação, viole a identidade do ser humano.
Este entendimento é partilhado por toda a Câmara, que lhe deu consagração constitucional, embora esta preocupação, infelizmente, só hoje se vislumbra que venha a ter aplicação prática na sua consagração legal.
Por estes motivos congratulamo-nos com o presente agendamento e daremos o nosso voto favorável a esta proposta de lei, porque ela contribui para regulamentar uma matéria que precisa de ser urgentemente regulamentada.
Todos os contributos que sejam dados no sentido de melhor sistematizar e legislar sobre esta matéria merecerão a nossa aprovação, tal como mereceu o projecto de lei