O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2228 I SÉRIE - NÚMERO 65

Tenho conhecimento de um caso concreto em que a polícia judiciária, na base de informações constantes dos seus ficheiros, se permitiu transmitir uma versão inteiramente falsa, baseada em dados puramente subjectivos, em denúncias, sem qualquer base, que permitiram lançar toda uma campanha de imprensa de largo alcance, atingindo uma certa pessoa que, na sequência desses acontecimentos, pediu à Polícia Judiciária que lhe revelasse o conteúdo dos seus ficheiros, naquilo que lhe dizia respeito. Foi informada - e posso provar o que digo através da troca de cartas ocorrida - que não podiam revelar o que constava na ficha pessoal, porque tudo estava «coberto» pelo segredo de justiça.
Perante isto pergunto: que remédio há para situações destas?
Com esta questão apenas pretendo sublinhar um dos perigos apontados pelo Sr. Deputado Alberto Martins no que diz respeito a essas situações que estão cobertas pela figura do segredo de justiça, ao abrigo da qual é possível lançar campanhas que atingem gravemente o nome e a honra dos cidadãos sem qualquer hipótese de as suspenderem.

A Sr.ª Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins, em tempo cedido pelo PRD.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Respondendo ao meu camarada Edmundo Pedro devo dizer que estou sintonizado com as preocupações que ele manifesta e com o insólito da situação que descreveu.
Creio que a opinião dos juristas e das pessoas mais atentas a estes fenómenos é unânime no sentido, de que há um indiscutível défice procedimental no que respeita à defesa dos cidadãos face à utilização indevida de dados. Porém, também creio que as medidas legislativas que, como esta, agora estão em discussão são um contributo significativo para que esse défice possa ser superado.

A Sr.ª Presidente:-Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Passaram já largos anos desde o debate da última proposta de lei sobre protecção dos dados pessoais.
O debate decorreu em 1984 paralelamente a debates públicos nos quais se entrecruzavam as preocupações acerca dos perigos que as novas tecnologias podiam representar para os direitos dos cidadãos, caso não fossem tomadas as medidas adequadas.
A riqueza dos debates a nível de instâncias internacionais, nomeadamente no seio do Conselho da Europa, permitiu ordenar as medidas consideradas indispensáveis para proteger o cidadão contra o apetite dos que, acentuando a tónica da liberdade de circulação de informação, tornam possível a intromissão abusiva na vida privada e a utilização do progresso contra as liberdades.
Apesar destes debates, o Governo demonstra, com a proposta de lei que hoje analisamos, ter aprendido alguma coisa, mas não o suficiente, ou, melhor dizendo, o Governo faz orelhas moucas àquilo que não lhe convém.
Esta proposta, em muitas questões, é, de facto; praticamente tirada a papel químico da proposta de 1984.
Para tal resultado não teria sido preciso esperar tanto tempo desde o acórdão do Tribunal Constitucional que considerou, haver uma inconstitucionalidade por omissão, por falta de regulamentação do artigo 35.º da Constituição da República.
Neste debate quase fomos tentados a repescar a intervenção que produzimos nesta Assembleia, em 1984, com ligeiras alterações.
O Governo vem, de facto, à Assembleia da República com uma proposta de lei que, tal como a anterior - e este .é o vício maior que lhe notámos -, erige as excepções em regra. Trata-se de um texto que contém todos os defeitos de outras leis, vivamente criticadas por peritos europeus nesta matéria.
É uma lei global demasiado abstracta, com respostas abstractas, com um rol de excepções, também elas apresentadas em linguagem abstracta.
Se fosse aprovada tal como está, seria uma lei destinada ao fracasso, deixando os cidadãos quase sem protecção face aos perigos das novas tecnologias.
Percorrendo os vários princípios norteadoras de qualquer legislação sobre protecção de dados pessoais podemos ver como de facto o Governo os afirma, para, logo de seguida, os negar.
Relativamente à limitação da recolha de dados, podemos verificar que, ao mesmo tempo que proíbe o tratamento automatizado de dados tão sensíveis como a origem racial, as condenações em processo criminal, as suspeitas de actividades ilícitas, o estado de saúde e a situação patrimonial e financeira, o Governo admite, logo, o seu tratamento por serviços públicos, sem especificar em que casos,, remetendo vagamente para a lei.
A gravidade disto acentua-se se tivermos em consideração que a proposta permite a utilização de quaisquer dados para fins diversos dos da finalidade da recolha, sem especificar em que casos. Se ponderarmos ainda que o artigo 25.º abre a porta, com mais uma excepção também vagamente afirmada, à interconexão de ficheiros automatizados de bases e de bancos de dados pessoais, vemos como é possível, com esta proposta, que dados sensíveis sejam utilizados para finalidades diversas das anunciadas na recolha, tornando mesmo possível a definição de um perfil do cidadão, que bem pode conduzir à sua discriminação. O acesso ao emprego, por exemplo, pode prefigurar-se como ameaçado. Nesta matéria pode ainda afirmar-se que a própria proibição constitucional da utilização da informática para tratamento de dados respeitantes à filiação sindical é violada na presente proposta. Repare-se, com efeito, que o artigo 26.º torna possível a interconexão de ficheiros automatizados de bases e de bancos de dados que contenham dados públicos.
Ora, como nos termos da proposta, os dados públicos são os dados pessoais tornados públicos por via oficial, e tendo em consideraçâo que os nomes dos dirigentes sindicais eleitos são publicitados no Boletim do Trabalho e Emprego, que é um boletim oficial, estes dados passam a ser públicos. Por aqui se vê como é possível, contrariamente ao que a Constituição dispõe, fazer o tratamento de dados respeitantes à filiação sindical.
Nesta área de recolha de dados importa afirmar que - para mais abrindo a porta com uma excepção que, por não concretizada, bem pode transformar-se em regra-, abrindo desmedidamente a porta à interconexão de ficheiros, a proposta de lei não cuida de um perigo corrente em tais situações: o perigo da degradação dos dados.
A tendência, quanto à recolha, é para desenvolver a colheita de dados sem participação do interessado. Dado