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27 DE JUNHO DE 1990 3123

Com esta proposta, o Governo chama à colação uma outra questão de fundo: a questão dos processos e dos métodos que o Governo e a Administração usaram e usam para liquidar a reforma agrária.
Nestes anos, Srs. Deputados, foram praticados, pela acção directa de certos agentes da Administração Pública, uma soma infindável de atropelos, ilegalidades, arbitrariedades e mesmo crimes.
Nunca, num processo dirigido por certos agentes da Administração Pública portuguesa, estes desceram tão baixo, a tanto compadrio e corrupção! Nunca tantos emporcalharam tanto a função pública e as garantias de imparcialidade!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Um escândalo!

O Orador: - Nunca, de forma tão provocatória e ostensiva, foi desrespeitado o poder judicial. Nunca se somou tanta hipocrisia como a que levou agentes e responsáveis da Administração Pública e do Governo a envolverem-se pessoalmente (c como interessados!) em casos de ilegalidade para, depois, carpirem lágrimas pelo trabalho a que todos os tribunais eram chamados!
A impunidade com que tudo isto foi feito, a sobranceria com que criminosos e corruptos se pavoneiam com frutos colhidos com os desmandos de que foram responsáveis, tudo isto escreve, para todo o sempre, uma das páginas mais negras-se não mesmo a mais negra - da história da Administração Pública portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ninguém vai esquecer tanta prepotência e tanta injustiça. Mas o pedestal destes «padrinhos» é fraco, é feito da lama com que se emporcalharam. E a hora da justiça há-de chegar, a hora da necessária reforma agrária há-de chegar! Há-de chegar, seguramente!

Aplausos do PCP e do deputado independente Raul Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, porque estamos perto das 20 horas, informo que continuamos o nosso trabalho até ao termo da discussão. A votação far-se-á, obviamente, na quinta-feira.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Campos.

O Sr. António Campos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: A terra é um bem limitado que não se multiplica, de grande incidência social, de enorme importância económica e decisiva para a qualidade de vida. Disputada durante séculos, palmo a palmo, foi fonte permanente de conflitos e guerras.
Hoje, numa Europa desenvolvida, de grandes concentrações demográficas urbanizadas, o sonho de quase todos é abandoná-la e encaixotarem-se entre cimento e asfalto.
A grande preocupação dos governos modernos e da Comunidade é manter vivo, ainda que artificialmente, o mundo rural. Pagam-se, indemnizam-se ou subsidiam-se grande parte das actividades ligadas à terra. A grande preocupação é evitar o abandono, mantê-la em produção e preservar o meio ambiente.
Em Portugal, o Governo tudo faz para desertificar um terço de Portugal! O Alentejo tem o mais baixo índice de ocupação demográfica e a mais elevada taxa de despovoamento. As perspectivas futuras, se nada for feito, são desastrosas.
Os cereais, o principal suporte económico do Alentejo, estão condenados a curto prazo. A protecção aos preços dos cercais, 40% acima dos da Comunidade, entrou em queda irreversível.
A negociação, até ao ano 2001, da fase de transição de nada serve, tal o diferencial de produções e de capacidade produtiva entre os países produtores de cercais e os do Sul da Europa.
Milhões e milhões de contos estão a ser consumidos na mecanização dos cereais no Alentejo, que ficarão sem aproveitamento a prazo relativamente curto.
Perante o panorama alentejano, impunha-se um grande projecto de desenvolvimento baseado na optimização de todos os seus recursos e na dinamização de toda a sua população.
O que o Governo nos traz a esta Assembleia é mais uma alteração de uma lei e de uma situação que, na prática, já pouco existe.
Reconheço que tal lei ainda tem a ver com uns palmos de terra que o PSD distribuiu para ganhar as eleições e constituir a AD. O meu camarada Almeida Santos já analisou brilhantemente sob o ponto de vista jurídico-constitucional esta proposta, mas todos se recordam de o Dr. Sá Carneiro, de o ministro da Agricultura de então, engenheiro Cardoso e Cunha, e de o Sr. Deputado Casqueiro andarem a distribuir terra aos pequenos agricultores; em grandes almoçaradas com o primeiro-ministro e os agricultores, de televisão ao lado, rodeados pelos órgãos de informação e em actos solenes, lá lhes iam entregando para exploração a terra que, hoje, esta lei lhes vai tirar.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É o mesmo partido, que venera justificadamente o seu ex-primeiro-ministro, que vem hoje desfazer aqui aquilo que o Dr. Sá Carneiro, com orgulho, reivindicava.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Vêm, agora, falar no Dr. Sá Carneiro!...

O Orador: - A política tem regras, tem princípios, tem moral. Porém, criando na lei normas pouco dignificantes para um Estado de direito, dá a terra aos antigos senhores, mas obriga-os a arrendá-la, por prazo limitado e a quem a trabalha.
Estão em jogo 80000 ha a 90000 ha, numa parcela de 1,5 milhões de hectares, que seguram alguns dos poucos milhares de agricultores ligados à terra.
Tanta preocupação em acabar com estes tão poucos milhares de agricultores e tanto apoia às quatro fábricas de celulose que já hoje tem na mão mais de 250000 ha, sendo a maioria no Alentejo.
Não deixam passar uma lei que limita a compra de solo nacional por essas empresas e que nervosismo manifestam em acabar com esses pequenos agricultores!
O PSD e o seu Governo portam-se, no Alentejo, ao sabor dos grandes interesses contrários ao superior interesse nacional. O despovoamento acelerado vai continuar e as produções tradicionais estão em risco. Que fazem os Srs. Deputados do PSD e o Governo senão acelerar a crise de toda a região?