20 DE JUNHO DE 1990 2971
tem encarado o processo de integração comunitária como uma "coutada privada", à qual só ele tem acesso e na qual só ele tem competência para opinar e decidir. A própria Assembleia da República, que num futuro mais ou menos próximo será constitucionalmente chamada a tomar decisões fundamentais, tem sido ostensivamente afastada de todo o processo em curso.
É, aliás, politicamente significativo que nos últimos dois anos o Plenário apenas tenha realizado dois debates sobre a integração comunitária, em ambos os casos por iniciativa do Grupo Parlamentar do PCP, e que o Governo nunca se tenha proposto vir a este órgão de soberania apresentar e discutir com profundidade documentos comunitários da maior importância para o futuro da Comunidade Europeia e de cada um dos países membros.
Este reiterado comportamento do Governo é politicamente inadmissível e revela, de forma insofismável, a sua forma autoritária de governar. E prejudica o País, no presente e para o futuro, porque a governamentalização das questões da integração comunitária riflo potência, antes reduz, o poder negocial nacional em todo o processo evolutivo da integração comunitária.
Não será o debate de hoje, promovido pelo grupo parlamentar apoiante do Governo, que, independentemente do seu interesse intrínseco, eliminará o enorme "défice democrático" que, por responsabilidade do Governo, existe em Portugal sobre as questões comunitárias.
Está ainda por fazer a necessária e detalhada análise e estudo do relatório Delors e das consequências para Portugal da implementação da união económica e monetária aí desenhada e proposta. E isso não é possível concretizar-se numa tarde de debate, com as inerentes limitações dos tempos disponíveis.
Mas importa que se faça o mais rapidamente possível, tendo em vista, nomeadamente, a posição a assumir por Portugal na Conferência Intergovernamental de Dezembro próximo.
O debate de hoje não escamoteia o facto de, no âmbito da reunião dos Ministros dos Negócios Estrangeiros, que ontem mesmo decorreu no Luxemburgo, o Governo Português ter tomado posições de princípio sobre o processo que visa a chamada união política comunitária, sem que a Assembleia da República, os agentes políticos, os parceiros sociais, o povo português, tenham a mínima informação sobre essas posições. Mas exigir-se-ia que o Ministro dos Negócios Estrangeiros tivesse dado hoje a esta Assembleia da República uma informação sobre essas posições, o que não sucedeu.
O debate de hoje, pela forma como foi organizado, sem uma preparação prévia e participada, designadamente no âmbito de comissões especializadas, não pode servir para dar um qualquer suporte de concordância com as posições que o Primeiro-Ministro irá assumir em nome de Portugal no Conselho da Europa de Dublim, dentro de uma semana. Mas impõe-se que o Sr. Primeiro-Ministro informe hoje esta Assembleia das posições que aí irá defender, designadamente no que se refere à convocação de uma segunda conferência intergovernamental e ao âmbito das matérias que nela deverão estar em discussão. Do mesmo modo que se impõe, e desde já o reclamamos, que nos últimos dias do mês corrente o Governo apresente à Assembleia da República as conclusões e as principais posições em confronto, da referida cimeira de Dublim, à semelhança do que é democraticamente normal na generalidade dos restantes países comunitários.
Em suma, Srs. Deputados, o debate de hoje não pode compensar o enorme défice democrático que sobre estas matérias se constituiu no País, por responsabilidade do Governo e do PSD, nem elimina a necessidade objectiva de desgovernamentalização das questões da integração comunitária nem a de nelas assegurar a participação continuada da Assembleia da República, das assembleias legislativas das regiões autónomas, das autarquias locais e dos parceiros sociais.
Só a institucionalização dessa participação democrática pode potenciar o poder negocial português, promover o aproveitamento eficaz de oportunidades abertas com a integração, definir uma estratégia nacional de desenvolvimento inserida na evolução da Comunidade Económica Europeia e da Europa e assegurar uma política de firmeza por parte de Portugal na afirmação e defesa dos seus interesses em todas as instancias comunitárias.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O salto qualitativo que o Acto Único Europeu, e a consequente concretização do mercado interno, constituiu no processo de integração comunitária, adquiriu uma dimensão ampliada com o projecto de realização da união económica e monetária, reforçada ainda pelos reflexos da união interalemã, da criação do novo espaço económico europeu e das transformações no Centro e Leste europeus.
É inegável que o projecto de união económica e monetária, pelos problemas e restrições que coloca à elaboração e aplicação de políticas nacionais, nomeadamente no âmbito da política monetária e da gestão macro-económica, e pelas suas consequências económicas e sociais, exige uma avaliação rigorosa de todas as suas consequências para o nosso País.
Parece-nos incontroverso que o projecto de UEM, apresentado pelo Comité Delors, se insere na lógica que tem presidido à concretização do Acto Único Europeu, que se sintetiza na prioridade absoluta concedida à realização do mercado interno, isto é, na aceleração de todo o processo conducente à liberalização dos movimentos de capitais, bens e serviços, em detrimento de outras componentes, designadamente da coesão económica e social.
A concretização plena do projecto de união económica e monetária, apresentado no relatório Delors, implicaria múltiplas perdas de soberania e de decisão dos Estados membros não comprovadamente necessárias, reforçaria o peso e os interesses dos países mais ricos no desenvolvimento da integração europeia em detrimento das necessidades e interesses objectivos dos países menos desenvolvidos, sobreporia totalmente os aspectos e interesses financeiros das transnacionais comunitárias aos interesses e necessidades das pequenas e médias empresas e dos trabalhadores e, no mínimo, aumentaria os riscos de agravamento dos desequilíbrios regionais actualmente existentes e de criação de novas disparidades.
Assim sendo, temos para nós, como posição de princípio geral, que Portugal não pode assumir, no processo de definição e concretização da UEM, posição de "seguidismo submisso" em relação a estratégias alheias. Pelo contrário, Portugal tem o dever de exigir que a evolução da integração comunitária e a coordenação na elaboração e aplicação de políticas económicas e monetárias assentem em formas de verdadeira e justa cooperação entre iguais e em efectivas políticas de desenvolvimento regional, que tenham como objectivo e resultado uma mais justa divisão internacional do trabalho, o reforço do potencial económico, financeiro e tecnológico de todas e de