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27 DE JUNHO DE 1990 3107

O Orador: - A fórmula «serão entregues» é vinculativa e não facultativa. Não representa, para o legislador ordinário, uma simples possibilidade entre outras. A Consumição quer que seja este o destino predominante das terras expropriadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quer uma ligação directa entre a terra e quem a trabalha. Por uma razão elementar quem trabalha terra sua, trabalha-a com amor, identifica-se com ela, tenta valorizá-la e fazer dela elo de ligação de pais a filhos.
Inversamente, quem é dono de terra à distância, sem a regar com o seu suor, antes vendo nela, exclusivamente, uma fonte de rendimento entre outras, tenderá à retoma dos vícios do absentismo, da subexploração, da não benfeitorização, da rentabilização lúdica em detrimento da propriamente agrícola. A deixá-la aos filhos prefere uma boa oferta do Sr. Américo Amorim ou, o que é pior, de um ressentido de Aljubarrota.

Aplausos do PS.

O recado que a Constituição nos manda é este: de proprietários sem enxada e sem tractor o menos possível. Proprietários com calos nas mãos é do que se precisa; dimensionem-se as explorações entre pequenas e médias para que caibam no suor dos seus donos, e entreguem-se a título de propriedade ou de posse a candidatos a agricultores directos ou a médios empresários. E seleccione o Estado os seus apoios. De preferencia apoie os pequenos e médios agricultores, nomeadamente quando integrados em unidades de exploração familiar. Assista-os; socialize-lhes os riscos; dê-lhes estímulos a que se associem, se organizem, se unam.
Pois bem: a proposta do Governo é pouco menos do que surda a estes recados. Recusa-se a ver neles uma forma de individualização da propriedade por contraposição à sua colectivização; uma forma de prender o homem à terra, de que, progressivamente, se afasta; uma forma de repovoamento do Alentejo, travando a tendência para a sua desertificação; uma forma de valorizar o trabalhador agrícola, equiparando-o, progressivamente, aos demais trabalhadores; uma forma de aumentar a produção e a produtividade; uma forma de melhorar a situação económica, social e cultural dos trabalhadores rurais e dos agricultores; em suma, uma forma de concretização dos objectivos da política agrícola definidos pela Constituição.
Diversamente, empenha-se em riscar da lei os últimos resquícios da reforma agrária, confundindo o que nela havia de errado e o que dela permanece socialmente justo.
Esta proposta do Governo não honra a memória de Sá Carneiro.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Que visa em extremo resumo?
Reconstituir, o mais possível, a estrutura fundiária dos tempos do absentismo, dos ratinhos, das casas da malta, das hordas de pedintes nas ruas de Beja, onde fiz a tropa e disso fui testemunha, quando a chuva impedia, ou as épocas monas dispensavam, os trabalhos de campo; ao invés de reforçar a estabilidade dos regimes de exploração da terra, precarizá-los; recolocar no domínio o velho
terra-tenente e limitar o acesso a cie dos pequenos e médios agricultores; fazer reverter - fora dos casos em que isso se justifique - terras nacionalizadas ao domínio privado, sem respeito pelos princípios constitucionais aplicáveis.
Ao definir o âmbito da lei proposta, o Governo fica aquém das exigências constitucionais.
Uma lei que regula mal o dimensionamento das áreas de exploração e que fixa pior o destino das áreas expropriadas e nacionalizadas e que estabelece os princípios gerais relativos ao uso dos solos e ao fomento hidro-agrícola é curta, chocantemente curta para abranger os objectivos da política agrícola, tal como os define a Constituição, as regras aplicáveis à privatização das explorações agrícolas - terras e empresas - expropriadas ou nacionalizadas, a inclusão da outorga da propriedade entre as formas de concessão da exploração da terra a pequenos e médios agricultores e a correcta gestão dos auxílios do Estado à prossecução dos objectivos da política agrícola.
N3o deixa de ser curioso que, tratando-se fundamentalmente de adaptar a lei de bases em vigor às alterações da Constituição, o Governo não tenha sentido uma forte inclinação para incluir no artigo 4.º os novos objectivos da política agrícola que na Constituição foram introduzidos.
É que, entre os novos, figuram objectivos tão importantes como o acesso à propriedade da terra por parte daqueles que a trabalham.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Aí é que está!

O Orador: - Não é indiferente, como claramente se entende, que este acesso surja na proposta como um destino entro outros e não como um objectivo da política agrícola que a Constituição regista e cuja prossecução o Estado se obriga a apoiar!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem!

O Orador: - Importante e novo é também o objectivo de incentivar o associativismo dos agricultores e a exploração directa da terra.
Como o Governo não simpatiza com este desiderato, pura e simplesmente o omitiu.
Assistimos aqui aos esforços do Governo para viabilizar, na lei de bases em vigor, tantas reservas quantos os herdeiros ou compartes, nos casos de contitularidade ou de herança indivisa, ou tantas reservas quantos os sócios, no caso de sociedades titulares de explorações agrícolas nacionalizadas ou expropriadas.
Conseguiu-se, apesar de tudo, impor alguns limites, sempre no pressuposto das vantagens da pequena ou média exploração.
Entre eles o de que as reservas múltiplas assim conseguidas não poderiam ser reunificadas, sob pena de nulidade do respectivo acto. Isto é: não poderia reconstituir-se o latifúndio, entendido como o resultado da conjugação de um excesso em área com um défice em produtividade.
O que o Governo nos propõe agora é que deixe de falar-se em «mais do que uma reserva» e que passe a referir-se «uma reserva múltipla equivalente à soma de várias reservas» e que, em coerência, se eliminem os dispositivos da lei em vigor onde precisamente se fere de nulidade a reunificação.